A Provedoria de Justiça espanhola estima que 1,13% da população adulta em Espanha foi abusada quando era menor de idade no contexto da Igreja Católica, o que corresponde a cerca de 440 mil dos 38,9 milhões de adultos espanhóis, de acordo com cálculos dos media.
Os dados foram apresentados esta sexta-feira e constam de um relatório no qual é referido que este número está em linha com estudos semelhantes noutros países europeus.
O relatório destaca que o abuso sexual de menores é um “grave problema” em Espanha, quer na Igreja quer no âmbito familiar e noutros espaços de socialização.
De acordo com os cálculos da Provedoria, um total de 11,7% dos adultos terão sido vítimas de abuso sexual durante a infância ou adolescência (antes dos 18 anos), 3,36% deles em contexto familiar. A prevalência de abusos é maior entre mulheres (17% contra 6% de vítimas do sexo masculino).
No âmbito da Igreja Católica, terão sido vítimas de abuso 1,13% das pessoas agora adultas, das quais 0,6% abusadas por um padre ou religioso.
O documento baseia-se num inquérito levado a cabo este ano e que tem por base uma "amostra ampla" da população: um total de 8.013 inquiridos.
Além deste inquérito, a Provedoria criou uma Unidade de Atenção às Vítimas de Abusos no âmbito da Igreja Católica (aprovada pelo Congresso em julho de 2022), através da qual recolheu o testemunho de 487 vítimas, a maior parte homens (84%). Três em cada quatro relatam ter sido apalpados, 22% reportam masturbação passiva e 16% ativa. Há também 115 casos de violação.
A Provedoria de Justiça refere ainda que o pico do abuso sexual de menores no âmbito da Igreja terá ocorrido entre 1960 e 1970, coincindo com “os anos da ditadura franquista, tendo começado a decrescer a partir dos anos 80 do século passado”.
Igreja “durante muito tempo” negou ou minimizou
O documento agora conhecido refere que a “resposta da Igreja Católica, pelo menos a nível oficial, foi caracterizada durante muito tempo pela negação ou minimização do problema”.
“Pouco a pouco”, à medida que os casos foram sendo conhecidos e como “consequência das diretrizes emanadas pela Santa Sé, os representantes da Igreja em Espanha foram tomando medidas e posições mais firmes, ainda que mais orientadas para a prevenção do que para a reparação”, acrescenta o relatório.
O relatório termina com várias recomendações, entre as quais, que a Igreja Católica promova um “ato público de reconhecimento e reparação simbólica”; a criação de um “fundo estatal para o pagamento de compensações a favor das vítimas”; as dioceses e os institutos de vida consagrada “deviam permitir o acesso à informação contida nos arquivos” e as instituições religiosas “deveriam prestar a máxima atenção tanto aos processos de seleção dos seus membros, como à sua formação, para deteção de abusos”.
Na apresentação do relatório, no Congresso dos Deputados, o provedor espanhol de Justiça, Ángel Gabilondo, disse que as vítimas "merecem ser escutadas, atendidas e correspondidas". À Igreja pediu que ponha dinheiro nesse fundo estatal a ser criado, após denunciar "o silência de quem podia fazer mais para evitar" a pedofilia.
A Conferência Episcopal Espanhola já convocou uma assembleia para 30 de outubro a fim de analisar os resultados deste inquérito, que inclui 100 páginas de testemunhos de vítimas e que representa a primeira investigação oficial ao fenómeno do abuso sexual de crianças.