O bastonário da Ordem dos Advogados (OA) considerou hoje que o Ministério Público (MP) deve explicar aos cidadãos as absolvições de titulares de cargos políticos nos últimos anos, apresentando os motivos na origem dessas acusações.
"Temos assistido nos últimos tempos a muitas absolvições de cidadãos que exerceram funções políticas ao mais alto nível, os quais, no entanto, tiveram que viver durante anos com o estigma de uma acusação criminal", disse Luís Menezes Leitão na cerimónia de abertura do ano judicial, no salão nobre do Supremo Tribunal de Justiça, em Lisboa, que conta também com intervenções da ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, do presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva e do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Para Menezes Leitão, "esperar-se-ia, a bem da credibilidade da nossa justiça que, sendo as mesmas julgadas improcedentes nos Tribunais, os cidadãos tivessem uma explicação pública por parte do Ministério Público sobre o que motivou a sua acusação".
O bastonário da OA vincou que a credibilidade do setor é "fonte de grande preocupação" e que há uma "absoluta falta de recursos humanos".
Apesar de visar o MP e de lhe exigir "máxima responsabilidade" no exercício dos seus poderes, Menezes Leitão reivindicou a defesa da autonomia dos magistrados, recusando "quaisquer tentativas" de controlo por parte do poder político, mas não deixou de responder às vozes que já defenderam o fim da fase de instrução dos processos.
"A fase de instrução é absolutamente essencial para assegurar a jurisdicionalização da nossa investigação criminal, colocando a acusação do MP sob controlo judicial", observou Menezes Leitão, que criticou ainda a mediatização da detenção de cidadãos para interrogatório por juiz de instrução, acrescentando que "a eliminação da fase da instrução representaria um duro golpe no processo penal, em prejuízo dos direitos dos cidadãos".
Entre as críticas do bastonário dos advogados esteve também a justiça penal, nomeadamente a "desastrada reforma do Código de Processo Penal", em novembro de 2021, ao notar que o parlamento "agiu de uma forma absolutamente precipitada" antes da sua anunciada dissolução e que a mesma foi "fonte de tantos problemas" que já deu azo a uma nova proposta de lei do governo para promover a sua alteração.
Menezes Leitão apontou ainda críticas ao estado da justiça cível e à situação dos tribunais administrativos e fiscais, lamentando que haja processos "à espera de uma decisão há dez ou vinte anos" e que tal represente uma situação de "desamparo" para os cidadãos, na qual só o Estado beneficia, uma vez que "não vê as medidas que ilegalmente toma contra os cidadãos eficazmente sindicadas pelos tribunais".
"A nossa justiça cível (...) só não é igualmente tão morosa em virtude do elevado valor das custas judiciais, que levam a que só lhe tenham acesso os muito ricos ou os muito pobres, estes últimos por beneficiarem do apoio judiciário. Há anos que se salienta ser imperioso a redução das custas judiciais, sendo inaceitável que a água que deveria saciar a sede de justiça dos cidadãos seja em Portugal paga pelos mesmos ao preço do champanhe francês", ironizou.
Depois de condenar a não realização da cerimónia de abertura do ano judicial em 2021, devido à pandemia de covid-19, considerando que "tal foi prejudicial" para a justiça portuguesa, o bastonário da OA insurgiu-se contra a suspensão de direitos fundamentais sem o devido controlo judicial e, por isso, reclamou que seja dada à Ordem dos Advogados o poder de pedir a fiscalização da constitucionalidade das leis ao Tribunal Constitucional.
"É assim necessário defender a Constituição, atribuindo à Ordem dos Advogados competência para a fiscalização da constitucionalidade das leis. E é fundamental instituir o recurso de amparo para permitir aos cidadãos recorrerem diretamente ao Tribunal Constitucional para defesa dos seus direitos fundamentais", sentenciou.