António Costa Silva, autor da “Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica e Social de Portugal 2020-2030” apresentada nesta terça-feira de manhã, defende a aposta na alta velocidade, a construção de um grande aeroporto em Lisboa e acredita no “equilíbrio virtuoso entre o Estado e os mercados”.
“Chamam-me sempre ambicioso e vou sê-lo uma vez mais”, avisou durante o longo discurso.
Na apresentação do plano de recuperação económica para a crise que a Covid-19 trouxe consigo, Costa e Silva falou de futuro. Do futuro que diz que Portugal tem capacidade para construir se aproveitar as competências e os recursos geoestratégicos, naturais e humanos que tem.
Para elaborar a “Visão Estratégica” que hoje apresentou com pompa e circunstância no Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa, o homem que o Governo contratou para olhar para o “day after” da crise sanitária ouviu “120 personalidades, instituições, entidades, associações ambientalistas, universidades e outros que partilharam as suas visões e preocupações”.
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António Costa Silva considera que é preciso investir numa infraestrutura que ao longo dos anos tem causado polémica e sofrido inúmeros avanços e recuos: a alta velocidade.
“Temos de ter uma ligação de alta velocidade entre Lisboa e Porto por uma razão muito simples: os voos até 600 km ou até mil km vão ser proibidos”, defendeu, sustentando que “os países que não tiverem, sobretudo nas suas duas grandes áreas metropolitanas, uma ligação eficaz e rápida entre elas vão sofrer em termos de futuro”.
“É fulcral nós não abdicarmos deste grande vetor estratégico que está no plano do Governo, que está a ser executado e bem executado e que tem de ser ampliado e com mais investimento em termos do futuro. É absolutamente crucial”, reforçou.
Grande aeroporto em Lisboa
Além da aposta na ferrovia de alta velocidade, Costa Silva defende a construção de um novo aeroporto na Área Metropolitana de Lisboa.
“É indispensável construirmos um grande aeroporto para a zona metropolitana de Lisboa e é indispensável assegurarmos as ligações aéreas eficazes que a região Norte precisa. E porquê? Por uma razão muito simples: todos os estudos da economia portuguesa revelam que as ligações aéreas são um dos fatores cruciais que condiciona a competitividade da economia portuguesa”, argumentou.
Estado e mercados, um “equilíbrio virtuoso”
Na opinião de António Costa Silva, presidente da Partex, “a crise demonstrou a extraordinária e notável resposta do nosso sistema nacional de saúde”, pelo que “todas a teorias de que devíamos ter um Estado mínimo foram derrotadas”.
“Quando grandes crises acontecem, o Estado é a nossa tábua de salvação. Tem de haver um equilíbrio entre o Estado e os mercados. Os mercados por si só, autorregulados, não funcionam necessariamente para o bem comum. Esta articulação virtuosa é fundamental para o futuro”, defendeu.
“Se o Estado não serve para estas situação, serve para quê?”, questiona.
Mas é também preciso “apostar num Estado de mais qualidade. O nosso Estado tem avançado, e administração pública, em muitas áreas; há outras que deixam muito a desejar”.
Sublinhando o “nível exigente” de respostas para o programa de recuperação económica, alerta: “se mantivermos o ‘bussiness as usual’ na administração pública, não vamos conseguir responder aos desafios”.
“É urgente fazer face à diminuição do investimento, aumentar a eficácia dos reguladores, crucial para a economia funcionar e combater alguma lentidão que possa existir na justiça fiscal e económica”, sublinha ainda.
Ajudar empresas rentáveis
Setembro e outubro deverão ser meses cruciais para as empresas portuguesas.
“Sou das pessoas que pensa que a crise sanitária arrasta uma crise económica que vai ser muito profunda e muito difícil. Temos vários indicadores, mas temos seguramente a queda muito expressiva do nosso PIB, a queda do consumo, a queda do investimento, a taxa do desemprego a aumentar”, começa por traçar.
“Chamava só à atenção para o que pode acontecer em setembro e outubro se alguns destes planos [do Governo de resposta imediata à crise] e alguns destes apoios deixarem de ser executados: temos empresas que são rentáveis economicamente e que estão com a corda na garganta”, avisa.
“Penso que é fulcral manter estas empresas à tona, porque elas são rentáveis. Foram atingidas duramente pela pandemia, mas se recuperarem são eixos fundamentais para o desenvolvimento da nossa economia”, defende.
A importância do planeta
Nesta apresentação no Grande Auditório do CCB, com a presença de diversos ministros, António Costa Silva falou também da importância de cuidar do planeta e dos seus recursos naturais, tão importantes para revigorar a economia.
“Temos de deixar de ser uma civilização que transforma recursos em lixo para passar a ser uma civilização que transforma lixo em recursos”, defendeu.
“Transformámos o mar numa espécie de casa de banho do planeta. Não pode ser!”, criticou também.
Sobre a anunciada crise da água, Costa Silva lembrou que muita da que chega a Portugal vem de Espanha, pelo que defendeu um pensamento fora da caixa. “Temos de estar abertos a todas as soluções e estudá-las. Temos de estudar muito bem as questões da água no Alentejo e no Algarve”, destacou.
Os minerais estratégicos foram outra da vertente abordada. “São os vitais para a transição energética, para a mobilidade elétrica e para a indústria eletrónica de alta precisão”, afirmou.
No entender deste engenheiro de minas, “não podemos negociar com a natureza”. A globalização vai sofrer um ajustamento, mas não acabar.
Revolução digital
“O impacto das tecnologias digitais pode ter um impacto 10 vezes maior na economia do que o da Revolução Industrial e pode funcionar a uma escala 300 vezes maior”, afirma António Costa Silva, citando um estudo.
“Acredito que este é o século que vai criar uma relação como nunca antes entre a biologia com a computação”, disse, alertando contudo para o facto de a “tecnologia não ser uma panaceia” – ela tem de ligada “a políticas públicas consistentes”.
A “Visão Estratégica” de Costa Silva preconiza a construção de “uma economia inclusiva e aberta”.
Informação e conhecimento
“Estamos numa civilização que acumula informação como nunca antes na história, mas não estamos a conseguir transformar informação em conhecimento”, afirmou para depois citar: “Onde está a sabedoria que se perde no conhecimento? Onde está o conhecimento que se perde na infirmação?”
António Costa Silva considera que “vivemos numa sociedade excessivamente economicista e não damos a devida atenção a disciplinas como a demografia e a sociologia”.
Mas quanto vai custar tudo isto?
O especialista diz que fez as contas todas ao plano, mas remete para o Governo a responsabilidade de definição de prioridades e de custos.
“Sou um homem de números. Fiz as contas de tudo. E tenho as minhas contas todas, mas não me vou meter aí. Isso é da exclusiva competência do Governo, é o Governo que tem de decidir, decidir as prioridades, fazer o programa de recuperação, como o senhor ministro Pedro Siza Vieira disse”, declarou.
“O que eu penso é que o Estado serve exatamente para estas alturas”, reforçou. “E atenção que a União Europeia está muito atenta a isto, à questão de se apoiar as pessoas e de apoiar o emprego e de qualificar o emprego. Eu acho devemos aproveitar esses programas no bom sentido para resolver alguns destes problemas”, defendeu.
Quanto ao dinheiro aprovado nesta madrugada em Bruxelas, o presidente da Partex considera que é preciso aproveitar bem as subvenções.
“Sabemos que as subvenções não afetam a dívida do Estado, portanto, temos de usar muito bem tudo aquilo que são as subvenções e eventualmente minimizar a parte dos empréstimos e ver como é que tudo isso se vai concatenar. Mas tudo isso é competência do Governo. Eu apenas produzi uma visão estratégica e acho que o Governo vai fazer um bom trabalho, porque tem todas as condições para isso”, rematou.
Veja aqui a apresentação na íntegra da “Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica e Social de Portugal 2020-2030”
O Governo apela à participação pública.