Ambientalistas defendem renegociação dos caudais dos rios partilhados com Espanha
03-11-2019 - 17:20
 • Renascença com Lusa

A Convenção de Albufeira foi assinada há 20 anos e estabelece limites mínimos para a água que Espanha deve libertar para Portugal nos rios ibéricos.

A associação ambientalista Zero propôs este domingo a revisão da Convenção de Albufeira de forma a evitar que Espanha decida, sem consultar as autoridades portuguesas, a dimensão do caudal dos rios ibéricos.

“Somos a favor de uma renegociação da Convenção de Albufeira para garantir que este tipo de situações não volte a acontecer. Somos a favor de caudais diários, de caudais ecológicos e não apenas de caudais mínimos que garantam que haja uma estabilidade do caudal ao longo de todo o ano”, explicou à Renascença Carla Graça, vice-presidente da associação ambientalista Zero.

A proTEJO - Movimento pelo Tejo, também propôs uma revisão da Convenção de Albufeira para triplicar o volume do Tejo através do estabelecimento de caudais ecológicos contínuos, que sejam regulares e distribuídos sazonalmente ao longo do ano.

Segundo o porta-voz da proTEJO, Paulo Constantino, a Convenção de Albufeira tem um caudal anual estipulado, mas apenas 37% desse caudal está distribuído também por trimestres e semanas, de acordo com as estações do ano.

"Aquilo que nós queremos é que passem a estar distribuídos 100% desse caudal e que sejam triplicados os caudais contínuos e enviados em metros cúbicos por segundo. E isto é possível de fazer, porque apenas estão distribuídos os 37% e os 63% restantes podem ser enviados, por absurdo, numa única hora por parte de Espanha", disse à Lusa.

Paulo Constantino realçou que isto evitaria o ocorrido este ano recentemente, quando "cerca de 40% do caudal anual foi enviado em pouco mais de dois meses".

"Aquilo que propomos é que em vez de os outros 63% estarem disponíveis para a gestão discricionária das empresas hidroelétricas espanholas que enviam quando é mais rentável produzir energia elétrica, nos picos dos preços de energia no mercado energético, que esses 63% também sejam distribuídos pelos trimestres e seja estipulado um caudal de metros cúbicos por segundo", disse.

Para o ambientalista, só isso "permitiria triplicar o caudal em metros cúbicos por segundo em cada estação do ano", sendo insuficiente, como defendem outras entidades, estipular caudais diários.

O proTEJO salientou que tem defendido que a Convenção de Albufeira deveria ter sido revista em 2018, vinte anos após a sua assinatura e 10 anos após a sua única revisão, em 2008, quando foi introduzindo o protocolo adicional que estabeleceu a existência de caudais trimestrais e semanais.

14 milhões de metros públicos num mês

Uma média de 14 milhões de metros cúbicos de água diários foi libertada da barragem de Cedilho, durante o mês de Setembro, para que Espanha cumprisse a Convenção de Albufeira. Em oposição, no último mês, as imagens mostram o rio Tejo com um leito cada vez mais reduzido.

Na passada quinta-feira, o ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Pedro Matos Fernandes, negou que o rio Tejo estivesse a atravessar um período de falta de água, sustentando que o problema está num afluente, o rio Pônsul.

No final do encerramento do debate sobre o Programa do XXII Governo Constitucional, na Assembleia da República, em Lisboa, Matos Fernandes disse que "a falta de água do rio Pônsul tem a ver com o facto de a albufeira onde esse rio tem a sua foz ter pouca água".

De acordo com Matos Fernandes, o que se passou foi que foi necessário "lançar muita água para Portugal para que se cumpra a Convenção de Albufeira".

"É óbvio que devemos melhorar esta situação, não me conformo com este facto. Agora, repito, não houve aqui nenhuma atitude que não fosse a do lado de Espanha de cumprir a Convenção de Albufeira", reiterou.

Por isso, o Ministério do Ambiente e Ação Climática (MACC)entende que a gestão que Espanha fez do caudal do Tejo não é aceitável.

Numa notícia publicada no jornal "Público", o MACC afirma que continuam a desconhecer-se os motivos que forçaram as autoridades espanholas a escoar para o oceano Atlântico, durante o mês de Agosto, cerca de “430 hectómetros cúbicos” de água.

Do lado português da fronteira, no distrito de Castelo Branco, o rio Pônsul é um dos afluentes do Tejo agora secos, onde os pilares de uma ponte registam as marcas do nível habitual da água. Mais de uma dezena de metros abaixo, sobram terras e muitas pedras.