Mariana Vieira da Silva: Governo apresentou cenários orçamentais distintos em Bruxelas e em Lisboa
17-10-2024 - 01:50
 • José Pedro Frazão

A dirigente do PS diz que o Governo segue um caminho de "desejo" de eleições a curto prazo e sustenta que as alegadas conversas de Montenegro com Ventura revelam um plano B à estratégia de pressão sobre o PS. No programa "Casa Comum", o social-democrata Duarte Pacheco confessa desapontamento com um Orçamento que não desce carga fiscal e acaba a concordar com as cautelas de Centeno.

A antiga ministra socialista Mariana Vieira da Silva acusa, no programa Casa Comum da Renascença, o Governo de enviar cenários orçamentais muito diferentes para Bruxelas face ao anunciado em Lisboa no Orçamento do Estado para 2025 (OE2025).

Na perspetiva da dirigente do PS, estão em causa as previsões contidas no Plano Orçamental enviado à Comissão Europeia, nomeadamente no plano do crescimento da economia e dos salários, face ao anunciado na proposta de Orçamento do Estado que deu entrada na Assembleia da República.

"Sei que o Governo dirá que que entregou em Bruxelas um cenário de 'políticas invariantes', mas a diferença entre o crescimento dos salários previstos não se pode justificar com políticas. São diferenças muito grandes. O crescimento duplica no último ano no quadro de referência que foi entregue em Bruxelas. Não conheço um economista que diga que as políticas têm aquele tipo de influência", contesta Vieira da Silva, lembrando a importância da evolução dos salários da função pública para o crescimento geral das remunerações.

Para a antiga governante, Portugal corre o risco de apresentar um discurso diferente em Bruxelas face ao que é feito no país, "o que não tínhamos há muitos anos e que não é positivo para o debate politico ou para a política orçamental". Vieira da Silva diz que os cenários são distintos não apenas entre o Orçamento e o Programa enviado para Bruxelas, mas também com o Programa de Estabilidade e até o programa da Aliança Democrática (AD).

No programa Casa Comum da Renascença, a vice-presidente da bancada socialista sustenta que no Programa Orçamental fica evidente que o Governo não vai ter margem orçamental "precisamente" quando o PIB estiver a crescer menos.

"Este Orçamento só faz uma escolha: usar toda a margem que existe sem pensar no futuro. Essa decisão de fazer políticas pró-ciclicas em 2025, gastando mais quando o país mais está a crescer, retirando disponibilidade das margens orçamentais à luz das regras que todos conhecemos, ainda que sejam novas, é uma escolha errada e que só se pode justificar pela convicção ou desejo de ter eleições rapidamente", afirma Mariana Vieira da Silva.

Orçamento de Natal

Para Duarte Pacheco, este é um Orçamento do Estado cheio de benesses a diversos grupos da sociedade, em vez de apostar na redução dos impostos.

"Este Orçamento mostra que o Natal é quando um homem quiser. Veio recheado de presentes de Natal para toda a gente: funcionários públicos, pensionistas, carreiras profissionais, jovens e empresas. Como eleitor do PSD, preferia um orçamento que reduzisse mais a carga fiscal, esta porque foi aumentando todos os anos", critica o antigo deputado social-democrata, especialista em economia e finanças.

Duarte Pacheco concorda com as cautelas propostas pelo governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, em relação à necessidade de também o Estado constituir "almofadas financeiras" num tempo mais favorável.

"Temos de fazer este tipo de despesa suplementar com muito mais cautela nos próximos anos. Não podemos alimentar a despesa corrente acreditando que vamos ter sempre bonança na nossa economia", alerta Duarte Pacheco.

Conversas secretas e discretas

Sobre as divergências entre Luís Montenegro e André Ventura sobre o que foi prometido e negociado entre ambos em julho, antes da apresentação do Orçamento do Estado, registo para mais críticas de Mariana Vieira da Silva dirigidas ao Governo e ao PSD.

A dirigente socialista considera que a polémica é reveladora de uma dupla lógica na estratégia do Governo.

"Queriam fazer de forma reservada o Plano B enquanto no Plano A se criava uma pressão que nunca tinha visto nesta dimensão - e tão cedo como esta foi - sobre o Partido Socialista, criando a ilusão de que 'era o PS ou nada', enquanto nos bastidores se trabalhavam soluções alternativas", conclui a antiga ministra.