A Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI) esclareceu esta terça-feira que arquivou nove inquéritos disciplinares a agentes da PSP envolvidos nos incidentes na Cova da Moura (Amadora), alertando que não se deve misturar este processo com as acusações do Ministério Público.
Num esclarecimento enviado à agência Lusa pelo gabinete da inspectora-geral da IGAI, a entidade afirma que, após os incidentes ocorridos em 2015 na Cova da Moura, foram abertos nove processos disciplinares, dos quais sete foram arquivados e aplicadas sanções em dois.
No entanto, “o processo de inquérito (de natureza disciplinar), por seu turno, na parte que seguiu termos após a instauração dos nove processos disciplinares, foi oportunamente arquivado”, refere a IGAI, referindo que as motivações desta decisão constam dos relatórios e “decorre da apreciação dos elementos recolhidos, alguns provenientes do processo criminal que correu termos em paralelo”.
No esclarecimento, a IGAI destaca que o seu procedimento disciplinar “é independente do procedimento criminal”, numa alusão a 18 acusações contra elementos da PSP dadas a conhecer esta terça-feira pelo Ministério Público no âmbito do mesmo caso, por tortura, sequestro agravado e ofensas racistas, entre outros alegados crimes.
Para a IGAI, os dois processos encontram-se em “fases distintas”, uma vez que o disciplinar foi concluído e o criminal está na “fase inicial”, pelo que a comparação das decisões entre ambos “não tem fundamento” e pode implicar “uma violação da presunção da presunção de inocência”.
A IGAI observa ainda que, perante os mesmos factos, a acusação criminal “envolve uma apreciação probatória de elementos diversa” por comparação aos processos disciplinares.
“Porém, a comparação decisiva a fazer entre processo criminal e processo disciplinar deve ter por objecto processos findos, realidade que neste momento ainda não existe”, acrescenta
De acordo com a informação disponibilizada hoje no “site” da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa, os 18 agentes da PSP estão igualmente acusados de outros "tratamentos cruéis e degradantes ou desumanos e sequestro agravado" e falsificação de documento.
Segundo a acusação do MP, os agentes da PSP, em Fevereiro de 2015, "fizeram constar de documentos factos que não correspondiam à verdade, praticaram actos e proferiram expressões que ofenderam o corpo e a honra dos ofendidos, prestaram declarações que igualmente não correspondiam à verdade e privaram-nos da liberdade".
Os arguidos encontram-se sujeitos a termo de identidade e residência.
A PSP destacou esta terça-feira que “a presunção de inocência se mantém até trânsito em julgado”, recordando que foram accionados os meios disciplinares internos e da IGAI aos polícias envolvidos nos incidentes com os jovens da Cova da Moura.
Contactado pela Renascença, o Ministério da Administração Interna indicou que não faz comentários sobre qualquer decisão judicial.
Fonte policial disse à agência Lusa que os agentes agora acusados estão todos ao serviço.
A versão da PSP, que na altura apresentou aos acontecimentos de Fevereiro de 2015, relata que um grupo de cerca de 10 jovens tentou invadir a esquadra da PSP de Alfragide, no concelho da Amadora, na sequência da detenção de um jovem que atirou uma pedra contra uma carrinha policial.
Ainda de acordo com a PSP, uma carrinha de uma equipa que patrulhava o bairro da Cova da Moura foi atingida por uma pedra atirada por um jovem de um grupo de cerca de 10 pessoas. Um polícia sofreu ferimentos ligeiros, no rosto e nos braços, e foi transportado para o Hospital de Amadora-Sintra, e o jovem, de 24 anos, foi levado para a esquadra de Alfragide.
Na sequência da detenção, os restantes jovens, com idades entre os 23 e 25 anos, "tentaram invadir" a esquadra, tendo sido disparado um novo tiro para o ar, disse a PSP. Foram detidos cinco elementos do grupo e os restantes fugiram.
Esta versão é contrariada pelos jovens, que se queixam de agressões, tortura e discriminação racial por parte dos agentes da PSP.