À margem da crise, banca e energéticas somam lucro. Seja pela inflação, pela subida do custo da energia, pela dificuldade em adquirir matérias-primas ou até pela seca, muitas empresas e setores têm saltado de crise em crise. Mas na sombra de muitos, há quem prospere.
A banca anunciou esta semana os resultados da primeira metade do ano, que confirmam a recuperação da pandemia. As principais instituições lucraram mais de mil milhões de euros, o que representa um aumento de 75%, face ao período homólogo.
As maiores empresas de energia também mantém os lucros, mas aqui há nuances. Enquanto a Galp registou um aumento dos lucros de 153% no primeiro semestre, para 420 milhões, a EDP fechou a primeira metade do ano com um encaixe de 306 milhões, menos 11% que em igual período do ano passado.
De onde vêm os milhões arrecadados pela banca?
Os lucros do primeiro semestre não são todos explicados da mesma forma, mas há indicadores transversais a todas as instituições: o crédito está a aumentar, assim como os depósitos e as comissões, enquanto o malparado desce e chega mesmo a atingir mínimos históricos em vários bancos.
Ainda assim, no BPI, metade dos lucros de 201 milhões chegaram de Angola. No BCP (74,5M) e no Santander Totta (241M) os números de 2022 beneficiaram da conclusão da reestruturação, encargos que ainda entraram nas contas de 2021 mas já não passaram para este ano.
Destaque ainda para a CGD, que apresentou o maior bolo. Fechou o primeiro semestre com lucros de 486 milhões, parte explicados pela recuperação de crédito malparado e provisões. Com base nestes resultados, o banco público admite pagar quase 200 milhões ao Estado em dividendos. Falta ainda conhecer as contas do resto do ano.
Onde ganham e perdem as energéticas?
A escalada do preço do petróleo tem alimentado os lucros da Galp, é o que mostram os resultados do primeiro semestre. Impulsionou o negócio da extração, melhorou o negócio da refinação e está a impulsionar as vendas nas bombas e até as renováveis.
A empresa admite “condições de mercado favoráveis”, desde a subida da cotação do barril no mercado internacional, até à guerra na Ucrânia. Chegou ao final de junho com lucros de 420 milhões, face ao primeiro semestre do ano passado. Antes de juros, impostos, depreciações e amortizações, os lucros disparam 97%.
Já a EDP conta uma história diferente. Fechou o primeiro semestre com um recuo de 11% nos lucros, para 306 milhões, face ao período homólogo. Resultados explicados, sobretudo com a seca que assola o país. Ou seja, a produção hídrica penalizou os resultados nacionais, com um prejuízo de mais de 100 milhões de euros. Isto num período de crescimento da empresa no Brasil e das renováveis no grupo, a nível global.
Os lucros extraordinários podem ser taxados?
Espanha já agiu. O governo de Pedro Sánchez aprovou um imposto extraordinário sobre a banca e o setor energético. O mesmo já tinha sido aprovado no Reino Unido, que aprovou uma taxa de 25% às petrolíferas.
Por cá, Marcelo Rebelo de Sousa pediu esta sexta feira maior responsabilidade social às empresas com lucros extraordinários, com o sacrifício da distribuição de dividendos. No entanto, o Presidente da República considera que um eventual imposto não pode ser retroativo e tem de ser justo.
Esta semana o PCP defendeu “justa indignação” pelos resultados da Galp e juntou-se ao Bloco de Esquerda, na defesa de uma taxa sobre os lucros extraordinários. Já o presidente do PSD, Luís Montenegro, descartou a medida num encontro organizado pela CGD: “não há justificação para criar mais impostos e será um sinal incorreto aos que investem no setor da energia em Portugal”.
Dentro do governo a ideia anda às voltas, como num jogo do empurra. Já ouvimos o Ministro da Economia e do Mar, António Costa e Silva, a defender no Parlamento uma taxa pontual sobre os lucros acrescidos das energéticas , com o aumento dos preços. Uma ideia contestada no Ministério do Ambiente, que tem a tutela da energia. O próprio Secretário de Estado da energia, João Galamba, tem rejeitado categoricamente qualquer imposto adicional sobre o setor.
Em declarações à Renascença, o deputado socialista Carlos Pereira defende que o governo está a analisar a aplicação de uma taxa sobre os lucros excessivos das energéticas e garante que as empresas que têm estado a ganhar com a atual situação “serão avaliadas no quadro do próximo Orçamento, não tenho dúvidas sobre isso”.
Na banca, os próprios banqueiros fizeram saber esta semana que não aceitam um novo imposto. Lembram que já pagam muitos impostos e ainda têm a contribuição sobre o setor, o Fundo Único de Resolução europeu, o fundo de resolução e o adicional de solidariedade, introduzido na pandemia.
Para além disso, a rentabilidade ainda não é suficiente, segundo os banqueiros. O líder o BPI explica que os lucros ainda não cobrem o custo do capital. Pelo BCP, Miguel Maya reforça que têm “resultados extraordinários por baixo”. O presidente da CGD nem quer ouvir falar em “lucros excessivos”, Paulo Macedo lembra que as avaliações o que mostram são riscos, como a recessão, diminuição de rendimento disponível e aumento de malparado.
Por tudo isto, o CEO do Santander Totta arrisca mesmo dizer que em vez de seguir o governo espanhol, António Costa até devia fazer o contrário, e baixar a carga fiscal sobre a banca. “Quando se fala de impostos, se calhar está na altura de os tirar”, defende Castro e Almeida.