O presidente da Entidade Reguladora da Saúde (ERS) considerou, esta quarta-feira, que não há restrição de acesso à Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) no Serviço Nacional de Saúde (SNS), mas admitiu que há procedimentos que devem ser revistos.
Em resposta aos deputados da Comissão de Saúde da Assembleia da República, Pimenta Marinho disse que "o sistema tem respondido", embora com "alguns constrangimentos" e avançou que a ERS está já a distribuir recomendações junto de agrupamentos de centros de saúde (ACES) e hospitais.
"Não nos parece que haja uma restrição de acesso tendo em conta que [o número de IVG] aumentou. Claro que mesmo aumentando, podem existir constrangimentos (...). Entendemos que há procedimentos [passíveis de rever]. Nem tão pouco são coisas complicadas. Muitas vezes são protocolos de articulação que ou não existem ou não estão atualizados e necessitarão de ser efetivados", disse Pimenta Marinho.
O presidente da ERS, que foi à AR falar deste tema pela segunda vez em seis meses e depois de em fevereiro terem sido divulgadas notícias reportando falta de acesso à IVG, considerou que a revisão de procedimentos "fomentará a discussão entre os cuidados de saúde primários e os hospitalares" e disse que "já estão a sair orientações [da ERS] para os hospitais e agrupamentos de centros de saúde".
"Daqui por algum tempo podemos dizer que todos terão isso efetivado e isso dará mais segurança às mulheres", frisou.
Pimenta Marinho disse que o número de entidades que fazem IVG em Portugal se tem mantido desde 2018 e que o número de consultas aumentou 16% de 2021 para 2022 (17.964 consultas face a 15.495).
Também o número de IVG aumentou de 14.159 em 2021 para 15.616 no último ano.
"Há alterações aos procedimentos que é necessário fazer, mas no geral o número de instituições que funciona hoje é idêntico ao de outros anos. Haverá condições para manter um nível de acessibilidade à IVG dentro do que é esperado, está legislado e é um direito da mulher", reiterou.
Quanto a listas sobre médicos que invoquem objeção de consciência, Pimenta Marinho disse que não compete à ERS fazê-las, o que não significa que cada instituição tenha isso identificado.
"Pode acontecer que uma instituição faça o procedimento e não tenha necessidade de andar a perguntar a todos os outros [médicos] se são ou não objetores de consciência [quando há uma equipa que faz]. Quando analisamos os números não nos parece haver uma relação direta a constrangimentos quanto a isso", referiu.
Já sobre se os ACES têm condições para fazer IVG, o presidente da ERS garantiu que sim e avançou que, a Norte, no Tâmega e Sousa, um que parou de fazer durante a pandemia "está a trabalhar para voltar a ter e não é à custa de diminuir o trabalho em outras áreas", garantiu.
Salvaguardando que não é a ERS quem deve interferir na legislação, Pimenta Marinho considerou, no entanto, que "ao fim de 16 anos valeria a pena olhar para as normas da Direção-Geral da Saúde (DGS) e tomar medidas tendo em conta [a recente] reorganização as ULS [Unidades de Saúde Local]".
Esta audição ocorreu a pedido do Bloco de Esquerda, tendo a deputada Isabel Pires, na introdução ao tema, defendido que "o acesso à IVG foi um direto conquistado importante", mas os "obstáculos ao acesso atentam contra a dignidade das mulheres".
"Está em causa o cumprimento da lei e o acesso a um direito fundamental", resumiu.
Um relatório da ERS, tornado público a 13 de setembro, que resulta de um processo de monitorização aberto em 10 de março, indica que "das 42 entidades hospitalares oficiais do SNS elegíveis para a realização de IVG, 15 não a fazem".
"Dessas 15, duas não tinham sequer qualquer procedimento de encaminhamento para uma outra instituição onde a IVG pudesse ser realizada", referia.
Dos 29 hospitais que a 28 de fevereiro de 2023 realizavam IVG (dois dos quais privados), 22 tinham procedimentos implementados para a realização da IVG.
Dos 55 ACES existentes, nenhum fazia IVG e cinco não realizavam consultas prévias.