Qual é coisa qual é ela, que ainda não chegou, mas os delegados de saúde pública já sabem que vem? Não é uma adivinha, mas podia ser e a resposta seria: uma pandemia.
José Rola, delegado de saúde pública de Gaia, diz que este tema sempre foi muito presente entre os colegas.
“Falo de pandemias quase desde o início da minha carreira, era uma das áreas sobre a qual que gostava de ler, gostava de fazer formação. Todos nós sabíamos que, mais tarde ou mais cedo, teríamos uma experiência destas, não esperava ser eu a tê-la. E posso dizer-lhe que vista por dentro, ela é muito diferente do que a teoria que eu passava o tempo a construir e a explicar”, explica.
Questionado sobre em que é que é diferente, José Rola assegura que “a maior parte da teoria não se aplica na prática, tão simples como isso”, diz com uma gargalhada.
José Rola diz que quando começaram “a preparar a fase de contenção já tínhamos a ideia que não iríamos conseguir contê-la e por isso começámos a preparar ao mesmo tempo também a fase de mitigação, ou seja, quando começasse a haver casos, como é que iríamos fazer”.
Mas, reconhece, “tudo isto foi feito um bocadinho à pressa, nós não estávamos preparados”, até porque aconteceu tudo muito rápido.
“É um choque passarmos de um estado de normalidade a um estado de emergência em muito pouco tempo, pouco menos de um mês”, conta.
José Rola diz que encontraram dificuldades, por exemplo, em isolar pessoas que nem português entendiam. Também os jovens, assim como pessoas de algumas nacionalidades ou etnias, pareciam não prestar atenção às regras; e também houve os imigrantes ilegais que, se ficassem em isolamento, deixavam de comer.
“É muito difícil arranjar soluções para estas pessoas, porque elas legalmente não existem no nosso país. Nós lançámos mão dos nossos parceiros locais, desde logo a Câmara Municipal e as estruturas de apoio da Segurança Social, etc., para conseguirmos levar alimentos, por exemplo, a estas pessoas de maneira a elas poderem ficar isoladas”, explica.
A pandemia trouxe também uma visibilidade aos delegados de saúde pública que até agora não tinham e muitas pessoas não entenderam como é que decisões podiam ser diferentes, quando as regras são as mesmas.
José Rola explica que os delegados de saúde gozam de alguma autonomia, até porque as regras nem sempre são “preto no branco”.
“Nós tentamos interpretá-las o melhor possível para a nossa realidade e talvez ai se note, porque as interpretações às vezes são diferentes”, explica, dando como exemplo que “realizar um casamento em Vila Nova de Gaia com 200 pessoas poderá não ser a mesma coisa que fazer esse casamento numa região rural e como nas orientações não está descrito como é que as coisas se podem fazer em duas situações diferentes, provavelmente a decisão dessas duas situações poderá ser diferente”.
José Rola reconhece que se está à beira da fadiga pandémica, nesta luta que já leva quase dois anos e em que também os delegados de saúde deixaram para trás toda a atividade não-Covid.
Respostas Sociais à Pandemia é uma rubrica da Renascença com apoio da Câmara Municipal de Gaia que surge no seguimento da Conferência "Pandemia: Respostas à Crise" onde se debateu em maio de 2021 o papel das Instituições Sociais e do Poder Local.