O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, enviou para o Tribunal Constitucional um decreto que altera a Lei da Nacionalidade, relativo aos judeus sefarditas, e pediu a fiscalização preventiva.
Marcelo Rebelo de Sousa alerta que "a alteração da Lei da Nacionalidade, com efeitos aplicáveis a processos ainda em curso, pode agravar a situação de reféns israelitas em Gaza que têm pendentes pedidos de concessão de nacionalidade portuguesa", refere a Presidência da República, em comunicado.
O chefe de Estado argumenta que tal "pode ser considerado atentatório dos princípios da confiança e da dignidade da pessoa humana, bem como até, objetivamente, do direito à vida, pois já foi libertada uma refém luso-israelita com base na sua nacionalidade portuguesa".
Em causa está apenas e especificamente o artigo 6.º da Lei da Nacionalidade, que cria um novo regime especial aplicável aos pedidos pendentes de concessão de nacionalidade a descendentes de judeus sefarditas portugueses, "introduzindo critérios suplementares para tal concessão", indica Marcelo Rebelo de Sousa no pedido enviado ao Tribunal Constitucional.
A Presidência argumenta que "este novo regime parece ainda violador do princípio da proteção da confiança, ínsito ao princípio do Estado de Direito, tal como consagrado no artigo 2.º da Constituição, tal como, pelos efeitos retroativos, violador da proibição de retroatividade de norma restritiva de direitos, liberdades e garantias, constante do n.º 3 do artigo 18.º da Constituição".
No contexto atual de guerra entre Israel e o Hamas, diz Marcelo Rebelo de Sousa, "a alteração em causa pode projetar-se na situação dos reféns israelitas e de outras nacionalidades, do Hamas, em Gaza, vários dos quais têm pendentes pedidos de concessão de nacionalidade portuguesa, como descendentes de judeus sefarditas portugueses".
O Parlamento aprovou, no dia 5 de janeiro deste ano, alterações ao regime de concessão da nacionalidade para descendentes de judeus sefarditas, que incluem a validação da ligação a Portugal por uma comissão de avaliação ou naturalização após três anos de residência em território nacional.
Segundo o texto aprovado pelos deputados, a "certificação da demonstração de tradição de pertença a uma comunidade sefardita de origem portuguesa com base em requisitos objetivos comprovados de ligação a Portugal (...) é sujeita a homologação final por uma comissão de avaliação nomeada pelo membro do governo responsável pela área da Justiça".
Integram esta comissão "representantes dos serviços competentes em razão da matéria, investigadores ou docentes em instituições de ensino superior em estudos sefarditas e representantes de comunidades judaicas" portuguesas.
Entre as mudanças está também a suspensão do procedimento de aquisição da nacionalidade quando o requerente for alvo de "medidas restritivas aprovadas pela Organização das Nações Unidas ou pela União Europeia", depois de terem sido divulgados casos de magnatas russos sujeitos a sanções pela guerra na Ucrânia que procuraram obter a nacionalidade portuguesa ao abrigo deste regime.
O Governo pode conceder a nacionalidade aos descendentes de judeus sefarditas que demonstrem "a tradição de pertença a uma comunidade sefardita de origem portuguesa, com base em requisitos objetivos comprovados de ligação a Portugal, designadamente apelidos, idioma familiar, descendência direta ou colateral" e que tenham residido em Portugal durante pelo menos três anos, ao invés dos habituais cinco anos.
Além das questões relativas ao regime para descendentes de judeus sefarditas, as alterações à lei da nacionalidade incluem a eliminação da limitação de idade no acesso à nacionalidade através da filiação.