O dirigente da UGT José Abraão defende que a legislação “devia ter passado por uma discussão mais aturada em sede de concertação social”. Embora o tema tivesse sido abordado pelo Governo com os parceiros sociais, estes apenas foram ouvidos, não fizeram parte da solução.
A UGT contesta, nomeadamente, que os trabalhadores das microempresas fiquem excluídos das novas regras do teletrabalho que irão ser integradas no Código de Trabalho, não podendo ser afastadas nem por contrato individual de trabalho nem por convenção coletiva, salvo quando estes estipularem condições mais favoráveis para o trabalhador.
Já o líder da Confederação Empresarial de Portugal defende que, pela sua dimensão, as microempresas teriam sempre de ficar fora das novas regras. Mas, tal como o representante dos trabalhadores, também o dos empregadores se queixa de falta de diálogo social.
António Saraiva defende que os deputados regulamentaram o teletrabalho “de forma excessiva e precipitadamente, seguindo um calendário ideológico, porque o quadro político que se seguirá às eleições pode já não ser tão favorável”. Lembra ainda que “o alargamento do direito ao teletrabalho para os pais com filhos até aos oito anos (atualmente até aos três) nunca foi levada à mesa da concertação social”.
O advogado e antigo Ministro do Trabalho Pedro Mota Soares considera que a legislação aprovada “foi uma oportunidade perdida”. Critica também as novas regras por não terem sido consensualizadas com quem as vai aplicar e, por serem excessivamente regulamentadoras, quando o teletrabalho o que precisa é de flexibilidade.
“Se há coisa que o teletrabalho precisa é ser flexível”, defende Pedro Mota Soares. “O que hoje os trabalhadores querem não é uma opção entre estarem nas instalações da empresa ou estarem a trabalhar a partir de casa… é uma opção entre estarem a trabalhar a partir de casa à segunda, à terça e à quarta e à quinta e à sexta estarem nas instalações da empresa. Ou em vez de estarem nas filas do trânsito durante uma ou duas horas, nesse período trabalharem a partir de casa. E mesmo para alguém que está todo o tempo em regime de teletrabalho, pode não querer estar sempre a trabalhar a partir de casa, pode querer estar, por exemplo, num local de coworking ou outro qualquer”.
Por seu turno, António Saraiva alerta que as novas regras “podem aumentar a conflitualidade laboral”. O risco existe quanto às regras estabelecidas para o pagamento das despesas adicionais, com a energia e a internet.
O cálculo do valor em causa é feito comparando as despesas que o trabalhador tinha antes da celebração do acordo de teletrabalho com as que passou a ter depois de ficar em regime remoto. Esse pagamento é devido imediatamente após a realização das despesas pelo trabalhador. O líder da Confederação Empresarial diz que as contas podem dar confusão entre trabalhadores e patrões. Entre outros exemplos, cita o caso de um casal em que “marido e mulher estão ambos em teletrabalho, mas a trabalharem para empresas diferentes.” Como é que se fazem com as contas?” pergunta.
“Cada empresa paga metade, uma paga 40 e a outra 60, uma paga 30e a outra 70? Se não houver bom-senso e se não houver liberdade das partes de negociarem as devidas e justas compensações, a conflitualidade vai existir.”
Ao secretário-geral da FESAP e dirigente da UGT o que o preocupa é o facto de as novas regras não preverem expressamente o pagamento do subsídio de refeição a quem está em teletrabalho. José Abraão diz que essa lacuna “deixa a União Geral dos Trabalhadores preocupada porque as pessoas que estão em teletrabalho devem ter todos os direitos que tem o trabalhador presencial e lembra que durante a pandemia teve de haver um despacho da Ministra do Trabalho a clarificar que o teletrabalho também tinha direito ao subsídio de refeição porque uns empregadores pagavam e outros não”.
São opiniões deixadas pelos participantes no programa de informação Em Nome da Lei gravado a partir do Web Summit, em Lisboa, e onde estiveram em debate as novas regras do teletrabalho, aprovadas no dia 5 de novembro pelo Parlamento.