A solidão não começou com a pandemia, agravou-se com o novo coronavírus. É um problema mundial e os dados para Portugal surgem alinhados com os dos restantes países, indica um estudo da “The Reputation Platform”.
Em média, 6 em cada 10 pessoas sentem-se infelizes ao fazerem coisas sozinhas, um cenário que se agrava entre os jovens (16-25 anos), onde esse sentimento sobe para 7 em 10 pessoas.
Este inquérito sobre a solidão em Portugal e o impacto na saúde e nas empresas conclui ainda que um terço dos inquiridos diz sentir-se excluído por outras pessoas, manifesta “a perceção de que as relações podem ser meramente utilitárias”. Mais uma vez, na faixa 16-25 anos este sentimento sobe, para 41%.
As palavras mais usadas para descrever como a pandemia os deixou, são: ansiedade, incerteza e tristeza.
Confinados e muitas vezes isolados, as plataformas digitais ganharam espaço na vida dos portugueses. Metade dos entrevistados reconhece “sentir ansiedade por respostas a mensagens enviadas”, uma percentagem sobe para 60% entre os mais jovens e tende a aumentar.
Jovens sofrem mais
Abandonados, infelizes, inadequados e irrelevantes, são alguns dos sentimentos manifestados, sobretudo pelos jovens.
Metade dos inquiridos diz sentir que ninguém os entende; quatro em cada dez declara que não sente pertencer aos ambientes nos quais convive; um terço tem dificuldade em falar com outras pessoas à sua volta e em fazer amizades. “É o sentimento de viver a descompasso, fora do lugar, de estar sempre aquém das expectativas”, refere o estudo. Também aqui, a faixa dos mais jovens apresentou resultados ligeiramente piores.
“Empiricamente poderíamos ser levados a supor que a solidão é um problema especialmente sentido pelos mais idosos”, mas não é o caso. Este trabalho conclui que os que têm mais idade “até se afirmam como os mais conformados perante o isolamento, às vezes mais parecido com abandono, a que são sujeitos”.
O desafio das empresas
Segundo os autores do estudo, cabe também às empresas ajudar os funcionários na adaptação a este “novo normal”. “O desafio é criar e manter ambientes de trabalho saudáveis para pessoas que sabemos não se sentirem bem. São vítimas de uma enorme solidão”.
São apresentados dois casos emblemáticos: o Projeto Aristóteles, da Google School od Liders, que investigou o que determina o sucesso e a alta performance das equipas; e a recente implantação da Diretoria de Saúde Mental da AMBEV, uma cervejeira do Brasil.
- - Projeto Aristóteles: concluiu que a “segurança psicológica” é a característica mais importante na dinâmica de trabalho das equipas de alta performance, é uma “garantia de liberdade incentivada por líderes mais vulneráveis para que cada pessoa da equipa seja ela própria sem medo, capaz de assumir riscos e de discordar, permitindo que toda a inteligência e capacidade criativa existentes sejam plenamente usadas”. Como dizia Aristóteles, “o todo é maior do que o somatório das partes”.
- - Projeto da AMBEV: defende que é necessário olhar para o ser humano como um todo, dando espaço e conhecimento aos colaboradores das empresas para lidarem com a instabilidade emocional. “É preciso dar informação às pessoas para que percebam o que é passar por situações de solidão, ansiedade, depressão ou burnout. Saberem que lidar com isso é tão importante como tratar de uma gripe”.
Solidão – a nova doença do século?
Já há quem reconheça a solidão como uma nova pandemia. Além de atingir uma “significativa percentagem de pessoas”, tem efeitos directos na sociedade, “impacta a vida da comunidade e, especialmente, a produtividade das empresas”.
Os autores defendem que “as autoridades sanitárias terão de procurar dar resposta” a este problema. “Se a Depressão, tida por muitos como a doença do século, ou a Síndrome do Burnout já ganharam o estatuto de doenças reconhecidas pela OMS, a Solidão tem tudo para ser equiparada, pois muitas vezes a dor que causa não é menor.”
Há países que já identificaram a solidão como um problema e já estão a trabalhar em respostas coletivas. Inglaterra e Japão, por exemplo, já criaram Ministérios da Solidão, “para percebermos a real dimensão do problema, fruto de uma sociedade desenfreadamente competitiva e tecnológica, onde o foco está na superação do desempenho de cada um e de uma forma cada vez mais autónoma, mais solitária”.
A pandemia só destacou os sinais de alarme que já existiam, sobre a solidão e a depressão. Segundo este trabalho, estamos “a testemunhar a chegada de um outro tempo, no qual as empresas precisam de olhar para os seus colaboradores a partir de uma nova perspetiva. Onde a área de Recursos Humanos invista numa garantia de mais humanismo nas relações internas, permitindo mais espaço para o erro e mais segurança psicológica para a vulnerabilidade.”
Vingará nesta nova era “quem assuma como fundamental reconhecer e apoiar os seus colaboradores nas suas vulnerabilidades, porque nada substituirá nunca o ser humano na tarefa de melhorar os processos e as próprias empresas”, conclui o estudo.
Este estudo foi realizado pelo Rep.Circle – The Reputation Platform, um centro de conhecimento criado e promovido pela Lift Consulting. Foram inquiridas 2.273 pessoas, entre 03 e 05 de março de 202, em todo o país.