O Papa reconhece que Ximenes Belo, bispo emérito de Timor e prémio Nobel da Paz, foi sancionado secretamente, depois de terem chegado a Roma denúncias por casos de abuso.
“Isso é um caso muito antigo, quando não existia a consciência de hoje”, diz Francisco, numa entrevista à agência Associated Press.
O caso passou-se "há quase 25 anos e, nessa altura, não havia a sensibilidade de hoje", explica o Papa Francisco. E acrescenta: “Quando, em setembro, houve revelações sobre o bispo de Timor-Leste, eu disse: 'Sim, deixem-no ficar às claras.' Não o vou encobrir.”
Após uma reportagem publicada, em setembro, pela revista holandesa "De Groene Amsterdammer", revelando que duas pessoas acusaram D. Carlos Ximenes Belo de as abusar sexualmente na década de 1990, quando ainda eram menores, o Vaticano reconheceu ter sancionado secretamente o prémio Nobel. As sanções implicam restrições de movimentos e de ministério, bem como proibição de ter contacto com menores e visitar Timor-Leste.
Nesta entrevista, Francisco reconhece que a Igreja Católica ainda tem um longo caminho a percorrer para lidar com o problema, que exige cada vez mais transparência. E dá o seu próprio exemplo pessoal quando, na viagem ao Chile em 2018, desacreditou as vítimas de um padre abusador chileno.
“Eu não conseguia acreditar”, diz Francisco. “Tive de acordar e reconhecer que havia encobrimento. Foi aí que a bomba explodiu [na minha cabeça], foi quando vi a corrupção de muitos bispos envolvidos nisso”, explica.
Caso Rupnik foi "uma ferida"
O Papa também se refere ao caso do padre jesuíta Marko Ivan Rupnik, cujo escândalo surgiu em dezembro. Várias mulheres consagradas revelaram terem sido, alegadamente, abusadas sexual, espiritual e psicologicamente por Rupnik, enquanto viviam numa comunidade na Eslovénia, por ele fundada na década de 1990.
No início deste ano, os jesuítas admitiram que Rupnik tinha sido declarado excomungado, em 2020, por cometer um dos crimes mais graves da igreja - usar o confessionário para absolver alguém com quem teve relações sexuais - mas a excomunhão foi suspensa um mês após ser declarada.
Em declarações à AP, Francisco nega ter tido qualquer papel no tratamento do caso de Rupnik. Reconhece, no entanto, que, como havia dois processos, decidiu intervir processualmente para manter as acusações das nove mulheres no mesmo tribunal que ouviu o primeiro grupo de acusações. A sua única decisão, acrescenta, foi “deixar continuar com o tribunal normal, porque senão os caminhos processuais dividem-se e tudo se confunde”.
O Papa jesuíta revelou ter ficado chocado com as acusações contra Rupnik: “Para mim, foi uma surpresa, de verdade. Uma pessoa, um artista desse nível. Para mim foi uma grande surpresa e uma ferida."