O fim do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) está a criar expectativas entre os imigrantes que sabem da criação da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) e esperam um tratamento mais humano e rápido do Estado português.
“Eu não sou criminosa. Vim para cá para fazer o meu trabalho e fugir ao crime no meu país. Não posso ser tratada como uma criminosa”, disse à Lusa Rosângela Silva, uma brasileira que veio de Goiânia para Lisboa para tentar “mudar de vida de vez”.
Como Rosângela estão milhares de imigrantes num limbo à espera que os seus processos sejam resolvidos e Timóteo Macedo, dirigente da Solidariedade Imigrante - uma das mais antigas associações que lidam com o fenómeno -, aponta o dedo ao SEF como responsável pelo problema.
“Tem de haver uma relação de boa-fé entre todos, se queremos efetivamente uma boa integração dos imigrantes em Portugal”, disse, esperando que a AIMA “venha por bem e que faça muito melhor, porque pior do que está é impossível”, por isso considera que só têm a ganhar.
Timóteo Macedo recorda que o fim do SEF e a criação de uma organização que só trate dos processos de regularização e integração é uma “reivindicação muito antiga das associações”.
“Sempre me debati já há muitos anos, há mais de 10 anos, para que os processos administrativos, as renovações, saíssem do SEF” e agora, “até que enfim que separaram a imigração da polícia”, porque “os emigrantes não têm que ser olhados com desconfiança”.
“Porque é que o SEF não funcionou durante dois anos? Andou a usar os emigrantes como bode expiatório, para se desculparem de tudo e mais alguma coisa”, acusou.
Esse bloqueio gerou mesmo o incumprimento de legislação por parte do próprio Estado, no caso dos reagrupamentos familiares, uma prioridade da nova AIMA, segundo a ministra Ana Catarina Mendes.
“Deveria haver uma responsabilização concreta por estes atrasos porque o SEF, de uma forma arbitrária e ilegal, não cumpriu um artigo da lei numa lei que foi feita pela Assembleia da República”, referente ao reagrupamento familiar.
Só há duas semanas a nova AIMA foi apresentada no Conselho para as Migrações e Timóteo Macedo lamenta que o setor associativo não tenha sido ouvido no processo.
“Os funcionários chegam do SEF e as coisas vão mudar de um momento para o outro?” – questionou o dirigente, que acusa muitos desses quadros de nunca terem feito “um serviço em prol dos imigrantes”.
“Nós temos conhecimento de muitos casos de racismo, autoritarismo, de xenofofobia e outras coisas nesses serviços, Isso não pode acontecer”, disse o dirigente da Solidariedade Imigrante.
Com um orçamento de 81 milhões de euros, a nova agência conta com 740 funcionários e prevê 190 novas contratações.
A nova agência herda 347 mil processos e a prioridade será regularizar, até final do ano, casos de reagrupamento familiar e, no primeiro trimestre de 2024, o executivo irá lançar, em conjunto com municípios e os gabinetes locais de apoio aos imigrantes, ações para resolver os processos pendentes, alocando mais recursos para resolver os casos existentes.
Esse esforço, que irá incluir também a colocação de serviços da AIMA nas lojas do cidadão e o aumento de mais 10 postos de atendimento que se vão somar aos 34 existentes.
Na nova AIMA “é preciso fazer uma renovação, uma limpeza, uma renovação grande de quem dirige e quem organiza o trabalho”, avisa Timóteo Macedo.
Sem isso”, as coisas não vão mudar”, afirmou, sublinhando que os problemas no acesso dos imigrantes ao sistema geraram uma série de intermediários, como “advogados sem escrúpulos que se aproveitam para ganhar muito dinheiro à custa da miséria humana”.
Em Lisboa há um ano, Rosângela já desistiu de tentar resolver o seu processo no SEF. “Contratei uma advogada que trata das coisas porque eu não entendo as coisas aqui”, diz à Lusa.
E quanto paga pela advogada? Rosângela olha para o chão e não quer dar um número certo. “É muito dinheiro, mas o que é que eu posso fazer? Eu quero ficar cá”.