O Papa reafirmou a política de “tolerância zero” para casos de abusos sexuais na Igreja Católica, considerando que esta é uma orientação “irreversível”.
“Temos de combater mesmo que seja um único caso. Não pode acontecer, porque é matar a pessoa que deveria salvar. Como sacerdote, tenho de ajudar a crescer e salvar estas pessoas, se abuso, mato. Isso é horrível”, disse Francisco, em entrevista à Reuters, concluindo com a indicação de “tolerância zero”.
Na quinta passagem desta conversa, divulgada hoje, o Papa admitiu que a Igreja começou “lentamente” a mudar de postura, perante os sucessivos escândalos de abusos que envolveram membros do clero, religiosos ou instituições católicas.
“Avançamos e, em relação a isto, penso que a direção tomada é irreversível. Hoje é um problema que não se discute”, sustentou.
Questionado sobre a aplicação, a nível local, das diretrizes do Vaticano, Francisco falou de alguma “resistência”, mas disse que “cada vez mais há consciência de que este é o caminho”.
O Papa sublinhou que a maioria dos abusos acontece no âmbito familiar, considerando esse facto como “terrível”.
“Isso não justifica nada. Mesmo que houvesse um só caso [na Igreja], seria vergonhoso”, acrescentou.
Sobre a Cúria Romana, o Papa recordou a divisão do Dicastério para a Doutrina da Fé, com uma secção disciplinar, responsável pelos processos relativos a casos de abusos. “As coisas estão a andar bem”, comentou.
No Dicastério, desde a reforma publicada a 19 de março deste ano, passou a ser instituída a Comissão Pontifícia para a Tutela dos Menores, cuja missão é “aconselhar e dar pareceres” ao Papa, bem como “propor as iniciativas mais oportunas para a salvaguarda dos menores e das pessoas vulneráveis”.
Francisco elogiou o trabalho desta comissão, que criou em 2014, um ano depois de sua eleição, com referência especial ao seu presidente, o cardeal Sean O’Malley, de Boston, e o seu secretário, o padre britânico Andrew Small. “Apoio totalmente a comissão”, declarou.
No final de junho, o Vaticano disponibilizou, online, uma versão atualizada do “vade-mécum” lançado em 2020, para ajudar os bispos e responsáveis de institutos religiosos no tratamento de denúncias de abusos sexuais de menores.
O documento preparado pelo Dicastério para a Doutrina da Fé (DDF) surgiu depois dos pedidos feitos durante a cimeira para a proteção de menores, que o Papa promoveu de 21 a 24 de fevereiro de 2019, no Vaticano.
O DDF propõe aos responsáveis católicos um “manual” para “casos de abusos sexuais de menores cometidos por clérigos”, visando processos que envolvam bispos, padres e diáconos, de forma a uniformizar os procedimentos e estabelecer regras comuns, em vez de orientações.
Os 164 pontos explicam os procedimentos a seguir, desde a denúncia à conclusão da causa, falando numa “ferida profunda e dolorosa que pede para ser curada”.
A atualização da primeira edição surge após a entrada em vigor do Livro VI do Código de Direito Canônico e das “Normas sobre os crimes reservados à Congregação para a Doutrina da Fé” (8 de dezembro de 2021), do motu proprio “Fidem servare” (14 de fevereiro de 2022) e “Competentias quasdam decernere” (15 de fevereiro de 2022), bem como da constituição apostólica “Praedicate evangelium” (5 de junho de 2022), que reformula a Cúria Romana.