"Efeito família" poderá ser uma vantagem competitiva para uma organização?
02-12-2024 - 06:00
 • Liliana Dinis

As empresas familiares são consideradas a espinha dorsal da economia mundial (Bird et al., 2002), e caracterizam-se pela interação única entre a identidade familiar e a organizacional. Dessa interação resulta o “efeito família”, que poderá tornar-se numa vantagem competitiva.

Uma vantagem competitiva é um recurso valioso, raro, inimitável e não-substituível (Barney, 2008). A história de uma família aliada à sua reputação são recursos valiosos, raros, que não podem ser reproduzidos ou substituídos pelos seus concorrentes.

Apesar de algumas empresas familiares comunicarem abertamente a sua natureza, outras optam por omitir. Um estudo de Micelotta e Raynard (2011), examinou as empresas familiares mais antigas do mundo. Na sua amostra, encontravam-se empresas fundadas no período compreendido entre 718 e 1761.

Desta análise, resultou a identificação de três abordagens distintas:

  • (i) a preservação da família: as empresas que adotam esta estratégia enfatizam as suas raízes familiares, apresentando a família como guardiã da tradição e continuidade. O branding destaca frequentemente brasões de família, narrativas multigeracionais e um compromisso inabalável com a herança. Este modelo é predominante em pequenas empresas de setores de baixa intensidade tecnológica, como agricultura ou hospitalidade, que valorizam a autenticidade e as relações pessoais com os clientes;
  • (ii) o enriquecimento da família onde, as empresas destacam os seus produtos ou serviços enquanto os associam à herança familiar. A narrativa realça a inovação sem desrespeitar a tradição, mostrando como o ofício evolui através das gerações. Esta estratégia é atrativa para setores como bens de luxo e serviços financeiros, onde a herança e a qualidade são fundamentais;
  • (iii) e a subordinação da família. Nesta estratégia, a família assume um papel secundário em relação à identidade corporativa. Grandes empresas multinacionais adotam frequentemente esta abordagem para atrair um leque diversificado de stakeholders, focando-se nos feitos e visão da organização em vez das suas raízes familiares. A família pode ser mencionada, mas o destaque recai sobre a profissionalização e a escala global.

O “efeito família” também apresenta riscos. Empresas fortemente enraizadas na tradição podem enfrentar dificuldades em modernizar-se, enquanto aquelas que minimizam a identidade familiar podem perder a conexão emocional única que as distingue. Um branding eficaz exige alinhar a marca corporativa com as expectativas dos clientes e as realidades operacionais.

As empresas familiares ocupam uma posição única para alavancar a sua dupla identidade no branding e marketing. Ao gerir cuidadosamente as suas identidades familiar e corporativa, estas empresas podem criar marcas distintivas e ressonantes que resistem ao teste do tempo. Um exemplo notável desta realidade no contexto português é o caso da José Maria da Fonseca.

O caso da José Maria da Fonseca

A José Maria da Fonseca é uma empresa 100% familiar, gerida atualmente pela 6.ª e 7.ª gerações da família Soares Franco. Esta ligação intergeracional não só assegura a continuidade do legado, mas também permite uma abordagem estratégica que equilibra tradição e inovação -um aspeto essencial nas estratégias de preservação e enriquecimento familiar discutidas anteriormente.

Com 60% da sua produção destinada à exportação, a José Maria da Fonseca posiciona o Periquita, o vinho de mesa português mais antigo, como um embaixador da tradição vinícola portuguesa no mundo. A estratégia de branding sublinha o equilíbrio entre o legado familiar e a capacidade de renovação. Este caso exemplifica como as empresas familiares podem competir em mercados globais, mantendo uma ligação emocional e histórica com os consumidores.


Referências:

Barney, J.B. (2008), Gaining and Sustaining Competitive Advantage, Prentice Hall, Upper Saddle River.

Bird, B., Welsch, H., Astrachan, J.H. and Pistrui, D. (2002), “Family business research the evolution of an academic field”, Family Business Review, Vol. 15 No. 4, pp. 337-350.

Micelotta, E. R., & Raynard, M. (2011). Concealing or revealing the family? Corporate brand identity strategies in family firms. Family Business Review, 24(3), 197-216.


Liliana Dinis, Professora da Católica Lisbon School of Business & Economics.

Este espaço de opinião é uma colaboração entre a Renascença e a Católica-Lisbon School of Business and Economics.