Caso UEFA vs. Superliga Europeia. O que está em causa?
21-12-2023 - 07:50
 • Inês Braga Sampaio

Tribunal de Justiça da União Europeia decide esta quinta-feira se a Superliga pode acontecer. O Explicador Renascença esclarece sobre o que está em causa e quais as ramificações de cada possível decisão.

O Tribunal de Justiça (TJ) da União Europeia decide, esta quinta-feira, sobre o caso UEFA vs. Superliga Europeia.

Doze clubes anunciaram, em 2021, a criação de uma competição fechada, milionária e a convite, para uma elite europeia: os fundadores eram Real Madrid, Barcelona e Atlético de Madrid, de Espanha; Manchester City, Manchester United, Tottenham, Arsenal, Chelsea e Liverpool, de Inglaterra; e Juventus, Inter de Milão e AC Milan, de Itália.

Na altura, a contestação de jogadores, treinadores, adeptos e até políticos foi tal que a maioria dos clubes desistiu. Restaram Juventus, Real e Barcelona, que se mantêm agarrados à ideia.

Esta quinta-feira, ficam a saber, em definitivo, se o projeto é possível. O Explicador Renascença esclarece o que está em causa e quais as possíveis repercussões de um e de outro desfecho.

O que está em causa?


Trata-se de um processo que começou num tribunal de Madrid, que o reenviou para o TJ da União Europeia.

Alexandre Mestre, antigo secretário de Estado do Desporto e membro independente do Comité de Governance e Compliance da UEFA, explica à Renascença que o que está em causa é perceber se a UEFA e a FIFA mantêm o "monopólio" sobre as competições internacionais, logo, se têm de dar autorização prévia para que uma prova paralela, como a Superliga, possa ser criada.

É preciso perceber se essa exclusividade da FIFA e da UEFA é compatível com o direito da União Europeia, em particular com o direito da concorrência, mas também com a liberdade de circulação de trabalhadores, prestação de serviços, capitais, entre outros.

"O que é que daí resultará? Perceber se, de futuro, podem a FIFA e UEFA manter a sua competência exclusiva para organizar as competições e para autorizar que outros possam também organizar as suas próprias competições. Só há uma Federação Internacional por modalidade, só há uma Confederação Europeia por modalidade e não se multiplicam, para haver precisamente essa lógica federada de que há uma unicidade", explica.

O que é que acontece se o tribunal der razão à UEFA?


É o fim do projeto da Superliga Europeia, dado que fica estabelecido que quaisquer novas provas do género terão de ter autorização da FIFA e da UEFA para existir:

"Mantém-se uma lógica de modelo piramidal com unicidade. Só há uma Federação Internacional a reger a modalidade. No modelo atual, podemos dizer que este é o campeão e aquele atingiu aquela competição porque teve mérito desportivo, teve resultados que levaram a isso, e não porque foi convidado em função do palmarés, do nome, do prestígio ou das receitas que possa gerar."

Em caso de vitória da Superliga, o que é acontece à Champions?


Depende dos clubes envolvidos.

Se quiserem disputar apenas a Superliga Europeia, empobrecerão a Liga dos Campeões, que entrará numa disputa de imagem e prestígio com a nova prova. Se decidirem conciliar as duas, adensarão mais ainda o calendário - isto numa altura em que a FIFA acaba de anunciar um Mundial de Clubes alargado, com 32 equipas.

De qualquer forma, os clubes estarão sempre livres de sanções.

Pode haver clubes portugueses na Superliga?


Sim. Aliás, segundo Pinto da Costa, o FC Porto chegou a ser convidado para integrar o lote de clubes fundadores, mas recusou.

A nova proposta da Superliga Europeia, apresentada em fevereiro, contempla uma "competição aberta, de várias divisões, composta por 60 a 80 equipas", com sistema de qualificação aberto e baseado no desempenho nas competições nacionais.

Isso não coloca em causa o futebol que conhecemos?


"Será um princípio do fim do modelo europeu do desporto, tal como o conhecemos", confirma Alexandre Mestre.

Para começar, uma vitória da Superliga Europeia, esta quinta-feira, permite que várias entidades realizem competições pan-europeias - não apenas a Superliga.

O especialista em direito do desporto alerta que essa descentralização do futebol pode, no pior cenário, levar a mudanças de regras do jogo consoante a prova e, por consequência, a uma descaraterização tal que a única coisa que reste da modalidade seja o nome:

"Se houver várias provas, não há garantia de que as leis do jogo sejam iguais. No fundo, depois começa a haver várias [empresas] a organizar, com regras diferentes, com regulamentos diferentes. Num caso pode haver transferências desta maneira, outros casos não pode haver. Num caso pode haver empresários a exercer funções sem requisitos, noutra tem de exercer com requisitos."

"Ou seja, teríamos vários modelos paralelos em que a única coisa em comum, praticamente, seria ser o nome da modalidade e as regras do jogo serem ser completamente diferente", explica.