Aristides Sousa Mendes não hesitaria hoje em ser solidário com os refugiados. “Claro que ajudaria”, diz o neto
16-02-2016 - 09:28
 • Pedro Mesquita

Em 1940, Aristides de Sousa Mendes era cônsul de Portugal em Bordéus. Concedeu visto a milhares de judeus perseguidos pelo nazismo, salvou-os do holocausto. A desobediência a Salazar valeu-lhe o banimento e a penúria.

O drama hoje vivido pelos refugiados que chegam à Europa e tardam em ser ajudados trás à memória a coragem de um português que não hesitou em ser solidário. Em 1940, Aristides de Sousa Mendes era cônsul de Portugal em Bordéus. Concedeu visto a milhares de judeus perseguidos pelo nazismo, salvou-os do holocausto. A desobediência a Salazar valeu-lhe o banimento e a penúria. Como olharia Aristides para esta nova era de refugiados?

Foi esta pergunta que a Renascença colocou a António Sousa Mendes, neto de Aristides. Resposta pronta: "Claro que ajudaria. Foi sempre essa a sua atitude. Era um cidadão do mundo e um cidadão do mundo deve a solidariedade, o amor e a amizade por todos os outros, independentemente da origem."

O que se passa, então, com a Europa dos nossos dias? "Como neto de Aristides de Sousa Mendes, e tendo vivido numa família em que o tema dos refugiados foi sempre muito sensível, tenho a minha opinião. Penso que o comportamento da Europa, e de muitos europeus, é muito orientado para o comodismo, em que não se aplicam os valores cristãos", responde António.

É neste quadro que António Sousa Mendes critica a atitude de países desenvolvidos, como a Dinamarca, que decidiu confiscar bens de valor aos refugiados e, assim, diminuir os custos da solidariedade: "São atitudes puramente mercantis. Posso ajudar-te, mas o que ganho com isso? O meu avô não procurou moeda de troca. O meu avô não foi educado dessa maneira".

Aristides Sousa Mendes ajudou os perseguidos, não teve dúvidas em desobedecer a Lisboa. "Não participo em chacinas, por isso desobedeço a Salazar. Foi esta a frase que ele disse e que foi reportada para o Ministério dos Estrangeiros", recorda.

A ousadia do cônsul valeu-lhe o isolamento e a penúria, recorda António: "Salazar, logo em Julho de 40, deu ordem para que não lhe pagassem o salário. O meu avô tinha um cheque de oito mil escudos. Quando foi para receber, não lho pagaram. A partir daí, ele começou a acumular dividas."

"Actualmente, não há uma cultura de partilha, do chamado 'bom samaritano', que nos é transmitida através do cristianismo. Assim sendo, também não se cultiva a solidariedade", remata António Sousa Mendes.