O novo Estatuto do Serviço Nacional de Saúde (SNS) deve clarificar que os cidadãos são proprietários dos seus dados de saúde e que podem aceder a esta informação sem intermediários, defende o Conselho Nacional da Saúde.
"Este documento deveria vincar o princípio da propriedade dos dados de saúde por parte dos cidadãos, defender o acesso direto (sem necessidade de intermediação) a esses dados e a possibilidade de apoio na sua interpretação", indica o parecer do Conselho Nacional de Saúde (CNS) sobre o Estatuto do SNS proposto pelo Governo.
Segundo o parecer que a Lusa teve acesso, os artigos do estatuto sobre esta matéria são "restritivos quanto à importância de o cidadão ter acesso aos seus dados de saúde e apoio na sua compreensão, se por ele requerida", podendo o Gabinete do Cidadão ter um papel relevante na ligação do cidadão à sua informação de saúde.
A apreciação deste órgão independente salienta ainda a "escassa referência" no estatuto à investigação feita no SNS, uma área "fundamental para a qualidade de vida dos utentes e para o aumento da eficiência dos cuidados que lhes são prestados", com o CNS a defender que deve "ser clara a valorização e proteção do tempo dedicado à investigação por parte dos profissionais do SNS".
O parecer alega também ser importante valorizar o conhecimento que as associações de doentes foram produzindo ao longo de anos, defendendo que este pode ser o momento para introduzir a figura de um "Provedor do Doente" no modelo nacional de um Conselho Consultivo do SNS. .
"Reitera-se a importância de este documento refletir a dimensão de um estatuto e não a de um regulamento de funcionamento, sendo um documento estratégico que defina as competências de cada instituição e como estas se devem relacionar", adianta o parecer.
Segundo o CNS, que é composto por 30 membros, se a pandemia tornou mais premente a necessidade de um novo estatuto para o SNS, uma vez que o atual é de 1993, "importa realçar que este documento deve estar muito para além de circunstâncias particulares, como o atual contexto epidemiológico, antes respondendo a carências já sentidas ao longo dos últimos anos, bem como readaptando-o à nova Lei de Bases da Saúde".
Perante isso, o órgão presidido pelo médico Henrique Barros sugere que não seja feita referência à pandemia no preâmbulo de um documento que se "pretende capaz de refletir uma visão estratégica a longo prazo, em vez de reativo a fenómenos particulares".
Além disso, o preâmbulo do estatuto menciona também o Plano de Recuperação e Resiliência, referência que o CNS considera "igualmente desajustada devido à limitação temporal da aplicação desse plano e à mais longa amplitude temporal de aplicação de um novo estatuto para o SNS".
A proposta do novo Estatuto do SNS foi aprovada em 21 de outubro em Conselho de Ministros, na sequência da aprovação da Lei de Bases da Saúde em 2019.
Segundo o Governo, a aprovação do novo estatuto do depende da audição de diversas entidades (Conselho Nacional de Saúde, Ordens Profissionais, Associação Nacional dos Municípios e estruturas sindicais) e deverá refletir o resultado da consulta pública que o Ministério da Saúde promoveu junto de todos os interessados.
O Governo pretendia que a nova versão do estatuto entrasse em vigor em simultâneo com o Orçamento do Estado para 2022, que foi chumbado pelo parlamento.
O novo Estatuto do SNS prevê, entre outas medidas, a dedicação plena aplicada progressivamente aos médicos e a criação de uma direção executiva para a gestão do SNS.
O documento, que carece de alterações legislativas e regulamentares, que deverão ser aprovadas no prazo de 180 dias a contar da data da sua entrada em vigor, prevê mecanismos de avaliação das instituições de saúde pelos cidadãos, assim como a participação de um vogal não executivo representante e eleito pelos trabalhadores nos hospitais.