O gestor Rafael Mora, ex-sócio de Nuno Vasconcellos, fez uma denúncia contra o líder da Ongoing na Procuradoria-Geral da República (PGR) devido a fugas de ativos para o Brasil.
"Em 12 de junho de 2018, eu próprio e o meu sócio André Parreira interpusemos junto da Procuradoria-Geral da República uma denúncia contra o doutor Vasconcellos. Denúncia essa que sofreu um aditamento em 11 de setembro de 2018", disse esta quarta-feira aos deputados.
Rafael Mora foi ouvido em audição na Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução.
Questionado pelo deputado Hugo Carneiro (PSD) sobre o conteúdo da denúncia, o gestor disse que na audição parlamentar a Nuno Vasconcellos - que terminou antes do tempo, com o acordo dos deputados, devido a falta de colaboração do depoente - Mariana Mortágua (BE) "pôs o dedo na ferida" ao referir a Affera.
"A pergunta foi sobre a Affera. Quando mencionou a palavra Affera, ali acabou o processo. Porque é uma das protagonistas da nossa denúncia", afirmou, referindo-se a uma sociedade sediada no Panamá.
Esclarecendo que soube da existência daquele veículo "offshore" pela imprensa, num artigo do Expresso que "explicava detalhadamente o desvio ou a saída" de sociedades como a Golden Edge ou Opportunity Two para o Panamá, o gestor disse recear que o mesmo pudesse acontecer a outras sociedades.
"Eu, na altura, estava envolvido num processo judicial nos Estados Unidos, contra o doutor Vasconcellos, que me custou uma fortuna. Estava a tentar apropriar-se indevidamente de um ativo que não lhe correspondia", adiantou aos deputados.
Rafael Mora afirmou ter advertido os seus colegas administradores das empresas "start-up" adquiridas e ligadas à Ongoing e a Nuno Vasconcellos de que "tinha a suspeita de que isso poderia vir a acontecer".
"No final de 2015, todos eles foram forçados a fazer aquele desvio de ativos. Todos negaram e todos foram despedidos", revelou aos deputados, deixando claro que defende que créditos concedidos num país devem corresponder garantias na mesma jurisdição.
"A denúncia fundamentalmente é de que, no nosso modesto entendimento, houve um desvio de ativos", acabou por explicar Rafael Mora.
Tentativa de controlo da Impresa
Nestas declarações aos deputados, Rafael Luis Mora revelou ainda que Nuno Vasconcellos tentou controlar a Impresa incentivado pelo antigo líder do BES Ricardo Salgado.
"A maior estupidez foi a de ir almoçar com o doutor Francisco Balsemão [então presidente da Impresa], a dizer "estás com problemas financeiros, vamos fazer um aumento de capital e eu fico a CEO [presidente executivo]"", começou por dizer Rafael Mora aos deputados.
Segundo o gestor, quando Nuno Vasconcellos à sua frente, "à frente da sua mãe e do seu padrasto [...] disse que ia fazer aquilo", Rafael Mora avisou-o de que seria "insano" e de que seria "trucidado".
Rafael Mora, que revelou ter sido consultor durante mais de dez anos com Franscisco Pinto Balsemão e Luís Vasconcellos, pai de Nuno Vasconcellos, advertiu que a ideia de tomar o poder na Impresa não cabia "na cabeça de ninguém".
"Tu leste o artigo que o doutor Balsemão escreveu no dia que o teu pai morreu, no Expresso. Tu achas que alguém que escreve um artigo sentido - e eu sabia que era sentido - dizendo que "era o meu melhor amigo, mas foi sempre o meu número dois", pode vir o filho e ser o número um?", relatou Rafael Mora aos deputados.
Segundo o antigo sócio de Nuno Vasconcellos, "a mãe, curiosamente, disse-lhe o mesmo", tal como o padrasto, "mas não, insistiu e foi".
Questionado pelo deputado Hugo Carneiro (PSD) se Nuno Vasconcellos "era influenciado pelo BES", Rafael Mora afirmou acreditar que "nessa decisão foi influenciado diretamente pelo doutor Ricardo Salgado".
"Isto é teoria, não tenho dados, é o meu pensamento, a minha intuição", disse lembrando que havia "três pessoas próximas dele, que tinham alguma influência intelectual no comportamento dele, especialmente a mãe, que era a dona do grupo", que não o conseguiram demover.
Rafael Mora disse ainda para se observar "todas as semanas os Expressos do ano anterior a esse anúncio", considerando que "o alvo de estimação era sempre o BES".
"Se consegues desviar a atenção do Dr. Balsemão para um inimigo de estimação muito maior... Aconteceu. A partir daquele dia o inimigo de estimação passou a ser a Ongoing, que até era bem vista e passou a ser mal vista, e curiosamente o BES desapareceu do radar", disse aos deputados.
Rafael Mora disse ainda que alguns anos depois Francisco Pinto Balesemão e Ricardo Salgado "assinaram a paz" e "subsequentemente o BES reestruturou a dívida da Impresa".
"Pode não ser 'vero', mas de certeza absoluta é 'vero trovato'. Se tem cabeça de leão, tem juba de leão, tem corpo de leão, ruge de como um leão...não consigo garantir que seja um leão", disse.
Rafael Mora acrescentou ainda que "a cereja no topo do bolo foi contratar o chefe das secretas, das espias", Silva Carvalho.
"A contratação do doutor Silva Carvalho é a cereja no topo do bolo. E quando se está a fazer muita estupidez, acaba por se fazer a última. E a partir daí só havia uma saída para o grupo: era ir para o Brasil, não havia outra", concluiu.