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O ano de 2017 começou com a morte da maior personalidade política das últimas décadas em Portugal. Inimigo da ditadura de Salazar, amigo da liberdade, co-fundador do PS e da democracia nacional, primeiro-ministro, Presidente da República, Mário Soares morreu a 7 de Janeiro.
O pai da descolonização e da adesão à então CEE, que marcou a política portuguesa antes e depois do 25 de Abril, tinha 92 anos.
No dia seguinte ao desaparecimento de Mário Soares, morreram Daniel Serrão, médico, professor, especialista em ética da vida e apaixonado por pessoas, aos 88 anos, e Guilherme Pinto, presidente da Câmara de Matosinhos.
Dois antigos ministros das Finanças de gerações diferentes morreram em 2017: Medina Carreira (86 anos) e Miguel Beleza (67 anos).
Medina Carreira fez parte do I Governo constitucional, liderado por Mário Soares, e negociou um empréstimo com o FMI. Pessimista ou realista? Nos últimos anos, ficou conhecido pelas críticas ao rumo do país.
Miguel Beleza foi ministro das Finanças no segundo governo de Cavaco Silva, entre 1990 e Outubro de 1991. Impulsionou a criação da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e colaborou no processo de adesão de Portugal à União Económica e Monetária. Depois, foi governador do Banco de Portugal e trabalhou no FMI.
UM PEDAÇO DO ROCK
Portugal perdeu o seu comendador do rock em 2017. Zé Pedro morreu a 30 de Novembro, vítima de doença prolongada. Tinha 61 anos.
Fundou os Xutos & Pontapés, em 1978. Tudo começou com um anúncio (“Baterista e baixista precisam-se para grupo punk”) e o resto é história. Guitarrista, letrista, pioneiro do punk, melómano, comunicador, dinamizador, sem ele a música portuguesa das últimas décadas não teria sido a mesma.
Quem o conheceu de perto, elogia o carisma, o lado humano de um grande amigo e recorda “o sorriso do Zé Pedro”, que deixou hinos como “O homem do leme”, “Não sou o único”, “Submissão” ou “N’América”.
O ano musical também ficou marcado pelas mortes de Daniel Bacelar, o primeiro “rocker” português; José Luís, antigo vocalista dos Ekos; e Cláudio Panta Nunes, violoncelista dos Corvos.
O mundo das artes também chorou a perda dos actores João Ricardo, Fernanda Borsatti e Maria Cabral, e do realizador António de Macedo. Os dois últimos fizeram parte do Novo Cinema português.
José Manuel Castello-Lopes deixou a sua marca nos bastidores do cinema, como empresário e distribuidor. Morreu aos 86 anos.
O biólogo e especialista em oceanografia Mário Ruivo morreu em Janeiro, aos 89 anos. Foi fundamental na definição do tema da Expo'98, os oceanos, coordenando um grupo de peritos criado para o efeito.
AMÉRICO E BELMIRO, CONSTRUTORES DE IMPÉRIOS
Portugal perdeu em 2017 dois empresários que marcaram o mundo dos negócios nas últimas décadas.
Natural de Mozelos, Santa Maria da Feira, Américo Amorim era o homem mais rico de Portugal e fazia parte do “top” 500 da revista Forbes, com uma fortuna superior a 4.000 milhões de euros. Apesar de tudo, não se considerava rico. O “rei da cortiça” jogava em vários tabuleiros. Estendeu a sua actividade à banca, bolsa, casinos, luxo, unidades turísticas e empresas petrolíferas.
Belmiro de Azevedo transformou o Grupo Sonae num gigante. Abriu o primeiro hipermercado em Portugal, com a marca Continente, e diversificou os negócios para as telecomunicações, com a operadora Optimus. Fundou o jornal “Público”, criticava abertamente o poder político e criou uma fundação.
BISPOS DO POVO
“Os pobres não podem esperar”, disse em pleno resgate da troika. A preocupação com os desfavorecidos foi uma das marcas do bispo do Porto, D. António Francisco dos Santos, que morreu a 11 de Setembro, vítima de um enfarte. Tinha 69 anos. O Papa Francisco destacou o pastor “afável” e “generoso” numa mensagem lida durante as cerimónias fúnebres.
O rapaz de Cinfães esteve para ser advogado, mas contrariou a vontade da família e foi ordenado padre em 1972. Enquanto bispo auxiliar de Braga, bispo de Aveiro ou responsável pela diocese do Porto, manteve sempre uma ligação de grande proximidade com a comunidade e com os problemas do mundo.
Duas semanas depois, a 24 de Setembro, morreu D. Manuel Martins, aos 90 anos. Natural de Leça do Balio, foi como bispo de Setúbal que se destacou ao alertar para a fome e miséria que assolava a região na década de 80.
O “bispo vermelho”, como ficou conhecido, foi um dos principais responsáveis pela acção que a Igreja Católica continua a ter na região de Setúbal, designadamente no apoio social aos mais pobres e excluídos.
Em Abril, o país despediu-se do padre franciscano Joaquim Carreira das Neves. Especialista em estudos bíblicos, professor e autor de várias obras, faleceu aos 83 anos.
Numa entrevista em 2011, falou abertamente dos seus problemas de saúde: “Nós somos um todo, matéria e espírito. Se tivermos boa disposição, se não nos agarrarmos à nossa doença mas nos agarrarmos à vida, com esperança, com fé, mais facilmente se leva a vida”.
ONDE É QUE VOCÊ ESTAVA NO 25 DE ABRIL?
A pergunta era quase uma marca registada de Armando Baptista-Bastos, jornalista e escritor que morreu a 8 de Maio, aos 84 anos.
Começou o percurso profissional no jornal “O Século”, mas foi despedido por apoiar Humberto Delgado. Foi considerado “contumaz adversário do regime” e também foi afastado da RTP. Prosseguiu a carreira em vários títulos, com destaque o “Diário Popular” onde trabalhou durante 23 anos. Passou pela rádio e televisão, onde fez os programas de entrevistas "Conversas Secretas", na SIC, e "Cara-a-Cara", na SIC Notícias.
A 24 de Novembro, morreu outra personalidade marcante do jornalismo e da comunicação nacional. Pedro Rolo Duarte perdeu a batalha contra um cancro, aos 53 anos.
Esteve na fundação da revista “Visão”, foi editor da revista “Kapa”, do suplemento DNA (do "Diário de Notícias"), e do “Independente”. Deixa a sua marca na imprensa escrita, mas também fez televisão e rádio. Em 1984, assumiu, na Renascença, o programa em directo “Sessão da Meia-Noite”, a convite de Rui Pêgo e Henrique Mendes.
Manuela de Azevedo também foi uma pioneira, mas de outra geração. A primeira jornalista mulher a ter carteira profissional em Portugal morreu a 10 de Fevereiro, com 105 anos.
Foi romancista, ensaísta, poeta e contista, tendo escrito também peças de teatro, uma delas censurada pelo regime de Salazar.
O jornalismo desportivo e a Renascença perderam um dos seus repórteres lendários. Joaquim Vieira relatou mais de 20 edições da Volta a Portugal em bicicleta como só ele conseguia, acompanhou centenas de jogos de futebol e deixou amigos por onde passou. Tinha 65 anos.
No futebol, 2017 foi o ano da morte de Manuel de Oliveira, aos 85 anos, antigo futebolista, treinador e comentador da Renascença; do antigo árbitro José Pratas, de 59 anos, que esteve em actividade até 2002; de Amândio de Carvalho, antigo vice-presidente da Federação Portuguesa de Futebol; e de Edu Ferreira, jogador do Boavista de 20 anos que lutava contra um cancro.