A doença de Alzheimer afecta pessoas cada vez mais novas. Apesar de ser uma doença ligada ao envelhecimento, registam-se cada vez mais casos da doença em pessoas na casa dos 50 anos e, frequentemente, o primeiro diagnóstico aponta para a depressão, patologia mais comum nessa idade.
“Não se espera que as pessoas tenham Alzheimer aos 50 anos, justifica Remy Cardoso, investigador e aluno do Programa Doutoral em Envelhecimento e Doenças Crónicas, uma parceria entre a Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, Nova Medical School da Universidade Nova de Lisboa e Escola de Ciências da Saúde da Universidade do Minho.
O especialista alerta, assim, para as “perdas de memória significativas” e especifica: “Não é, por exemplo, esquecer-se de onde deixou as chaves do carro, algo que acontece a toda a gente, mas sim, perdas de memória que afectam o dia a dia, como desorientação no tempo e espaço, em que a pessoa se perde facilmente na rua ou em sítios que conhecia. Deve-se ter muita atenção a esses sintomas, sobretudo em pessoas de 50 anos.”
Os genes que ninguém quer
Há situações em que vários membros de uma família e de diferentes gerações têm Alzheimer. O mais provável, nestes casos, é que a causa seja genética. No caso da “doença de Alzheimer familiar” - estima-se que corresponda a cerca de 1% dos casos - há uma alteração em um dos três genes associados ao desenvolvimento da doença. Passa de pais para filhos e “se herdarmos esse gene, há 100% de certeza que vamos desenvolver a doença e poderá acontecer aos 30-40 anos", diz Remy Cardoso. Por isso, quando é detectada, se a pessoa tiver filhos, é aconselhável que se façam testes genéticos.
A maior parte dos casos ligados à genética inclui-se na “Doença de Alzheimer Esporádica”. É uma doença multifatorial, como o cancro ou a diabetes, que junta factores genéticos e ambientais. Ou seja, existem genes que se sabe que aumentam as probabilidades da pessoa vir a ter a doença mas não quer dizer que venha a ser afectada.
Um dos genes mais conhecido é o APOE que tem três formas: E2, E3 e E4.”E sabe-se que a forma E4 está associada às maiores possibilidades da pessoa ter Alzheimer e em idades mais precoces, segundo indica o investigador. Também nesta situação, os testes ajudam a perceber se um indivíduo virá a ser atingido mais cedo ou mais tarde.
Café, vinho tinto e palavras cruzadas contra o Alzheimer
Além dos factores genéticos, o estilo de vida, a alimentação, a saúde, o exercício físico e mental ajudam a travar o avanço da doença. Ao contrário, uma alimentação “desleixada”, como muito sal, gordura e açucares é para rejeitar. Mas “há estudos que mostram que o café pode prevenir o Alzheimer, assim como o vinho tinto, bebido com moderação.
Remy Cardoso sublinha que o exercício físico é vivamente aconselhado tal como o exercício mental. “É sabido que as pessoas com mais escolaridade têm menos probabilidade de desenvolver a doença. Obviamente, em pessoas com mais idade é comum terem menos anos de ensino. Mas, se as pessoas não podem ou não gostam de ler, há outras coisas que podem fazer, como puzzles, jogos, palavras cruzadas. Há quem diga que o cérebro é um 'músculo' e, como tal, tem que ser exercitado e espera por jogos que desafiem a sua inteligência”, refere o especialista.
Pessoas que participam nos ensaios clínicos teem que mudar
As farmacêuticas estão a investir milhões em investigação na tentativa de encontrar uma cura ou, pelo menos, uma forma de retardar a evolução de Alzheimer.
Neste campo, as mais recentes últimas notícias são animadoras, mas, alerta Remy Cardoso, "um novo medicamento - o Aducanumab - ainda está na fase 1 dos ensaios clínicos, em que se avalia a segurança. Há três fases e, antes de 2020, não deverá estar disponível. E se tudo correr bem. Só será útil para as futuras gerações de doentes".
Para já ,existem apenas quatro medicamentos que saíram no virar do século XX, ou seja, há quase duas décadas. Só têm o poder de aliviar os sintomas, não curam nem retardam a evolução da doença. “Mas devemos ter esperança até porque neste momento decorrem cerca de uma centena de ensaios clínicos no âmbito da Doença de Alzheimer", diz Remy Cardoso.
No entanto, o investigador defende que os testes deveriam ser feitos com pessoas que potencialmente podem vir a ter doença e que estão identificados, nomeadamente através da genética.
“O que acontece é que as pessoas que estão a ser postas nos ensaios clínicos já têm Alzheimer há algum tempo. Ou seja, o dano no cérebro é tão grande que, mesmo que o medicamento seja eficaz, não o mostra, porque é impossível reverter uma coisa que já aconteceu: a morte dos neurónios."
“O próximo passo é arranjar maneira de diagnosticar precocemente quem poderá vir a desenvolver a Doença de Alzheimer, porque já se sabe que as alterações no cérebro que lhe estão associadas acontecem quase vinte anos antes. É pôr essas pessoas em ensaios clínicos antes que os danos neuronais sejam grandes e, de facto, assim, conseguir mostrar a eficácia do medicamento. E travar a doença com um medicamente que, neste momento, infelizmente, ainda não existe", conclui Remy Cardoso.
Esta quarta-feira é o Dia Mundial da Doença de Alzheimer, já assinalado, no domingo, em várias cidades do país o Passeio da Memória.