Estima-se que mais de 27% dos europeus (78,6 milhões de pessoas) entre os 15 e os 64 anos tenham consumido canábis pelo menos uma vez na vida. Dois em cada dez europeus entre os 15 e os 24 anos fizeram-no no último ano, num total de 15,8 milhões de pessoas.
Um relatório publicado esta semana pelo Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência sublinha que o processo de legislar sobre canábis ganhou complexidade, tendo em conta as derivações cada vez mais numerosas dos produtos feitos a partir desta substância.
Desde 2016, tem havido uma assinalável promoção comercial a produtos com baixo teor de THC (tetrahidrocanabinol), a substância mais associada à intoxicação por canábis.
Para além disso, têm emergido produtos que alegadamente contêm CBD (canabidiol), ligado a maiores benefícios potenciais para a saúde, embora ainda com limitada comprovação neste momento, de acordo com a análise do Observatório.
Os especialistas assinalam que, nos últimos dez anos, foram autorizados vários produtos medicinais à base de canábis para terapêuticas específicas na União Europeia. “Os programas que enquadram o uso medicinal da canábis são altamente controlados para reduzir o risco de desvio da substância para o mercado ilegal”, pode ler-se no relatório.
O Observatório ressalta que não existe legislação europeia harmonizada sobre o uso ou posse ilícita de canábis, embora a União Europeia tenha competência legislativa para estabelecer regras mínimas de definição de delitos criminais e respetivas sanções na criminalidade grave e transfronteiriça como o tráfico ilegal de droga.
Nos últimos 20 anos, a tendência tem sido para reduzir e até acabar com as penas de prisão associadas à posse de pequenas quantidades de canábis. Em fevereiro de 2022, um inquérito do Eurobarómetro revelou que 22 Estados-membros apoiam a regulação da canábis, com percentagens acima de 70% em países como a República Checa, Polónia, Eslovénia e Croácia. Em quatro países, metade dos inquiridos nesse estudo defendiam a continuação da proibição de venda de canábis. Uma maioria de 93% expressou opinião favorável à disponibilização de canábis para uso médico.
Cada terra com seu uso
O uso recreativo de canábis está a ser regulado em países europeus como a Alemanha, Países Baixos, Luxemburgo, República Checa, Malta e Suíça. “Os suíços iniciaram um projeto piloto de venda legal de canábis. A Alemanha e o Luxemburgo ponderam autorizar o cultivo doméstico e os checos planeiam montar um sistema regulado de distribuição de canábis para uso recreativo”, constata o relatório “Cannabis laws in Europe: questions and answers for policymaking”.
O estudo adianta que raramente a posse de canábis para uso pessoal é punida para além de uma multa. “Na Bélgica, onde a punição pode chegar a uma sentença de prisão, a polícia tem instruções para não dar prioridade a infrações ditas não problemáticas" gerindo localmente cada registo, sem um controlo central das ocorrências. Na Áustria, a posse de droga pode levar a uma pena de prisão por 6 meses ou multa correspondente, mas a polícia reporta os delitos às autoridades de saúde e não às judiciais”, exemplifica-se no documento.
O relatório traça um retrato dos enquadramentos legais do consumo e cultivo de droga em diversos países europeus.
“O consumo de droga pode levar a prisão efetiva em países como França, Chipre, Finlândia, Grécia, Hungria, Noruega, Suécia e Turquia. Em Portugal, na Letónia e na Lituânia, a pena máxima por consumo vai até uma multa”, pode ler-se no documento agora divulgado.
No entanto, os especialistas sustentam que “não é claro que uma mudança na severidade das punições em países como Portugal, Croácia, Malta ou Eslovénia tenha alterado os níveis do consumo de canábis”.
Em Portugal e na Croácia, onde o uso e posse de droga foram descriminalizados, o cultivo de qualquer quantidade, mesmo para uso pessoal, continua a ser crime. Na Finlândia, qualquer cultivo é considerado um ilícito de narcóticos, escrevem os analistas do Observatório Europeu com sede em Lisboa.