Uma equipa internacional de astrónomos anunciou, esta segunda-feira, que foi identificada na atmosfera Vénus uma molécula rara - a fosfina - indicadora da existência de vida.
Esta molécula, composta por um átomo de fósforo e três átomos de hidrogénio, foi detetada nas nuvens altas do planeta, o que indica que o vizinho inóspito da Terra pode ser habitado por micróbios.
O artigo, publicado na revista Nature Astronomy, teve o contributo da portuguesa Clara Sousa Silva, astrofísica molecular que trabalha no Departamento de Ciências da Terra, Atmosféricas e Planetárias do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), nos Estados Unidos.
Para Clara Sousa-Silva, que tem estudado a fosfina desde o doutoramento, "descobrir fosfina em Vénus constitui um verdadeiro bónus".
A investigação juntou ainda investigadores dos Estados Unidos, Reino Unido e Japão.
De acordo com o estudo, a fosfina, na Terra, só pode ser encontrada decorrente de dois processos: ou pela fabricação de forma industrial - é utilizada principalmente em inseticidas - ou pela ação de micróbios que se desenvolvem em ambientes sem oxigénio – chamados anaeróbicos.
O gás, altamente tóxico, pode ser encontrado, por exemplo, nas fezes de animais como pinguins ou em ambientes pobres em oxigénio, como pântanos.
A primeira deteção da molécula em Vénus foi feita com a ajuda do Telescópio James Clerk Maxwell (JCMT), operado pelo Observatório do Leste Asiático no Havai. Foram também usadas 45 antenas do Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) – instalação astronómica no Chile.
Os astrónomos consideram esta descoberta bastante significativa, mas reconhecem muito trabalho pela frente para confirmar presença de ”vida”.
É que a atmosfera de Vénus é constituída em cerca de 90% por ácido sulfúrico, o que dificultaria a sobrevivência de micróbios.
"A descoberta levanta muitas questões, tais como é que os organismos poderão sobreviver na atmosfera do planeta vizinho. Na Terra, alguns micróbios conseguem suportar até cerca de 5% de ácido no seu meio, mas as nuvens em Vénus são praticamente só constituídas por ácido", assinala Clara Sousa-Silva, citada em comunicado pelo Observatório Europeu do Sul (OES).Embora já se tenha teorizado sobre o assunto, a possibilidade de existir vida em Vénus sempre foi minimizada pela ciência, já que o planeta reúne condições difíceis à existência de vida: tem uma atmosfera composta de 96% de dióxido de carbono e uma pressão ao nível do solo 92 vezes maior que a da Terra – ou o equivalente a estar quase um quilómetro abaixo do nível do mar. Já as temperaturas, na superfície, rondam os 460ºC.