A confusão e a incerteza em torno do Brexit podem contribuir para o aumento da violência paramilitar na Irlanda do Norte, segundo uma organização que acompanha a situação no terreno.
Mais de 30 anos depois do acordo de Sexta-feira Santa, de 1998, a violência paramilitar que outrora era uma ameaça constante é hoje esporádica naquela região. Tanto republicanos – na maioria católicos que se identificam como irlandeses e que defendem a integração da Irlanda do Norte na República da Irlanda – como unionistas, na maioria protestantes que defendem a manutenção do território no Reino Unido, ainda têm pequenos grupos armados que continuam a recorrer à violência, mas os incidentes diminuíram drasticamente em comparação com as décadas anteriores ao acordo de Sexta-feira Santa, em que mais de 3.600 pessoas perderam a vida nos conflitos.
Segundo a Independent Reporting Commission (IRC), um organismo composto por quatro pessoas nomeadas pelos Governos britânico, irlandês e da Irlanda do Norte, o Brexit pode servir de agravante, mais do que ignição de violência.
“Compreendemos que as pessoas façam essa ligação, mas as questões em torno do paramilitarismo e a razão pela qual continua a existir, antecedem em muitos anos o Brexit”, diz a organização.
“A verdadeira questão sobre a ameaça à paz na Irlanda do Norte não é o que o BRexit em si provoque a renovação da violência, mas que tenha o potencial de lançar combustível sobre o fogo da continuada violência paramilitar”, acrescenta.
Segundo o IRC houve um ligeiro aumento de violência paramilitar nos últimos 12 meses. Entre setembro de 2018 e de 2019 morreram três pessoas e outras 81 ficaram feridas em ataques desta natureza, a comparar com um morto e 75 feridos nos 12 meses anteriores.
Fronteiras polémicas
As relações entre a Irlanda e a Irlanda do Norte são um dos pontos mais sensíveis das negociações para o Brexit. Atualmente, por serem ambos territórios da União Europeia, existe livre circulação de bens e serviços entre os territórios. A forma como essa fronteira será reposta e controlada é precisamente um dos dilemas mais complexos que os negociadores enfrentam, temendo que a reposição de uma fronteira fechada possa agravar a tensão intercomunitária.
Embora o território tenha votado contra o Brexit, uma análise mais aprofundada revela graves fraturas comunitárias. Cerca de 85% dos que se identificam como católicos votaram para permanecer na União Europeia, contra apenas 40% dos que se identificam como protestantes, segundo um estudo do Parlamento da Irlanda do Norte.
Para o IRC a questão mais grave, e cuja resolução poderia contribuir mais para a paz, é a ausência de um governo regional. O Governo da Irlanda do Norte caiu a 30 de janeiro de 2017, quando os nacionalistas irlandeses do Sinn Fein puseram fim à coligação com os unionistas do DUP.