Vários líderes mundiais reúnem-se esta quinta-feira, em Londres, numa conferência de doadores que vai tentar obter nove mil milhões de dólares de ajuda para os 18 milhões de sírios afectados pela guerra, bem como tentar travar a crise de refugiados.
Em entrevista à Renascença, a embaixadora do Reino Unido em Portugal, Kirsty Hayes, fala da importância da conferência e defende: "O derramamento de sangue na Síria só pode ser travado com uma solução política."
Começa hoje no Reino Unido uma conferência sobre a situação da Síria. Que medidas de apoio económico é que gostaria de ver aprovadas?
Esta conferência é muito importante para nós. A conferência pretende angariar milhares de milhões de dólares de novo financiamento para atender às necessidades de todos os que são afectados por esta crise, não só na Síria, mas também para refugiados sírios nos países vizinhos, como a Jordânia, o Líbano, a Turquia, o Iraque e o Egipto.
A conferência tem como objectivo um aumento significativo do financiamento para os anos subsequentes, para que os parceiros na região possam delinear as suas estratégias com antecedência. Há uma abordagem ambiciosa no sentido de melhorar o apoio a longo prazo dos refugiados, através de acções concretas para criar meios de subsistência e emprego e melhorar o acesso à educação, dando aos refugiados as competências necessárias para um futuro e uma melhor hipótese de poderem regressar à sua Pátria.
Até que ponto faz sentido falar de apoio económico à Síria quando a guerra não parece ter fim à vista?
O derramamento de sangue na Síria só pode ser travado com uma solução política. Estamos empenhados numa solução que acabe com a guerra e construir uma Síria pacífica e próspera. É fundamental começar a preparar este futuro agora.
O grupo de apoio internacional à Síria conseguiu juntar todos os principais intervenientes internacionais, em torno de uma visão comum do que é necessário para acabar com a guerra.
A curto prazo, para as negociações políticas das quais resulte a formação de um governo de transição no prazo de seis meses e uma nova constituição e a realização de eleições livres e justas, no prazo de 18 meses. Esperamos que o desfecho da conferência ponha as negociações em curso de forma a encontrarmos uma solução política para o conflito.
Não faria mais sentido aplicar o dinheiro do apoio financeiro numa solução militar para o problema do Estado Islâmico? Estará o Reino Unido disposto a investir mais, nomeadamente com o envio de forças terrestres, para esta solução?
Não se trata de escolher entre uma coisa e outra. A conferência destina-se a apoiar os esforços militares ajudando a Síria e os países da região a prepararem-se para o futuro.
O Reino Unido está a combater o Daesh [Estado Islâmico] no Iraque e na Síria como parte de uma coligação internacional de mais de 60 países, empenhados em derrotar o Estado Islâmico, incluindo o Iraque, países árabes e europeus e incluindo, obviamente, Portugal. Estamos a trabalhar com esta coligação para derrotar o Daesh em todas as frentes: Militarmente, cortando pontos de financiamento; Aconselhando na área da luta contra o terrorismo e derrotando a mensagem de ódio que tem sido a causa deste mal.
Em relação à questão de tropas, como já dissemos, as forças de combate britânicas não vão combater no terreno. Esse combate será feito pelo exército iraquiano e pelo exército sírio moderado. Mas como sabe, aviões da força aérea britânica já participaram em quase 2000 missões de combate, incluindo ataques a campos de petróleo controlados pelo Daesh, atingindo assim o financiamento do grupo. Atingimos também outros pontos estratégicos no âmbito das operações da coligação.
Nisto estão envolvidos cerca de mil militares britânicos, em operações de combate ao Daesh em toda a região e que trabalham no terreno com militares iraquianos e da infantaria curda. Isto inclui especialistas na manutenção de armas de combate ou técnicos médicos. Para além disso temos pessoal dos três ramos das forças armadas, em posições cruciais nesta coligação, inclusive em Bagdade, onde trabalhamos lado a lado com pessoal militar iraquiano.
Uma das propostas que a entusiasma é de apoio à indústria de roupa da Jordânia. O que é que isto tem a ver com a Síria, e que vantagens traz à Europa?
Os países vizinhos, incluindo a Jordânia, têm mostrado uma generosidade incrível, acolhendo quase 4,5 milhões de refugiados desde o início do conflito. Isto tem um fardo económico e social significativo nas comunidades e nos governos que acolhem. É por isso que a conferência tem também como objectivo apoiar os esforços de desenvolvimento económico na região.
Neste contexto, surge o pedido jordano de poder negociar mais facilmente na área do vestuário, permitindo que as suas fábricas compitam nos nossos mercados, gerando assim investimento e emprego.
Existem detalhes técnicos que têm de ser trabalhados, mas esta é uma oportunidade para minorar os aspectos da crise migratória, olhando para as necessidades económicas das pessoas afectadas pela instabilidade no Médio Oriente. Ao identificar formas de criar emprego, daremos aos que foram forçados a fugir a esperança e as competências necessárias para construir uma síria estável, inclusiva e próspera, logo que seja seguro voltarem ao seu país.
Neste sentido, gostaria também de frisar as tentativas do ex-Presidente Sampaio para apoiar os estudantes sírios, quer em Portugal quer em outros países da região, que é também uma iniciativa para olhar para o futuro dos sírios.
Esteve esta semana na Assembleia da República, para falar da reforma da UE. Com um referendo prometido no Reino Unido sobre a presença na UE, pode-se dizer que Londres continua a acreditar no projecto europeu?
O nosso primeiro-ministro, David Cameron, deixou muito claro que a União Europeia é mais forte com o Reino Unido como Estado-membro e também que é do interesse nacional do Reino Unido permanecer numa União Europeia reformada. Esta semana foi muito significativa neste esforço para reformar a União Europeia porque na terça-feira recebemos a carta do Presidente Tusk sobre as nossas propostas e penso que estes documentos representam esforços muito importantes quer da parte do presidente Tusk quer pela parte dos vários governos dentro da União Europeia, para encontrar uma solução que funcione para o Reino Unido e também para os outros Estados da União.
Ainda temos muito mais trabalho para fazer, mas estamos optimistas que conseguiremos encontrar uma solução.