Natural de Resende, o padre João António Pinheiro cresceu a ouvir falar da devoção a Nossa Senhora dos Remédios. “A minha mãe, Teresa, já era muito devota, e veio aqui como peregrina, de joelhos”, relembra, comovido.
Os pais casaram no Santuário de Nossa Senhora dos Remédios, em Lamego, em 1963, onde hoje ainda se continuam a celebrar uniões matrimoniais. “Os batismos e os casamentos são funções paroquiais, mas as pessoas gostam muito de fazer aqui o casamento”, observa o reitor do Santuário, que desempenha essas funções há mais de dez anos.
Por ali, escutam-se todos os idiomas, vêm peregrinos de todo o mundo, mas principalmente brasileiros. “É mesmo um país irmão”, nota o padre João António Pinheiro, ao mesmo tempo que circula pelo parque florestal circundante, construído em 1897, com algumas espécies que se mantêm vivas desde essa data.
O edifício do Santuário fica na paróquia da Sé, no coração de Lamego, e prepara-se para assinalar 261 anos de existência.
“Vai haver um momento litúrgico, recreativo e cultural. O terço às 17h50, a eucaristia às 18h30 e, no final, vamos convidar as pessoas a visitar as torres, porque foram remodeladas, a ver o passadiço que liga as torres e depois partilhamos os farnéis”, explica o reitor sobre as comemorações previstas.
Mais tarde, pelas 21h00, haverá um concerto pelo padre Marques Alvim, “um sacerdote da diocese que se dedica à música, e também pela Banda Filarmónica de Magueija”.
Nossa Senhora do Leite
O Santuário não tem só uma imagem de Nossa Senhora dos Remédios e cada uma conta uma história.
“Esta Nossa Senhora do Leite que foi trazida por um bispo do século XVI, D. Manuel de Noronha, mas que aqui sempre foi chamada Nossa Senhora dos Remédios. Onde vir uma Nossa Senhora dos Remédios a dar o peito ao menino, é porque tem origem aqui”, aponta o reitor do Santuário, admitindo que os efeitos da pandemia passaram longe daquele local de culto.
“Continua a existir muita procura por este espaço, muitas pessoas, com as suas histórias de dor, depositam os seus desabafos, às vezes só à procura de um abraço e eu dou”, garante o padre João António Pinheiro.
“Com a pandemia, instalámos colunas cá fora e muitos têm-nos agradecido, assim nunca falta espaço, e todos podem escutar”, valoriza.
O padre João partilha um testemunho autorizado de quem vivenciou a fé a Nossa Senhora dos Remédios. “São muitos os milagres concretizados. Em julho do ano passado, uma jovem enfermeira de 23 anos, com um tumor na massa óssea, na coluna, deixou de andar, num estado muito difícil, desfigurada, pediu apoio espiritual, essa jovem começou uma recuperação espantosa depois da cirurgia. Ela própria diz: ‘a mão de Deus cura lugares que a medicina não consegue alcançar’”, relata o reitor do Santuário.
Inauguração de madrugada
Foi no dia 22 de julho, às 5h00 da manhã, do ano de 1761, que foi inaugurado o Santuário de Nossa Senhora dos Remédios.
A ideia da construção surgiu em 1750. Partiu de uma irmandade presidida pelo cónego José Pinto Teixeira, sepultado no Santuário.
“Em fevereiro de 1750, o lançamento da primeira pedra também aconteceu de madrugada. Era assim naquele tempo. A planta desapareceu num incêndio, muitos dizem que a obra é de Nicolau Nasoni, mas a estadia de Nasoni, quando pintou o teto da Sé, não coincide com a construção do Santuário, provavelmente, é de um discípulo de Nasoni. A fonte que existe no exterior, sim, é de Nasoni, de 1737”, explica o reitor.
O padre João António Pinheiro clarifica ainda a origem de Nossa Senhora dos Remédios. “A origem é de Marselha, a imagem mais antiga está em Marselha, havia cristãos que eram raptados e exigiam somas avultadas para o resgate e então o fundador da Ordem da Santíssima Trindade invocou Nossa Senhora para que fosse o remédio para aquela aflição. O culto existe mais no sul da Europa e nos países colonizados por Portugal”, declara.
Festa ainda mais antiga que santuário
Todos os dias o Santuário abre as suas portas, das 7h30 até às 19h00, e, ao domingo, a missa, às 10h00, é muito participada.
São poucos os fins de semana em que não é celebrado um casamento no Santuário de Nossa Senhora dos Remédios, em Lamego. Por ano chegam a ser mais de 200 celebrações.
Uma vivacidade sentida pelo reitor do santuário, que recua novamente no tempo para falar da história daquele espaço. “A festa já havia antes do Santuário, porque havia uma capela dedicada a Santo Estevão. Desde 1711, no livro Portugal Mariano, de frei Agostinho de Santa Maria, já se faz alusão à Festa da Senhora dos Remédios. A 27 de abril de 1925 veio a autorização expressa para Lamego, para que os bois pudessem continuar a levar as imagens dos santos e sobretudo de Nossa Senhora dos Remédios”, conta à Renascença.
A primeira capela de Santo Estevão tornou-se “tão pequena para o número de peregrinos” que surgiu o santuário, justifica o reitor.
“Todas estas pedras têm uma história muito grande, de muito suor, muitas lágrimas, de muito amor a Nossa Senhora, muito desprendimento, foi um trabalho oferecido pelos profissionais da construção civil daquele tempo, tudo foi oferecido, só lhes dava alimento, o santuário”, relembra o padre João António Pinheiro, concluindo que “a Senhora dos Remédios é um epónimo de Lamego, dizer Lamego é dizer Senhora dos Remédios”.
Quantos degraus tem o Santuário?
Aos 57 anos, e há mais de dez como reitor do Santuário de Nossa Senhora dos Remédios, o sacerdote João António Pinheiro garante que, por ano, são mais de 100 mil pessoas a visitarem aquele local.
Um grupo de jovens mulheres peregrinas de Felgueiras desloca-se, há uma década, ao Santuário de Nossa Senhora dos Remédios.
Serafina Antónia, 35 anos, afirma que: “só pede sempre saúde, acima de tudo”. Iria do Carmo, 48 anos, concorda que “só interessa a saúde e depois vem o resto”, mas acrescenta outro motivo para as deslocações ao Santuário. “O que me atrai são estas escadas. Não sei quantas escadas tem”, sublinha, em jeito de admiração. Maria Esmeralda, 50 anos, também só pede saúde, “principalmente, para mim e para os meus”.
São muitas as selfies tiradas frente à construção imponente, uma escadaria com degraus que o reitor contou. “Fala-se em 686, mas é errado, no total são 925 escadas, como qualquer peregrino pode ver só subimos pelos degraus ao centro, que são 307, e depois subimos pelos degraus que estão à esquerda ou à direita, que são 309. A subir ou a descer no total são 925, contei-os muitas vezes, são 925 degraus”, esclarece.
Outra curiosidade do Santuário de Nossa Senhora dos Remédios é a presença de um castanheiro coberto de heras, com 750 anos, que dá sombra aos farnéis trazidos pelos peregrinos e às vendedoras dos rebuçados da Régua. Margarida Mesquita, de 56 anos, dá a receita: “sou eu que faço estes rebuçados, em casa, com açúcar, mel e laranja”, vendidos a 1 euro num saquinho branco.