O juiz Neto de Moura vai deixar de julgar casos de violência doméstica, confirmou à Renascença fonte judicial esta quarta-feira.
Neto de Moura já tinha pedido para deixar de analisar este tipo de casos, em junho, o que foi recusado num primeiro momento. Agora, o pedido foi aceite pelo presidente do Tribunal da Relação do Porto (TRP), Nuno Ataíde das Neves, que justifica a decisão, em despacho, com a necessidade de "preservar a confiança dos cidadãos" na Justiça.
Assim, e no seguimento desta decisão, o juiz desembargador será transferido da secção criminal para a secção cível do mesmo tribunal.
Há três critérios que regem decisões desta natureza por parte dos presidentes dos tribunais da Relação, sendo estas a "conveniência de serviço", a "especialização" ou a "preferência do próprio", explica fonte do Conselho Superior da Magistratura, órgão de gestão e disciplina dos juízes, à Lusa.
No despacho, com data de hoje e ao qual a Lusa teve acesso, o presidente do TRP justifica a transferência de Neto de Moura com a “manifesta conveniência de serviço”, referindo que esta medida "obteve a concordância" do juiz desembargador.
“Considerando aqueles critérios, assume-se com especial relevância o da conveniência de serviço, em ordem à preservação da confiança dos cidadãos no sistema de justiça”, fundamenta Nuno Ataíde das Neves no documento.
O Bastonário da Ordem dos Advogados, que vêm defendendo o afastamento do juiz Neto de Moura do julgamento de casos de violência doméstica, diz à Renascença que a decisão do Presidente do Tribunal da Relação do Porto é "um primeiro passo que merece uma reflexão mais aprofundada".
Guilherme Figueiredo diz que o Presidente do Tribunal da Relação do Porto "está atento e compreende que não se pode manter esta tensão entre um decisor judicial e o sentimento de uma comunidade".
Joquim Neto de Moura, desembargador no Tribunal da Relação do Porto, foi castigado em fevereiro com uma advertência pelo Conselho Superior de Magistratura na sequência de uma polémica sentença de outubro de 2017, em que o juiz faz censura moral a uma mulher de Felgueiras, vítima de violência doméstica, minimizando este crime pelo facto de esta ter cometido adultério.
O magistrado invocou a Bíblia, o Código Penal de 1886 e, até, civilizações que punem o adultério com pena de morte, para justificar a violência cometida contra a mulher com uma moca de pregos.
Noutro caso noticiado recentemente, o juiz decidiu retirar a pulseira eletrónica a um homem condenado a pena suspensa por agressão violenta à mulher. Neto de Moura alegou que os juízes que condenaram o agressor não pediram autorização para lhe aplicar a medida. O agressor rebentou um tímpano à mulher ao soco. De acordo com o relato do advogado da vítima, a mulher “vive escondida, aterrorizada” e teve já de trocar de casa.
O juiz foi alvo de condenação pública por parte de personalidades de vários quadrantes e decidiu avançar com ações em tribunal contra deputados, humoristas, jornalistas e comentadores que “ultrapassaram” a linha vermelha das críticas sobre as polémicas decisões do magistrado em casos de violência doméstica.