Habituado a beijos e abraços, nada fazia crer que ao sair da viatura, em Murça, no distrito de Vila Real, Marcelo Rebelo de Sousa encontrasse um ambiente exaltado por parte de alguns populares, cansados de observarem o mesmo todos os anos: o flagelo dos incêndios na região.
“Não fizeram nada, não têm vergonha e o senhor sabe muito. Havia todos os portugueses de ser como eu. Há 40 anos, era pequenino, com 11 anos, era com baldes que ia apagar o fogo. 40 anos depois, o que é que andou a fazer o PS e o PSD. E o senhor ao tempo que lá está, o que é que faz?, gritou um filho da terra, verdadeiramente furioso com o poder político.
O Presidente da República que, por estes dias, anda a visitar as zonas mais afetadas pelos incêndios do último verão, procurou acalmar os ânimos, mantendo baixo o tom de voz e o sorriso que lhe é característico. De nada valeu, já que o popular não tinha intenção de se calar.
“O senhor fala muito bem, mas não faz nada, não faz nada. Cinco anos depois de Pedrogão não limparam a floresta, não fizeram nada. Incompetência, incompetência! Eu sou emigrante e lá fora sinto-me triste a ouvir o que se passa na minha região”, desabafou.
Ao lado, um outro homem dizia: “Não é falar, é agir”.
Rodeado por seguranças e jornalistas, Marcelo não conseguiu dizer mais do que três ou quatro palavras seguidas, pedindo calma, que o ouvissem, que estava ali para falar, que compreendia. Nada demoveu o emigrante e a conversa resvalou para outros assuntos igualmente polémicos.
“O Sócrates foi preso e ganhava três mil euros na prisão. O Pinho ganha 15 mil euros por mês e um bombeiro ganha 400 euros”, ouviu-se, ao que o Presidente retorquiu: “E o que é que isso tem a ver com os incêndios? Não é responsabilidade do poder político. Os tribunais é que julgam”.
“Os tribunais não trabalham”, disse o homem, para logo a seguir voltar à carga.
“Há 40 anos que não temos saúde, não temos educação, não temos justiça. O que andamos a fazer há 40 anos? Não venha agora com banhos quentes. Há 40 anos, ia para o centro de saúde de Murça às quatro da manhã e agora é igual, é uma vergonha!”, desabafou.
Sem conseguir acalmar os homens, Marcelo Rebelo de Sousa acabou por seguir para cumprimentar os Bombeiros Voluntários de Murça, assim como muitos outros populares que o aguardavam para o tão esperado beijo, abraço e palavra de esperança.