“A palavra fascista é das poucas palavras do campo político que ainda não foi completamente normalizada. Nem o fascista gosta de ser chamado fascista!” reconhece Tiago Rodrigues. O encenador, e atual diretor do Teatro Nacional D.Maria II (TNDMII) ousou usar a palavra no titulo da peça de teatro que esta quarta e quinta-feira leva à cena, às 19 horas, ao palco do Centro Cultural de Belém (CCB).
“Catarina e a Beleza de Matar Fascistas” já esteve programada para a temporada anterior do Nacional, mas a pandemia obrigou a mudanças no calendário. Depois de ter estreado em Guimarães, a peça fez uma curta carreira internacional e é agora apresentada no CCB antes de chegar, no próximo ano, ao palco do TNDMII.
O elenco, reconhece Tiago Rodrigues em entrevista ao programa Ensaio Geral da Renascença, é de luxo. Em palco vão estar António Fonseca, Beatriz Maia, Isabel Abreu, Marco Mendonça, Pedro Gil, Romeu Costa, Rui M. Silva e Sara Barros Leitão, vestidos por figurinos de José António Tenente.
A história desta peça sofreu alterações com o decorrer do tempo, reconhece o seu autor, depois dos ensaios terem sido apanhados pela travagem a fundo devido à pandemia. A peça começou por ser pensada sobre os “resíduos de mentalidade fascista que ainda existem na sociedade portuguesa, uma espécie de ecos de 48 anos de ditadura”. No entanto, a pausa forçada mudou o angulo de abordagem.
“É um espetáculo que fala da ameaça da ascensão de um populismo de extrema-direita, radical, de inspiração fascista e o impacto que isso pode ter para as democracias, neste caso para a democracia portuguesa”, conta Tiago Rodrigues.
O criador da peça explica que a história é contada a partir da perspetiva de uma família ficcional que vive no sul de Portugal, que é uma família “invulgar e absurda que tomou o caminho da violência para defender a democracia”.
Tiago Rodrigues pretende com a peça de teatro levantar várias questões: “Há alguma legitimidade na violência como arma política? Ou nunca é uma escolha aceitável? Se é, em que casos? E onde ficam os princípios democráticos quando isso acontece?”
Nesta entrevista à Renascença, o encenador que já criou espetáculos sucesso de bilheteira como Sopro ou By Heart, explica em sua defesa e defesa do elenco que são todos “pacifistas” que não defendem a violência, o “território delicado” por onde navega a história de “Catarina e a Beleza de Matar Fascistas”.
Assumidamente a peça tem um tom “provocatório”, admite Tiago Rodrigues, que considera também este texto um “grito de alerta” no atual contexto político europeu. “Embora compreenda os argumentos de quem, mesmo a propósito desta peça, diz que não se pode usar assim de forma leviana a palavra fascista para falar da extrema-direita, ou da direita radical, porque o fascismo é um movimento histórico e academicamente não é rigoroso usar o termo, eu reivindico o direito de cidadão, político e emocional de usar a palavra fascista num país como Portugal. Continua a dizer-se que nunca houve fascismo, mas é um país, que só tem uma democracia graças a quem resistiu ao fascismo”, afirma Tiago Rodrigues.
O diretor do Nacional que deverá levar a peça ao D. Maria em abril é contundente em dizer: “Recuso a possibilidade de obliterar a palavra fascista do meu dicionário. Uso e proponho a palavra fascista com a consciência de que não sendo a palavra perfeita, pode ser a palavra eficaz para recusarmos a normalização de ideias que têm pelo menos um perfume de fascismo”.