Depois do debate instrutório que confirmou a acusação dos 23 arguidos (entre os quais, o ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes), começa nesta segunda-feira, no tribunal de Santarém, o julgamento do processo de Tancos.
O coletivo de juízes vai começar por ouvir os advogados. Seguem-se os arguidos envolvidos no furto de armamento e na operação de recuperação do material, passando depois para as testemunhas de acusação e de defesa, segundo confirmaram à Renascença fontes ligadas ao processo.
Devido à complexidade do caso, as sentenças, de acordo com alguns dos advogados, só deverão ser conhecidas daqui a um ano.
Melo Alves, advogado de João Paulino, acusado pelo Ministério Público de ser o mentor do assalto aos paióis, justifica a complexidade do caso com “as relações entre os arguidos, a gravidade das situações e também pelas pessoas que estão a ser julgadas”.
Em declarações à Renascença, diz ainda que “estamos perante um enorme número de elementos, que fazem crer que é um processo de grande complexidade”.
O ex-fuzileiro é uma das peças-chave deste puzzle e, durante o debate instrutório, deixou muitas peças soltas que, nesta fase processual, poderão levar ao esclarecimento do roubo aos paióis nacionais de Tancos, na madrugada de 28 de junho de 2017, mas também sobre quem esteve envolvido na recuperação do material encontrado na Chamusca.
João Paulino arrisca pena até 25 anos
O ex-fuzileiro João Paulino assumiu, durante a fase de instrução, ter participado no assalto aos paióis nacionais e decidiu, mais recentemente, colaborar com a justiça devolvendo o restante material desaparecido, esperando com isso uma redução da pena.
“Decorre da lei que, em determinado tipo de crimes, quando há devolução dos bens furtados, haja reflexo na medida da pena”, explica Melo Alves.
Apesar dessa possibilidade, o advogado de Paulino refere que o ex-fuzileiro “incorre numa pena de dois a oito anos pelo furto e, pelo tráfico de armas, de quatro a 12, só por esses dois crimes”.
“Estamos a falar no abstrato, porque no limite a pena pode ir até aos 25 anos”, acrescenta.
João Paulino é apenas um dos 23 arguidos deste processo. Estão divididos entre os que participaram no assalto (nove suspeitos) e os que estiveram envolvidos na operação ilegal de recuperação do armamento (14 arguidos).
Além dos arguidos alegadamente ligados ao assalto, o coletivo de juízes vai ouvir e depois julgar também os arguidos envolvidos na operação de recuperação do armamento, como é o caso do ex-ministro da Defesa, Azeredo Lopes, o coronel Luís Vieira, ex-diretor da Polícia Judiciária Militar, o ex-porta-voz daquela polícia, Vasco Brazão, bem como militares da GNR de Loulé, que colaboraram com a Polícia Judiciária Militar na recuperação do armamento. Um deles é o sargento Lima Santos, que continua suspenso de funções.
“Não se pode castigar quem fez bom trabalho para o país”
Em declarações à Renascença, o advogado de Lima Santos, Luís Cruz Campos, explica que “a estratégia da defesa vai ser provar que o trabalho do seu cliente foi importante para o país e ocorreu dentro da lei”.
Lima Santos, defende o advogado, “agiu de acordo com as diretivas da GNR e as normas da lei em vigor. Por isso, a estratégia será demostrar que ele fez um trabalho fantástico para o país e que foi tirar grande parte do armamento do mercado – aquilo que nunca tinha sido feito nem pela Polícia Judiciária nem pela Procuradoria-Geral da República – e que agiu sempre dentro da lei”.
Lima Santos continua suspenso de funções na GNR, o que, segundo o seu advogado, “é bastante penalizador para a sua vida e família”, mas acredita na sua absolvição.
Luís Cruz Campos lamenta, no entanto, que o seu cliente esteja a ser “vítima de uma guerra política e entre instituições, já que ele é apenas um militar, um sargento e que conseguiu aquilo que os especialistas em combate ao terrorismo não conseguiram”.
O caso Tancos entra agora numa fase crucial, em que todas as provas vão ser apresentadas e todos os arguidos vão ser ouvidos.
Mais uma vez, o primeiro-ministro, António Costa, vai poder responder por escrito às questões colocadas pelos juízes do Tribunal de Santarém, onde vai decorrer o julgamento todas as segundas, terças e quintas-feiras até ao próximo mês de maio.