“Portugal tem pobreza energética? Sim, mas sempre teve. Importante é o futuro”
15-12-2021 - 16:47
 • Filipe d'Avillez

João Galamba diz que a transição energética é uma grande oportunidade para a industrialização do país, mas a Direção Geral de Energia e Geologia avisa que tem falta de quadros para o trabalho necessário no terreno.

Portugal é o segundo país com maior índice de pobreza energética, mas para o secretário de Estado Adjunto e da Energia, João Galamba, a transição energética representa uma grande oportunidade para ultrapassar essa realidade.

O secretário de Estado participou esta quarta-feira na conferência dos 20 anos da ADENE, a agência de energia portuguesa, e ouviu críticas à atuação do Governo por parte da ativista climática Andreia Galvão, que referiu a pobreza energética no país.

“Portugal tem dos índices de pobreza energética mais elevados. É o segundo a nível europeu, depois de Malta”, disse. “Se não falamos sobre equidade e controlo público do setor energético é muito difícil falar de transição energética no nosso país.”

Mas para Galamba estas críticas são injustas. “A transição energética é naturalmente justa em Portugal, porque as energias renováveis são mais baratas. Portugal está péssimo em pobreza energética? Sim, mas sempre foi. O que interessa é saber se são estas as políticas que permitem dar resposta. Acho que sim. Podemos fazer melhor? Sim, mas é injusto dizer que não estamos a fazer nada”, afirma.

Neste debate falou-se muito ainda do encerramento das duas centrais a carvão de Sines e do Pego, que colocaram em risco o emprego de mais de 600 trabalhadores, com o João Galamba a reafirmar que há solução para estes trabalhadores, caso queiram, em termos de formação e criação de competências para entrar em novas carreiras.

“No Pego a primeira coisa que fizemos foi lançar um concurso para garantir que aquele ponto de injeção que o Pego liberta, que é um recurso público escasso com muito valor é leiloado com um objetivo muito simples de entender: queremos o melhor projeto, ou conjunto de projetos para a região, em linha com os objetivos de descarbonização do país. E criámos um procedimento transparente, com júri, criámos condições para avaliar os projetos e agora aguardamos que os consórcios de empresas os apresentem.”

Apesar de sublinhar que o Governo não desvaloriza a perda destes empregos, Galamba sublinhou que em termos líquidos Portugal o saldo é muito positivo e que a situação nacional não é comparável com a de outros países muito mais dependentes dos combustíveis fósseis, como é a Polónia, por exemplo, onde o custo laboral pode atingir os 100 mil empregos.

Falta de meios no terreno

Com todos os oradores a concordar sobre a urgência da transição energética para fazer face às alterações climáticas, coube a João Bernardo, responsável pela Direção-geral da Energia e Geologia (DGEG) alertar para a falta de quadros da sua organização para poder implementar as mudanças necessárias no terreno.

“Temos os recursos suficientes para manter o barco na forma em que está. Para responder ao desafio da reforma energética não. Mas estamos a tomar medidas para isso”, disse João Bernardo.

Segundo o diretor-geral foi aprovada já a contratação de 90 trabalhadores, mas existem dificuldades. Para começar, os novos funcionários entrarão para a base, recebendo por isso salários mais baixos, ao contrário do que desejava o responsável, o que pode dificultar o recrutamento. “Veremos se é possível”, diz, esclarecendo que já foram contratados 11, mas faltam cerca de 80.

“A média de idades no DGEG é de 58 anos. Preocupa-nos renovar os quadros para podermos fazer um processo de transição”, afirma.

“Negacionistas na prática”

Também presente neste painel esteve Artur Trindade, ex-secretário de Estado da Energia, que falou da dimensão do investimento necessário para poder fazer a transição energética em Portugal, rejeitando a proposta de Andreia Galvão de que o setor seja colocado nas mãos do Estado, para evitar desigualdades.

“Precisamos de fazer uma transição justa, mas num contexto de emergência. Não devemos estar descansados, face à gravidade do desafio, que é enorme. Também temos os nossos negacionistas, como os da COVID, mas é uma situação energética que obriga a um grande investimento, por isso não concordo sobre o controlo público, esse caminho, que é mais o da Venezuela, não nos permite lidar com a eficácia e ajustiça do processo, e a rapidez necessária.”

“Portugal e Espanha vai custar 200 mil milhões de euros. Se for para o Estado fazer isso, ninguém vai fazer nada, por isso tem de ser feito com investimentos privados”, insistiu.

Em resposta, a universitária e ativista disse que se preocupa mais com os “negacionistas na prática”, desde pessoas a grandes empresas que reconhecendo a realidade do problema não alteram os seus comportamentos

“A transição energética não é só uma coisa de crescimento económico, é mesmo um caminho que temos de fazer”, disse.

A conferência 20 anos de Energia, 20 anos da ADENE conta com a presença de várias personalidades públicas e políticas, incluindo o ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Matos Fernandes, o secretário de Estado Adjunto e da Energia, João Galamba, António Costa Silva, responsável pelo Plano de Recuperação e Resiliência e outros especialistas e ativistas na área da energia e da sustentabilidade.

A ADENE é uma agência pública que tem por objetivo “promover e realizar atividades de interesse público na área da energia e seus interfaces com outras políticas setoriais, em articulação com as demais entidades com atribuições nestes domínios, e ainda promover e realizar atividades de interesse público nas áreas do uso eficiente da água e da eficiência energética na mobilidade”, segundo se pode ler no site.

Entre as suas responsabilidades incluem-se a colaboração com políticas de eficiência energética, a promoção de projetos na área da eficiência energética e hídrica, bem como de energias e tecnologias limpas.

[Notícia atualizada às 17h35]