O eurodeputado centrista Nuno Melo lançou esta quinta-feira uma petição pública que pede a revisão dos conteúdos da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento ou o seu caráter opcional, numa tentativa de “expurgar” da disciplina “o que é político”.
A petição, intitulada “Pela revisão da disciplina de cidadania no seu modelo atual ou em alternativa, pelo seu caráter opcional” e dirigida ao primeiro-ministro, António Costa, tem como primeiros subscritores o líder parlamentar do CDS-PP, Telmo Correia, o ex-governante Paulo Núncio, o presidente do CDS-Madeira e secretário Regional da Economia, Rui Barreto, ou ainda o ex-deputado Hélder Amaral.
Em declarações à agência Lusa, Nuno Melo disse não contestar a existência da disciplina, considerando-a “importante e relevante”, desde que “configurada numa base consensual” e “expurgando-a daquilo que é político”.
“Defendemos a revisão da disciplina, reconfigurando-a nesses termos que sejam consensuais na sociedade portuguesa, expurgando-a daquilo que é político, é ideológico, divide e não está a ser transmitido com as perspetivas globais que esses temas permitiriam ou, em alternativa, não sendo revista a natureza da disciplina, que passe a ter caráter opcional”, defendeu.
Questionado sobre que temas deveriam ser mantidos ou retirados da disciplina, Nuno Melo deu como exemplos a manter conteúdos como “a organização política do Estado”, “a Constituição da República Portuguesa”, “aspetos relacionados com o ambiente, com a geografia”, insurgindo-se contra “toda uma doutrina de género” que caracterizou como “instrumentos políticos”.
“A disciplina de cidadania, hoje, permitindo a transmissão de uma única perspetiva em relação a realidades que admitem várias, com recurso também a entidades alheias à escola, que os pais e os alunos não conhecem antecipadamente e em relação às quais não podem dizer ‘não’, politizam a disciplina e justificam esta petição”, rematou Nuno Melo.
No texto que acompanha a petição, os subscritores alegam que a disciplina de Cidadania se transformou “numa das moedas de troca concedidas pelo governo socialista à respetiva ala mais radical e à extrema-esquerda, num quadro interesseiro de arranjos parlamentares”.
A petição sustenta que os conteúdos atualmente incluídos na disciplina obrigatória violam a Constituição da República Portuguesa, “que no artigo 43 n.º 2, dispõe que o “Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer diretrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas.”.
“Não é aceitável que associações LGBT [Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgéneros], alheias à Escola, com agendas próprias de natureza política e de reconfiguração sociológica, sejam chamadas ao ensino, sem pertencerem ao universo docente antecipadamente conhecido e sem possibilidade de controlo prévio ou recusa legítima dos pais”, pode ler-se no texto.
A polémica teve origem no caso de dois irmãos de Vila Nova de Famalicão, no distrito de Braga, que faltaram a todas as aulas desta disciplina por opção dos pais, que argumentam que os tópicos abordados são da responsabilidade educativa das famílias.
No início de setembro veio a público um manifesto que juntou quase 100 personalidades, entre as quais o antigo Presidente da República Cavaco Silva, o ex-primeiro-ministro Passos Coelho e o cardeal-patriarca de Lisboa, Manuel Clemente, contra aulas obrigatórias de Cidadania apelando para que os pais possam escolher.
Entretanto, como resposta ao primeiro, um segundo manifesto em defesa da obrigatoriedade da disciplina de cidadania e a rejeitar que possa ser alvo de objeção de consciência para que os alunos não a frequentem já atingiu 8.000 subscritores, entre eles Ana Gomes, Pedro Bacelar de Vasconcelos, Teresa Pizarro Beleza, Daniel Oliveira, Alexandre Quintanilha, Catarina Marcelino, Boaventura Sousa Santos, Carvalho da Silva e Joana Mortágua.
O tema foi comentado pelo Secretário de Estado Adjunto e da Educação, João Costa, que num artigo de opinião publicado no jornal Público indicou que a cidadania não é uma opção e que o manifesto contra aulas obrigatórias de cidadania, apelando para que os pais possam escolher, tem considerandos que partem de informação falsa.
Para o governante, o que se está a passar é um "manifesto político".
Na disciplina Cidadania e Desenvolvimento, criada em 2018/19, obrigatória no 2º e 3º ciclos do Ensino Básico, são dados temas como a educação para a saúde e a sexualidade, o voluntariado, a igualdade de género ou a segurança rodoviária.