A European Association of Wine Economists (EuAWE) e a Cátedra Wine and Spirits do INSEEC, da Universidade de Bordéus, realizaram um inquérito em Espanha, Bélgica, Itália, França, Áustria, Alemanha, Portugal e Suíça, com o objetivo de perceberem de que forma o confinamento, durante a pandemia provocada pela Covid-19, afetou o comportamento dos consumidores europeus de vinho.
Portugal participou neste trabalho através de João Rebelo, Investigador da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), em Vila Real, e vice-presidente da EUAWE.
A primeira conclusão que sobressai do inquérito que decorreu entre 17 de abril e 10 de maio de 2020, é de um aumento significativo na frequência de consumo de vinho.
Este primeiro estudo teve por base 6. 600 respostas obtidas até 30 de abril, em Espanha, França, Itália e Portugal.
Os responsáveis do estudo salientam “que a amostra não pretende ser representativa da população dos países estudados, mas corresponder, sobretudo, à população de consumidores de vinho e de outras bebidas alcoólicas”.
Frequência crescente no consumo
Nos quatro países, a frequência do consumo de vinho “aumentou acentuadamente” com o confinamento, tendo “diminuído” na cerveja e nas bebidas espirituosas. A maior frequência no consumo ocorreu na classe etária dos 30 aos 50 anos e, distintamente, menos nos jovens.
França é o país que regista um aumento mais acentuado, mas também em Espanha, Itália e Portugal foi verificado que nas faixas de idade “mais elevadas” a tendência para consumir vinho “é maior”.
Segundo os especialistas “fatores como o rendimento familiar e não ter crianças no agregado, contribuíram para este aumento, com as famílias de rendimentos mais baixos a aumentarem a frequência do consumo de cerveja”.
Alteração nos padrões de compra e consumo
Os resultados do estudo mostram uma redução das despesas em bebidas alcoólicas, especialmente em bebidas espirituosas. Também “o preço médio de compra do vinho diminuiu significativamente”.
Os supermercados foram, durante o confinamento, o principal local de aquisição de vinhos e as garrafeiras pessoais tornaram-se a “segunda fonte mais importante de abastecimento”.
Apesar de mais de 80% dos inquiridos não ter utilizado a opção de compra online, “8,3% dos italianos, 6,6% dos espanhóis, 5,2% dos portugueses e 4,6% dos franceses compraram vinho pela primeira vez via Internet”.
De acordo com os investigadores, deu-se também a “explosão do fenómeno das provas/degustações digitais”, assinalando que a emergência deste fenómeno é relevante entre jovens estudantes Italianos e entre os franceses “jovens e adultos na classe etária entre os 30 e os 50 anos nas zonas urbanas e com rendimentos confortáveis”.
Verificou-se também “um aumento significativo” do consumo de vinho por “pessoas que bebem sozinhas, especialmente entre os homens com rendimentos modestos e desempregados”.
Os jovens e os habitantes das zonas urbanas que trabalham no setor terciário “tendem a beber vinho rapidamente após a compra”. Uma possível interpretação para este comportamento, segundo os investigadores, poderá estar ligada à falta de espaço na habitação ou de garrafeira e à fraca cultura vínica, por parte dos mais jovens.
Os franceses são os mais “propensos a guardar o vinho antes de o beberem”, especialmente em agregados familiares com pelo menos dois filhos, tendência que “permitiu consumir mais do que inquiridos dos outros países”, durante o confinamento.
Aceleradores de consumo
Foi verificado neste estudo que a ansiedade gerada pela pandemia foi “fator impulsionador do consumo de bebidas alcoólicas em todos os países”. Também, além do medo do vírus, os inquiridos expressaram um “receio muito forte das consequências económicas da crise sanitária”. Esta “ansiedade económica” teve impacto no “aumento da frequência do consumo de bebidas alcoólicas”.
Por outro lado, a dimensão do agregado familiar, especialmente no estar sozinho ou sem crianças, verificou-se que foi “maior a tendência para consumir bebidas alcoólicas e com maior frequência, durante o confinamento”.
Neste sentido, pode ser considerado que fatores como a “solidão, o desemprego e o baixo rendimento” originaram o aumento da frequência do consumo de bebidas alcoólicas, mas também, outros, sobretudo por razões pessoais, como “gosto do sabor” ou “o vinho relaxa-me”.
Já por razões sociais, a partilha com amigos, provas e degustações coletivas “tendeu a diminuir ou a estagnar”. No entanto, o confinamento fez com que aqueles que gostam de “vinho sobretudo pelo vinho” bebessem com “mais frequência” do que os outros.
Também a receção de informação e de oferta pelos produtores ou distribuidores parece estar associado a um “aumento significativo do consumo”, o que pode significar uma “estratégia de comercialização bem-sucedida por parte desses agentes económicos”.
Que sinais para o setor?
Cerca de “70% dos inquiridos consideram que é necessário favorecer a compra de vinho local” neste período de crise. Resultado que aponta para a preferência por circuitos curtos na indústria alimentar e para os produtores reaprenderem a “seduzir e acolher os compradores locais, mas também antecipar mercados de exportação de menor dimensão”.
Os autores do estudo sugerem que é de “prever uma retoma nas compras de vinhos mais caros (vinhos de guarda), no curto prazo”.
De uma forma geral as conclusões deste estudo preliminar, apontam para uma “eventual mudança no comportamento e hábitos do consumidor”, consequência da epidemia Covid-19, a que a “fileira vitivinícola deve estar atenta”.
Por parte dos investigadores, o “compromisso passa pelo aprofundamento dos resultados obtidos nesta consulta, utilizando métodos estatísticos e ecométricos mais profundos”, salienta João Rebelo, investigador da UTAD, que representa Portugal neste estudo.