O Presidente da República defendeu esta sexta-feira que a lei obriga os gestores da Caixa Geral de Depósitos a entregarem no Tribunal Constitucional (TC) a declaração de rendimentos e património. No entanto, perante as dúvidas levantadas nos últimos dias, Marcelo Rebelo de Sousa diz que compete ao TC decidir sobre esta matéria.
Em nota publicada no site da Presidência, Marcelo diz que o decreto-lei de Julho que mudou o Estatuto do Gestor Público nada diz sobre o dever de declaração de rendimentos e património ao Tribunal Constitucional.
Por isso, argumenta, mantém-se em vigor a lei de 1983 que obriga “todos os gestores de empresas, com capital participado pelo Estado, e em cuja designação tenha intervindo o mesmo Estado, estejam ou não esses gestores sujeitos ao Estatuto do Gestor Público”, a entregar esse documento.
“À luz desta finalidade, considera-se que a obrigação de declaração vincula a administração da Caixa Geral de Depósitos”, diz a nota de Marcelo. “Compete, porém, ao Tribunal Constitucional decidir sobre a questão em causa.”
“Caso uma sua interpretação, diversa da enunciada, vier a prevalecer, sempre poderá a Assembleia da República clarificar o sentido legal também por via legislativa.”
"Interesse nacional"
O Presidente considera que é "do interesse nacional" que a Caixa Geral de Depósitos "tenha sucesso na sua afirmação como instituição portuguesa, pública e forte, que possa actuar no mercado em termos concorrenciais".
Marcelo pede "um sólido consenso nacional em torno da gestão" da Caixa, "consenso esse abrangendo, em especial, a necessidade de transparência, que permita comparar rendimentos e património à partida e à chegada, isto é, no início e no termo do mandato, com a formalização perante o Tribunal Constitucional, imposta pela administração do dinheiro público".
Leia na íntegra a nota do Presidente da República:
"A reflexão acerca dos mais recentes debates públicos sobre o Decreto-Lei n.º 39/2016, de 28 de Julho, suscita ao Presidente da República as seguintes considerações:
1. É do interesse nacional, e, portanto, de todos, Governo e Oposição incluídos, que a Caixa Geral de Depósitos tenha sucesso na sua afirmação como instituição portuguesa, pública e forte, que possa actuar no mercado em termos concorrenciais.
2. É do interesse nacional que a gestão da Caixa Geral de Depósitos disponha das melhores condições possíveis para alcançar esse sucesso.
3. Uma condição essencial é um sólido consenso nacional em torno da gestão, consenso esse abrangendo, em especial, a necessidade de transparência, que permita comparar rendimentos e património à partida e à chegada, isto é, no início e no termo do mandato, com a formalização perante o Tribunal Constitucional, imposta pela administração do dinheiro público.
4. O Decreto-Lei n.º 39/2016, de 28 de Julho, incidiu apenas sobre o Estatuto do Gestor Público, constante do Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de março.
5. Esse Estatuto nada diz sobre o dever de declaração de rendimentos e património ao Tribunal Constitucional.
6. Tal matéria consta da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na redacção dada, por último, pela Lei n.º 38/2010, de 2 de Setembro.
7. Ora, a Lei n.º 4/83, não foi revogada ou alterada pelo Decreto-Lei n.º 39/2016, de 28 de Julho.
8. A finalidade do diploma de 1983 afigura-se ser, neste particular, a de obrigar à mencionada declaração todos os gestores de empresas, com capital participado pelo Estado, e em cuja designação tenha intervindo o mesmo Estado, estejam ou não esses gestores sujeitos ao Estatuto do Gestor Público. O que se entende, em termos substanciais, visto administrarem fundos de origem estatal e terem sido objecto de escolha pelo Estado.
À luz desta finalidade, considera-se que a obrigação de declaração vincula a administração da Caixa Geral de Depósitos.
9. Compete, porém, ao Tribunal Constitucional decidir sobre a questão em causa.
10. Caso uma sua interpretação, diversa da enunciada, vier a prevalecer, sempre poderá a Assembleia da República clarificar o sentido legal também por via legislativa.
Tudo sem que faça sentido temer que os destinatários possam sobrepor ao interesse nacional a prosseguir com a sua esperada competência, qualquer tipo de considerações de ordem particularista.
Palácio de Belém, 4 de Novembro de 2016"