O primeiro-ministro, António Costa, ameaça com a demissão, se a devolução dos nove anos, quatro meses e dois dias de tempo integral da carreira dos professores for aprovada em votação final global pelo Parlamento.
Leia, na íntegra, o discurso do primeiro-ministro
Desde a sua tomada de posse em 26 de novembro de 2015 o Governo cumpriu, um após outro, todos os compromissos que assumiu com os portugueses, e com a maioria parlamentar que viabilizou na Assembleia da República a sua formação.
Ao contrário do que muitos então recearam, foi possível assegurar estabilidade política, recuperar a credibilidade internacional do país, reverter todas as medidas que haviam cortado o rendimento dos portugueses, estabilizar o sistema financeiro, incutir confiança no investimento.
Assim, conseguimos assegurar um período sustentado de crescimento económico acima da média europeia, de forte redução do desemprego, progressiva valorização dos rendimentos, redução da pobreza e das desigualdades, com uma sólida melhoria das finanças públicas, com diminuição do défice orçamental e da dívida pública.
Em todas as medidas adotadas, da reposição de vencimentos e pensões à redução do IRS ou do IVA; da gratuidade dos manuais escolares à redução do número de alunos por turma; da diminuição em 25% das taxas moderadoras, ao novo regime dos passes sociais; da valorização do abono de família aos aumentos extraordinários das pensões; do aumento do Salário Mínimo Nacional à reposição dos feriados nacionais, sempre tivemos em conta, não só a sua compatibilidade com a disponibilidade orçamental e o crescimento económico no presente, como também a sua sustentabilidade futura, de modo a garantir que nenhum passo seria maior do que a perna, garantindo, sempre, a irreversibilidade destas medidas.
Cada medida foi avaliada e adotada com a conta, peso e medida adequados.
Como disse no dia 22 de maio de 2017, quando a Comissão Europeia encerrou o procedimento por défice excessivo: “Não podemos voltar a perder o que hoje alcançamos. Devemos, por isso, prosseguir o caminho que estamos a construir, com uma política orçamental responsável que acompanha o triplo desígnio de termos mais crescimento, melhor emprego e maior igualdade.”
Foi também com esta preocupação que conduzimos a nossa política na administração pública: repondo progressivamente a totalidade dos salários e remunerações complementares que haviam sido cortadas; o horário de trabalho, alterado unilateralmente; integrando nos quadros os que ilegalmente eram mantidos em situação precária; reforçando os serviços públicos com novos recursos humanos; e iniciando – como previsto – em janeiro de 2018 o descongelamento das carreiras de todos os trabalhadores e servidores do Estado.
Assim, ao longo deste ano e meio já tiveram oportunidade de progredir na carreira mais de 350 mil funcionários que tinham as suas carreiras anteriormente congeladas.
Nem no Programa do Governo, nem no programa eleitoral de qualquer partido, estava previsto que o descongelamento das carreiras fosse acompanhado da recuperação do tempo entretanto decorrido.
O que se previa e cumpriu era muito claro: repor o tempo a contar, sem pretender refazer a história.
Contudo, a Lei do Orçamento do Estado para 2018 veio impor ao Governo o dever de negociar com os sindicatos “a expressão remuneratória do tempo de serviço (…) em corpos especiais, (…) tendo em conta a sustentabilidade e compatibilização com os recursos disponíveis”.
Foi assim que assinámos uma declaração de compromisso com os sindicatos dos professores que previa mitigar o impacto do congelamento.
De boa fé e com o escrupuloso respeito pela Assembleia da República, iniciámos negociações, procurando acordar uma solução que fosse no presente e no futuro financeiramente sustentável e que assegurasse igualdade de tratamento dos professores relativamente aos restantes corpos especiais, como os magistrados judicias e do MP; militares das FA e da GNR e oficiais de justiça.
Durante este longo período confrontámo-nos com a continuada intransigência sindical, que nunca se moveu da repetida reivindicação de nove anos, quatro meses e dois dias, recusando sistematicamente as propostas do Governo.
Finalmente chegámos a um ponto em que nada justificava prolongar o impasse negocial, devendo consolidar o compromisso que havíamos assumido de mitigar os efeitos do congelamento.
Assim, aprovámos um Decreto-Lei que assegurou a todos os professores e educadores o correspondente à recuperação de 70% do respetivo módulo de progressão, ou seja 2 anos, 9 meses e 18 dias.
Esta solução foi naturalmente adotada para os restantes corpos especiais, conforme decreto que aprovámos e aguarda promulgação por S. Exa. o Presidente da República e que assegura também a recuperação de 70% dos respetivos módulos de progressão.
Ontem, a Comissão Parlamentar de Educação aprovou na especialidade um conjunto de normas que, independentemente das muitas dúvidas de inconstitucionalidade que suscita, é socialmente injusto e financeiramente insustentável.
Apesar de não estar ainda concluído o processo legislativo é dever do Governo ser desde já claro para com os portugueses quanto às consequências da votação de ontem:
1.ª - A criação de um encargo adicional de pelo menos 340 M€ entre este ano e o próximo, devido ao pagamento de retroativos relativos a 1 de janeiro de 2019;
2ª. - A aplicação deste diploma ao ano de 2019 implicaria necessariamente um orçamento retificativo o que quebraria a regra da estabilidade e da boa gestão orçamental que tem sido cumprida, todos os anos, desde 2016.
3.ª - A necessária extensão deste diploma aos demais corpos especiais, por si só, implicaria um acréscimo da despesa certa e permanente em 800 M€ por ano.
4.ª - Como já hoje vieram declarar as duas centrais sindicais, a restrição desta solução aos professores e restantes corpos especiais, coloca em situação de desigualdade os demais funcionários públicos e, convém acrescentar, todos os portugueses que sofreram nos seus salários, nas suas pensões, no seu emprego e nos seus impostos, os efeitos da crise.
5.ª - A acomodação no curto, médio e longo prazo dos encargos gerados por esta medida só seria possível com inevitáveis cortes no investimento e nos serviços públicos, ou com significativos aumentos de impostos.
Qualquer uma destas consequências compromete a governabilidade presente e condiciona de forma inadmissível a governação futura, em termos que só o eleitorado tem legitimidade para determinar.
A aprovação em votação final global desta iniciativa constitui uma rutura irreparável com o compromisso de equilíbrio entre a devolução de rendimentos e direitos com a consolidação das contas públicas e compromete a credibilidade internacional de Portugal.
Ao Governo cumpre garantir a confiança dos portugueses nos compromissos que assumimos e a credibilidade externa do País.
Nestas condições, entendi ser meu dever de lealdade institucional informar suas Exas. o Presidente da República e o Presidente da Assembleia da República que, a aprovação em votação final global desta iniciativa parlamentar forçará o Governo a apresentar a sua demissão.