A administração do Montepio está a tapar os prejuízos das participadas com o dinheiro que garante as poupanças dos associados. A acusação é avançada por António Godinho, que concorreu a uma das listas adversárias nas últimas eleições para a direcção da Associação Mutualista, que elegeu Tomás Correia.
Em entrevista à Renascença, António Godinho acusa a actual gestão de falta de transparência, pela apresentação tardia e incompleta dos resultados.
Este associado desafia a actual direcção a demitir-se ou suspender o mandato, afastando a instituição da investigação e dos processos judiciais associados à mesma.
Quem garante as poupanças no Montepio?
A Associação Mutualista “não tem depósitos nem obrigações, nem dívidas ou empréstimos”, segundo esclarecimentos da própria à Renascença. Tem “modalidades mutualistas”, que na prática são poupanças ou coberturas de risco de morte, invalidez ou sobrevivência/velhice.
Como não são considerados depósitos nem a Associação Mutualista é uma entidade bancária, a única garantia que os associados têm são os activos. “Não existe outra garantia a não ser a solvência da própria Associação Mutualista, e não adianta ter apenas activos, adianta que esses activos sejam líquidos para fazer face aos compromissos, não existe uma garantia para além do balanço. Por isso é que as contas e a transparência é fundamental”, explica António Godinho.
A apresentação das contas são um dos pontos em agenda na Assembleia Geral desta Quinta feira e uma das polémicas, porque só no início do ano foram conhecidas as contas consolidadas de 2015 e ainda não é possível comparar com 2016. António Godinho defende que “é confuso e complexo, não podemos cair neste erro de acharmos normal”.
As poupanças dos associados estão a ser investidas com risco?
Questionada directamente pela Renascença, a Associação Mutualista não indica qual o nível de risco dos investimentos. António Godinho lembra que a dona da Caixa Económica já recorreu diversas vezes às poupanças dos associados para tapar prejuízos de participadas através de aumentos de capital.
Para este associado “podemos questionar se são investimentos de risco, aqui é de questionar, quando se aumenta capital de negócios que dão resultados líquidos negativos.”
Acrescenta ainda que “ a Caixa consumiu nos últimos anos grande parte desse capital e enveredou nos últimos anos por actividades, como a concessão de crédito imobiliário, grande parte dos capitais da associação mutualista foram para suprir essas perdas. Agora a questão é se a caixa económica devolve à associação mutualista o que a Associação investiu nela, mas não há garantia de retorno.”
Montepio precisa de um regulador
O Ministério do Trabalho tem a tutela da Associação Mutualista, enquanto IPSS, mas “não existe uma verdadeira regulamentação, o Ministério não olha de forma detalhada para a Associação Mutualista e para as suas contas, vai perguntando tanto quanto se sabe”, denuncia António Godinho.
Este associado defende que uma verdadeira supervisão tem que ter critérios e objectivos públicos. Aumentam por isso as vozes de uma supervisão partilhada, com a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões.
Gestão deve demitir-se ou afastar-se
“O Montepio vive uma grave crise de confiança, e essa crise de confiança advém não apenas dos resultados, eu acho que os resultados é um pouco o reflexo de um conjunto de actos de gestão que são pouco transparentes, opacos, confusos”, explica António Godinho.
Este associado, que enfrentou Tomás Correia nas últimas eleições, defende que independentemente do que vier a ser decidido pela justiça, a ligação da actual gestão e de Tomás Correia, em particular, a processos em investigação, está a prejudicar a Instituição. “Quando alguém líder e cara da Instituição está constantemente sob suspeita em vários processos, e arguido já, deve ter o discernimento de não arrastar consigo essa suspeita. A melhor forma de preservar hoje o Grupo Montepio é o afastamento destas pessoas e deveria ser as próprias pessoas a chegar a esta conclusão. É o bom senso.”
Dinheiro fresco
É inevitável a entrada de outras instituições da economia social no capital do Montepio, “só não sabemos ainda a extensão das necessidades”, diz António Godinho. O regime jurídico da Caixa Económica impede a entrada a privados… O que bloqueia também o acesso à Mutualista, que é dona da Caixa… Ou seja, só podem entrar no capital da AM e da CE instituições da chamada economia social, como a Santa Casa da Misericórdia.
“Vai ser importante para um futuro próximo reunir alguns agentes da dita economia social, como as Misericórdias, santa casa, até algumas outras mutualidades, no sentido de reformas o Montepio. Na Caixa Económica já se prevê que isso possa acontecer”. Para António Godinho, este passo vai trazer duas vantagens, não só a capitalização, mas o regresso do Montepio à economia social.