“Sinto impotência por ouvir tantos relatos de pessoas que foram decapitadas e por ver o sofrimento no olhar de quem viu os seus familiares e conhecidos serem selecionados para morrer”. O desabafo é da irmã Mónica da Rocha, responsável pela Casa do Imaculado Coração de Maria, em Lichinga, na província de Niassa, Moçambique.
A religiosa portuguesa, em mensagem enviada à Fundação AIS, não poupa nas palavras para descrever o conflito armado, classificando-o de “guerra cruel”, ao mesmo tempo que denuncia o silêncio das autoridades face aos ataques que estão a flagelar a região de Cabo Delgado, desde outubro de 2017.
“Sinto revolta e impotência perante esta realidade. Revolta porque considero que já há muito se poderia ter acabado com esta guerra tão cruel e sem sentido, a começar pelo próprio governo que internamente se mantém em silêncio e passa uma mensagem ao povo de que tudo está bem e sob controlo”, afirma a religiosa, dando conta que muitos dos deslocados que fugiram dos ataques em Cabo Delgado procuraram agora abrigo na província de Lichinga.
A irmã pertence à Congregação das Irmãs Reparadoras de Nossa Senhora de Fátima e encontra-se na missão de Lichinga, que conta apenas com duas irmãs e quatro jovens aspirantes.
Na região surgiu um dos vários campos de acolhimento para os mais de 650 mil deslocados de Cabo Delgado, pessoas que fugiram face à violência dos terroristas.
No campo de deslocados de Malica estão acolhidas cerca de quatro dezenas de famílias, distribuídas por tendas.
A religiosa portuguesa escutou e partilha com a fundação pontifícia relatos de várias famílias que retratam a frieza e a brutalidade do que está a acontecer. São descrições de violência extrema.
“Os que foram apanhados, foram cortados aos bocados para que os que estavam escondidos, ao verem isso a acontecer, acabassem por aparecer… mas conseguimos ficar em silêncio e eles acabaram por ir embora…”, partilha a religiosa.
“Eles entraram em casa de repente e mataram algumas pessoas à nossa frente e, depois, mandaram-nos embora, para contarmos o que tinham feito…”, foi outro dos relatos acolhidos pela religiosa e contado à AIS.
A irmã Mónica relata ainda que “os terroristas mandaram as crianças embora e depois pegaram fogo às pessoas que não fossem muçulmanas e recusassem ser insurgentes e quem tentava fugir era morto a tiro…”
A religiosa portuguesa, natural de Arouca, lançou, entretanto, uma campanha de solidariedade para os deslocados que estão no campo de Malica, e pede para que todos os que possam ajudar, o façam, através da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS) ou da Congregação das Irmãs Reparadoras de Nossa Senhora de Fátima”.
“Em nome deste povo, a minha gratidão”, conclui a irmã Mónica da Rocha.