Na rua, em frente à Assembleia da República, a tarde desta segunda-feira foi de protesto dos profissionais da Cultura, enquanto lá dentro, na sala do plenário, se debatia o Orçamento do Estado para a Cultura para 2021. Aos deputados, a Ministra da Cultura garantiu que “o novo estatuto dos profissionais da cultura é, neste contexto, uma peça decisiva para o futuro do setor”. Graça Fonseca reiterou que esse estatuto será apresentado até ao final do ano.
Segundo a ministra da Cultura “o estatuto que se prepara servirá como arma contra a precariedade. Além de prever um “registo dos profissionais da cultura, aos quais será atribuído um documento próprio”, o novo estatuto quer também, nas palavras da titular da cultura, “fortalecer os direitos laborais” e “assegurar a proteção social, com a possibilidade de retenção na fonte dos descontos para a Segurança Social”.
A ministra que na sessão começou por evocar a memória do artista surrealista Artur Cruzeiro Seixas que morreu ontem, afirmou perante os deputados que, o tempo de pandemia evidenciou que “a cultura é o bastião capaz de garantir a sobrevivência da democracia”. Graça Fonseca alegou por isso que “cada euro acrescentado à cultura serve para garantir a forma livre como vivemos, agimos, pensamos”.
Questionada pelos deputados sobre quantos profissionais do setor já tinham sido abrangidos pelos apoios sociais, face à situação de crise que se vive com a paralisação da cultura, Graça Fonseca confirmou que “existem nove mil pessoas que até à data estão a receber os apoios da segurança social, no valor global, de 12 milhões de euros”.
Na audição conjunta das comissões parlamentares de Cultura e Comunicação e de Orçamento e Finanças, no âmbito da discussão na especialidade da proposta de Orçamento do Estado para 2021, a ministra apontou a cultura como “geradora de riqueza”. Segundo Graça Fonseca “o setor cultural português emprega milhares de profissionais, paga impostos, contribui para a renovação e coesão territorial, atrai e voltará a atrair turistas, nacionais e estrangeiros.” É neste contexto que a titular da cultura aponta um “reforço do orçamento” para 2021.
Na ronda de perguntas os deputados do PSD falam em “sopa requentada” quanto ao documento apresentado, o parlamentar Paulo Rios de Oliveira afirmou que “este orçamento repete as mentiras do passado”. Também a deputada bloquista Beatriz Gomes Dias fala de um “orçamento mais perto de zero”, já que as contas da cultura representam 0,21 por cento do orçamento de Estado. Já Ana Mesquita, do PCP refere-se ao orçamento da cultura como “um exercício opaco” que “apresenta subfinanciamento estrutural e lógicas concursais” que conduzem ao “encerramento de portas e desemprego de milhares de pessoas”.
RTP e a publicidade do Estado
Numa audição que durou mais de quatro horas, foram debatidas questões sobre os média. O secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media foi questionado sobre o processo de compra antecipada de publicidade institucional pelo Estado nos média. Segundo Nuno Artur Silva o processo está "neste momento na sua fase final", embora o responsável tenha reconhecido que se tratou de “um processo muito complexo do ponto de vista burocrático".
O montante total de 15 milhões já chegou aos media nacionais, mas, em respostas à deputada Fernanda Velasco do PSD, o secretário de Estado explicou que houve “874 procedimentos administrativos de aquisição pública" e que estão agora a ultimar os contratos “com jornais e rádios locais".
Nuno Artur Silva reconheceu, no entanto, que há algum atraso “nesta segunda fase” que se deve “à falta de resposta de algumas das entidades em relação às requisições que eram necessárias do ponto de vista administrativo", esclareceu o governante.
Também em resposta aos parlamentares do PSD, Nuno Artur Silva falou ainda da situação na RTP. O secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media foi categórico em afirmar que “é estável” a situação da empresa pública de radiotelevisão.
"Não tem nenhum problema de subfinanciamento imediato", afirmou Nuno Artur Silva que afastou qualquer problema de financiamento no futuro imediato afirmando: “Para já, não há qualquer risco em relação ao funcionamento da RTP". O responsável, reconheceu, contudo que seria desejável haver mais verbas para “aquisições tecnológicas” na estação pública.
Centenário de José Saramago e a lotaria do património
O orçamento da cultura para 2021 no valor global de 563,9 milhões de euros prevê várias iniciativas, nomeadamente a emissão de uma lotaria instantânea, cuja receita angariada vai reverter para o Fundo de Salvaguarda do Património Cultural.
Na comissão conjunta de cultura e orçamento, a ministra Graça Fonseca indicou ainda que a nova Comissão para Aquisição de Arte Contemporânea irá iniciar o seu mandato no próximo ano com uma dotação de mais 150 mil euros, do que no ano anterior, para aquisições.
Na área dos museus, em 2021 está prevista a mudança do Museu Nacional da Música, para o Palácio Nacional de Mafra; a continuação das obras de recuperação da Fortaleza de Peniche, a instalação do Museu do Tesouro Real no Palácio Nacional da Ajuda e a valorização da Sé Patriarcal de Lisboa.
Graça Fonseca explicou ainda aos deputados que será anunciado um novo regime “temporário” de mecenato cultural durante o ano de 2021. Será um mecenato “dirigido a ações ou projetos na área da conservação do património ou programação museológica” que prevê “um reforço da majoração em IRC de 10 pontos percentuais ou 20 pontos percentuais”, desde que o apoio seja superior a 50 mil euros.
No ano em que Portugal será o país convidado da Feira do Livro de Leipzig, a ministra da cultura explicou ainda que “serão iniciados os trabalhos preparativos para a comemoração do centenário do nascimento de José Saramago”.