Abusos. Diocese de Angra confirma suspensão de dois sacerdotes suspeitos
08-03-2023 - 14:36
 • Ângela Roque

Nomes constam da lista entregue pela Comissão Independente. Processo de investigação prévia já foi iniciado e seguirá participação ao Ministério Publico, informa a diocese em comunicado, sublinhando que os dois padres ficam “impedidos do exercício público do ministério”.

A diocese de Angra informou esta quarta-feira em comunicado que dois sacerdotes da região, referenciados no relatório da Comissão Independente que investigou os abusos na Igreja, vão ficar “impedidos do exercício público do ministério” até ao final do processo de investigação prévia.

“Da lista entregue na passada sexta-feira ao Bispo diocesano pela Comissão Independente constam dois nomes: um sacerdote de São Miguel e outro da ilha Terceira. O bispo diocesano já falou com ambos e, em conjunto acordaram, que os sacerdotes em causa ficarão impedidos do exercício público do ministério até ao final do processo de investigação prévia, que já foi iniciado na Diocese e de acordo com as normas canónicas”, lê-se no comunicado que acrescenta que “seguirá a participação ao Ministério Público”.

A diocese sublinha que a decisão “não é uma assumpção de culpa dos próprios nem uma condenação por parte do Bispo diocesano”, trata-se de “seguir aquilo que o Papa Francisco tem recomendado como norma e prática da Igreja em matéria de abusos, sobretudo depois da publicação do Vade-mécum sobre procedimentos para enfrentar casos de abuso de menores na Igreja”.

De acordo com o relatório da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica em Portugal foram recebidas denúncias relativas a oito casos de alegados abusos ocorridos em sete concelhos da região: dois nas Velas e um na Calheta, ilha de São Jorge; um no Faial; um em Angra do Heroísmo e um na Praia da Vitória, na Ilha Terceira; um no concelho das Lajes e outro em São Roque , ambos na ilha do Pico.

“Estes alegados abusos terão sido cometidos entre 1973 e 2004, por pessoas diferentes, quatro delas - 3 sacerdotes e um leigo - já faleceram. Importa esclarecer que, dos quatro restantes alegados abusos, dois não foram considerados casos relevantes pela Comissão Independente ao cruzar dados entre as denúncias feitas à Comissão e a investigação histórica aos arquivos da diocese, que ocorreu no final de mês de janeiro de 2023”, o que justifica que apenas em relação a dois padres a diocese anuncie as medidas cautelares.

“Depois da vergonha e do escândalo que a revelação da existência de abusos provocaram junto da sociedade, em geral, e dos cristãos em particular, é tempo de ação”, sublinha o comunicado, que pede a “todos os que se sentem feridos, confusos ou perdidos” que “confiem que tudo se fará para implementar medidas punitivas onde necessário, mas também preventivas e formativas, que contribuam para devolver a confiança e a esperança a todos os cristãos”.

A diocese de Angra reafirma que a “ prioridade da Igreja deve continuar a ser as vítimas”, a quem deve ser garantido “o direito à justiça e ao cuidado, sem enjeitar meios técnicos, humanos e financeiros para a reparação do mal infligido”, e que mesmo tendo consciência de que a gravidade destes crimes “hoje é muito diferente do que era no passado”, a diocese de Angra “tudo fará para que os abusos não tenham mais lugar”.

“Estes abusos nunca poderiam ter acontecido na Igreja. Pedir perdão é pouco”, sublinha o comunicado, reiterando assim as palavras utilizadas pelo bispo de Angra, D. Armando Esteves, dia 13 de fevereiro, quando foi conhecido o relatório da Comissão Independente.

A Comissão Diocesana de Angra, que foi das primeiras a serem constituídas no país, pelo então bispo D. João Lavrador - e que durante três anos não recebeu qualquer denúncia – foi já renovada e deixou de contar com a presença de clérigos, sendo agora composta apenas por leigos “especialistas em várias áreas sociais, terapêuticas e jurídicas” .

Desde que o relatório da CI foi conhecido já recebeu “uma nova denúncia, que envolve um sacerdote de São Miguel já falecido”. Um membro da referida Comissão “encontrou-se já com a vítima e disponibilizou o apoio da diocese para prosseguir este caminho de recuperação.”

O site Igreja Açores lembra que desde 2020 que o Vaticano disponibiliza um “vade-mécum” para ajudar os bispos e responsáveis de institutos religiosos no tratamento de denúncias de abusos sexuais de menores.

O documento preparado pelo Dicastério para a Doutrina da Fé (DDF) surgiu depois dos pedidos feitos durante a cimeira para a proteção de menores, que o Papa promoveu em 2019, no Vaticano.

Essa espécie de manual de “boas práticas” indica como proceder nos “casos de abusos sexuais de menores cometidos por clérigos”, visando processos que envolvam bispos, padres e diáconos, de forma a uniformizar os procedimentos e estabelecer regras comuns, em vez de orientações.

O guia em 164 pontos, disponível online desde 2022, explica os procedimentos a seguir, desde a denúncia à conclusão da causa, falando numa “ferida profunda e dolorosa que pede para ser curada”.

Também as diretrizes da Conferência Episcopal Portuguesa para estes casos, datadas de 2020, sublinham que o bispo responsável deve dar seguimento a denúncias e à possível investigação prévia.