O bispo da Diocese de Leiria-Fátima, D. José Ornelas, abre a sua mensagem de Natal com as palavras do profeta Isaías “O povo que andava nas trevas viu uma grande luz; para aqueles que habitavam na sombra da morte, uma luz começou a brilhar”, alertando que as “alusões dramáticas à destruição, ao luto e à miséria causada pela guerra, com o seu séquito de violência e destruição, de fome e morte” não estão longe do cenário em que hoje se encontra a humanidade, a começar pela própria Palestina, onde nasceram estes versos”.
“A semelhança é evidente; apenas difere pelo monstruoso incremento do poder destruidor da indústria letal da guerra de que dispõem hoje o mundo”, assinala.
Além desta guerra na Palestina, o prelado lembra “outros cenários de conflito e destruição” que “ensombram igualmente o panorama mundial, na Ucrânia, no Iémen, no Sudão e em tantos outros conflitos violentos, terrorismo, discriminação e injustiça, pondo em causa a vida de pessoas e famílias, onde se contam milhares de inocentes crianças e pessoas fragilizadas”.
Para D. José Ornelas, estas situações, a que se juntam “a corrupção e a manipulação de informação e de poder, levam ao descrédito das instituições públicas, a nível nacional e internacional, dando lugar a atitudes de resignação e apatia individualista, bem como ao radicalismo da violência armada ou do desvario manipulador e populista de ocasião”.
Ora, na visão do responsável pela Diocese de Leiria- Fátima, “essas saídas para fora do campo sério do jogo transformador da história não remedeiam os problemas e não criam horizontes de paz duradoura fundada na dignidade, na justiça e na solidariedade, onde possam florescer a luz e o futuro”.
D. José Ornelas destaca que “há dois milénios e meio que a voz do profeta continua a despertar os adormecidos no comodismo ou na apatia e vem semeando uma Palavra e um sonho de Deus para a humanidade”, considerando que “não foi inútil esta Palavra poética e profética”, porque “muitos deixaram-se transformar pela profecia e pelo Espírito que a inspira, sonharam o sonho de Deus e levantaram-se do medo, do desânimo e da apatia”.
“Percorreram desertos de descrença e de ausência de meios, contagiaram outros e atravessaram rios de dificuldades e perigos, reconstruiram ruínas, recuperaram campos e pomares, construíram cidades de dignidade e solidariedade e afirmaram a possibilidade de um futuro melhor”, acrescenta.
“É a essa atitude concreta e transformadora que nos chama o Natal”, sinaliza, esclarecendo que “o otimismo, o sonho criador de futuro, a luz que aquece o coração e move à ação, não são o resultado de tempos fáceis que favorecem visões otimistas e cómodas do amanhã”.
Tornar realidade o Natal
“Sonhar e partilhar o sonho de Deus é particularmente importante e criador, nas situações difíceis e desafiadoras em que vivemos. A luz é particularmente preciosa onde há trevas, o consolo onde existem lágrimas, a reconciliação e a paz onde existem conflitos e guerras”, realça.
Por isso, o bispo de Leiria-Fátima defende que neste Natal, “é a nossa vez de nos levantar, de acender a luz da esperança possível, de vencer os desertos da incredulidade e da comodidade, de participar ativamente na construção de um mundo, mais humano, mais justo e em paz, mesmo a custo das distâncias a percorrer, das dificuldades e medos a vencer, das manipulações e derrotismos a superar”.
“Porque há muitas armas de guerra a transformar em foices e arados; muito troar de canhões, tanques e aviões a substituir por canções de paz e solidariedade; palavras e atitudes de ódio, discriminação e exclusão a transformar em gestos de acolhimento, integração e solidariedade”, explica.
Reforçando que a profecia de Isaías apresenta-se como um dom e um caminho para a transformação que o Natal nos propõe - ‘Porque um menino nasceu para nós, um filho nos foi dado”, D. José Ornelas diz que “não há nada de mais contrário ao choro de um recém-nascido que pede tranquilidade, atenção e cuidado, do que o estrondo das armas, a destruição dos meios de vida, os discursos de ódio e de exclusão”, explicando que no centro do sonho de Isaías, “a promessa do menino gera alegria, ternura e esperança, mas propõe-se igualmente como propósito de acolhimento, cuidado atento e amor”.
“Ele veio para salvar e cuidar, a começar dos mais pequenos e frágeis, mas oferece-se, antes de mais, como um menino, um filho humano, que pede acolhimento, cuidado, atenção e carinho. Porque, acolhendo e cuidando, tornamo-nos melhores, mais humanos e entendemos a realidade concreta do projeto de Deus para transformar o mundo, não destruindo e amedrontado, mas cuidando e acarinhando”.
“Este é o espírito e a atitude do Natal que celebramos”, reforça o prelado, advertindo que “não vale apenas um dia, mas é uma atitude de vida, um projeto de família, de Igreja e de humanidade”.
“Continuemos a tornar realidade o Natal, fazendo ecoar, com a nossa voz, o canto dos anjos e, com as nossas atitudes transformadas, aquilo que cantamos”, conclui.