No dia em que arranca o debate instrutório do caso EDP, o vice-presidente da associação Frente Cívica lamenta o que diz serem os “11 anos perdidos” durante as investigações até o processo chegar à fase em que se saberá se os arguidos Manuel Pinho, ex-ministro da Economia, a sua mulher Alexandra Pinho e o ex-banqueiro Ricardo Salgado vão ou não a julgamento.
“Estamos a falar de 11 anos perdidos, praticamente apenas na investigação e a sensação é de que a prevenção não existe. E, como a prevenção também não existe, não temos meios que permitam levantar a suspeita mais cedo e começar as investigações mais cedo. Mas, depois, mesmo quando as investigações começam, há notícia de uma suspeita, abre-se um inquérito. A ideia com que se fica é de que nada acontece”, diz João Paulo Batalha à Renascença.
O vice-presidente da Frente Cívica diz não estar surpreendido com a ideia instalada na opinião pública “de uma certa resignação de que Ricardo Salgado nunca será condenado por coisa alguma, ou, mesmo que venha a ser condenado, nunca cumprirá pena”.
Para este consultor em políticas de transparência e estratégias anticorrupção, “isto demonstra um sistema judicial com dois pesos e dois medidas, que pune os crimes cometidos por pessoas pobres, desestruturadas, mas é completamente ineficaz na grande criminalidade, que tem custos económicos brutais para o país e, portanto, no limite, é a própria democracia que está em risco por ser muito forte com os fracos e muito fraca com os fortes”.
Ministério Público? "Desorganização" e "falta de inteligência"
João Paulo Batalha identifica impreparação por parte dos organismos do Estado para investigar de forma eficaz a grande criminalidade.
Desde logo no que diz ser “falta de inteligência” do Ministério Público na gestão de processos.
“Apesar de haver, seguramente, setores do Ministério Público que estão muito mais empenhados do que alguma vez estiveram neste tipo de investigações, a verdade é que o Ministério Público, enquanto organização, continua a ser palco de uma espécie de guerra entre procuradores que querem resultados e uma cultura de inércia institucional que vai servindo para garantir a impunidade destes criminosos”.
EDP. A reconstituição de um caso
O processo surgiu em 2012, relacionado com a gestão da empresa e com alegados favores relacionados com os Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC), as chamadas rendas excessivas.
Em causa estão suspeitas de corrupção e de participação económica em negócio por parte dos antigos administradores António Mexia e João Manso Neto para a manutenção do contrato dos CMEC, no qual Manuel Pinho, ex-ministro da Economia, terá sido corrompido.
Em dezembro de 2022, o Ministério Público separou os processos e passou a centrar-se nas suspeitas de corrupção, fraude fiscal e branqueamento de capitais com dinheiro proveniente do Grupo Espírito Santo, gerido à data por Ricardo Salgado.
Manuel Pinho, a sua mulher, Alexandra Pinho, e o ex-banqueiro Ricardo Salgado ainda pediram a abertura de instrução, mas o tribunal entendeu passar já para esta fase em que tanto o Ministério Público como as defesas farão as alegações finais.
Por fim, haverá uma decisão instrutória que determinará quem vai e quem não vai a julgamento.