É quarta-feira e faltam poucos minutos para as 20h00. A noite arrefece e cruzar a Praça da Batalha é um duro confronto com a realidade.
Há sem-abrigo que se encolhem debaixo dos cobertores sob a fachada do Teatro Nacional São João, enquanto o resto da cidade vai regressando a casa após mais um dia de trabalho.
Ali mesmo, paredes meias com a Batalha, na Rua do Cimo de Vila, os rostos impacientes que aguardam a abertura do restaurante solidário contrastam com os turistas que se esgueiram pelos becos do centro histórico à procura de um restaurante típico.
Quatro metros mal medidos separam os dois passeios. O fosso emocional, esse, não tem medida.
O turismo fez com que a cidade crescesse, mas está a empurrar dezenas, centenas de pessoas para a indigência.
É o caso de Daniel. Dorme todas as noites na Ribeira, vive com 180 euros de Rendimento Social de Inserção e não desiste de encontrar um teto, mas continua à espera. E sem resposta.
Mas esta noite há qualquer coisa diferente. No meio da sala, estão meia dúzia de sacos com luvas, meias e kits de higiene.
A noite chega ao fim. Há mais sorrisos e semblantes aliviados. Aqui não é só a fome que se mata. É a solidão dos dias que se tenta afogar, tanto quanto isso seja possível.