O relator da comissão de inquérito ao Banif, o socialista Eurico Brilhante Dias, sublinhou esta sexta-feira que os "primeiros responsáveis" pelo que sucedeu ao banco são os administradores que geriram, de forma "insustentável", a entidade até 2012. Mas critica também o Governo de Passos Coelho, sobretudo a ministra das Finanças Maria Luís Albuquerque. O PSD já respondeu, acusando Brilhante Dias de uma "tentativa de lavagem" da responsabilidade do Governo de António Costa.
"Os primeiros responsáveis pela circunstância em que chegou o Banif são aqueles responsáveis pela sua administração, os accionistas e responsáveis da administração que conduziram o banco até 2012. Um negócio insustentável com graves problemas procedimentais e sem uma estrutura accionista em 2012 capaz de suportar este embate", sublinhou Brilhante Dias, em conferência de imprensa, referindo-se ao programa de ajustamento português e ao cenário macroeconómico europeu.
Além da gestão e dos accionistas do banco, o deputado apontou baterias ao Governo de Passos Coelho, sobretudo Maria Luís Albuquerque, que, na opinião do deputado, não zelou pelo património que também era do Estado.
Supervisão também criticada
Na apresentação preliminar do relatório sobre as conclusões à comissão de inquérito ao Banif, o deputado socialista disse que a supervisão prudencial, em particular até 2010, foi ineficaz. "O que o sr. governador chamou de 'light supervison', por oposição à 'hard supervision', não teve eficácia".
"Mesmo mais tarde", continuou Brilhante Dias, "é curioso, considera [o governador] que o Banif está ao nível intermédio das melhores práticas. Se estava ao nível intermédio das melhores práticas não sei o que diga das piores".
"O supervisor foi construindo as soluções, mas não podemos deixar de concluir que a maioria foram soluções de emergência", prosseguiu.
O deputado responsável pelo relatório final da comissão esteve esta sexta-feira mais de 30 minutos a apresentar aos jornalistas a versão provisória do texto, em conferência de imprensa na Assembleia da República. "Eu diria que quando temos quatro mil milhões de euros de ajuda pública, quase tudo falhou", advogou o deputado numa crítica ao governo anterior.
Banif não estava preparado para a crise
O Banif, diz Brilhante Dias, "não tinha uma estrutura accionista que em 2011 fosse capaz de garantir o reforço de capital que suportasse as imparidades que se foram acumulando e as novas necessidades que foram exigidas" nos anos da "troika".
O Estado e os governos funcionam como accionistas do banco desde a injecção pública de Janeiro de 2013 e, nesse sentido, tinha a "responsabilidades de zelar pelo seu património", uma "dupla responsabilidade" porque é património de todos os portugueses.
"O decisor público, em 2012 e 2013, assim como em 2015, foi posto perante circunstâncias de emergência. E quando assim é, é porque não fomos capazes de antecipar grande parte dos efeitos", vincou Eurico Brilhante Dias.
Urgência ditou solução para o Banif
Sobre a passagem de pasta entre os dois governos recentes PSD/CDS-PP e o executivo do PS liderado por António Costa, Eurico Brilhante Dias diz que há versões diferentes dos factos e apenas uma palavra em comum entre Maria Luís Albuquerque, Mário Centeno e o secretário de Estado Ricardo Mourinho Félix: urgência.
Em 20 de Dezembro, domingo ao final da noite, Banco de Portugal e Governo anunciaram a resolução do Banif, a venda de alguns activos ao Santander Totta e a transferência de outros (muitos deles "tóxicos") para a sociedade-veículo Oitante.
A operação surpreendeu pela dimensão do dinheiro estatal envolvido, que no imediato foi de 2.255 milhões de euros, o que obrigou a um orçamento rectificativo. A este valor há ainda que somar a prestação de garantias de 746 milhões de euros e a perda dos cerca de 800 milhões de euros que o Estado tinha emprestado em 2012 e que não tinham sido devolvidos.
PSD devolve críticas
O PSD acusou Brilhante Dias de apresentar uma conferência de imprensa "essencialmente política" onde tentou "lavar a responsabilidade" do actual Governo no processo de resolução do banco.
"A leitura política que o deputado relator fez na conferência de imprensa peca por uma enorme tentativa de lavagem da responsabilidade do processo de resolução", advogou o deputado do PSD Carlos Abreu Amorim, em declarações à agência Lusa.
O relatório, reconhece Carlos Abreu Amorim, "parece ter uma preocupação de sustentar tecnicamente" várias questões, mas a conferência de imprensa de Eurico Brilhante Dias apresentou "defeitos" que o deputado do PSD diz temer serem "insanáveis".
"Há uma preocupação evidente do princípio ao fim da conferência de imprensa em lavar dois aspectos que me parecem fundamentais: que o anterior governo [PSD/CDS-PP] deixou um plano de reestruturação, uma linha de rumo, uma estratégia, e que Governo presentemente em funções abandonou esse plano, desconsiderou a estratégia em cima da mesa e fez a decisão de resolução que acabou por afectar gravemente os contribuintes portugueses", sublinhou Abreu Amorim.
O PSD vai nesta fase "estudar com muito cuidado o relatório" de mais de 400 páginas recebido e verá se há "salvação" para o mesmo ou se este é "pura e simplesmente um relatório político".