A construção do novo aeroporto de Lisboa foi esta sexta-feira um dos temas de discussão no painel sobre os Desafios para o Turismo, no Congresso da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT), que decorre em Ponta Delgada.
O presidente da ANA, Thierry Ligonnière, garante que a empresa concessionária fará o que o Governo decidir, mas deixou o alerta para a necessidade de análise de todos os fatores condicionantes à obtenção de uma declaração de impacto ambiental.
Um painel em que também ficou claro que é preciso apostar na qualidade de serviço, valorizando os profissionais do setor e reduzindo a carga fiscal sobre o trabalho. Mas é igualmente necessário apostar em novos produtos de qualidade e diferenciadores para atrair turistas de mercados longínquos, que com elevado poder de compra, que fiquem mais tempo para conhecer melhor o território e não apenas as grandes cidades.
Solução viável para o novo aeroporto em risco
A decisão sobre a construção do novo aeroporto em Lisboa tem vindo a ser sucessivamente adiada. Quinta-feira, na abertura do Congresso da APAVT, o presidente Pedro Costa Ferreira deixou claro que não acredita numa decisão governamental em 2023. E apelou por isso a que os políticos (governo e especialmente, Ministério das Infraestruturas e das Finanças) deixem avançar as obras que o atual aeroporto precisa para se tornar mais eficiente.
Esta manhã, durante o painel “Grandes desafios do turismo português: o que vamos fazer”, o CEO da ANA/Vinci deixou o alerta: “o novo aeroporto depende de uma solução e há o risco de não haver uma solução viável. “
“É preciso que haja uma resposta objetiva, realista e pragmática a todas as perguntas que condicionam a exequibilidade do projeto para não se acabar numa escolha que afinal não tem capacidade de conseguir a declaração de impacto ambiental ou não é exequível em termos económicos porque é demasiado cara”.
Anteriormente, a ANA defendeu a solução Montijo, mas agora, Thierry Ligonnière diz que não quer ser sujeito a mais críticas e garante, simplesmente, que “a ANA fará o que o Governo quiser. Somos concessionários do serviço aeroportuário; o Governo decide e nós acompanhamos. É preciso que o trabalho seja feito rapidamente, mas também é preciso avaliarmos para não se chegar a uma solução que não é viável”.
Obras no Humberto Delgado à espera de processo administrativo
Enquanto não há novo aeroporto (depois da decisão são precisos vários anos para a construção e entrada em funcionamento), a ANA tem um projeto para a realização de obras que aumentam a capacidade da atual estrutura aeroportuária e a sua eficiência. Um investimento de quase 300 milhões de euros, que implica, nomeadamente, a construção de uma nova placa de estacionamento e mais dez portas de embarque. “Acreditamos que assim vamos conseguir eficiência operacional adicional”, diz Thierry Ligonière.
No entanto, este projeto espera ainda pelas autorizações administrativas, que também dependem das tutelas, para avançar para a fase de obra.
Um acelerar necessário, na opinião dos diversos operadores de turismo, nomeadamente, as agências de viagens, que frisam constantemente a saturação do Aeroporto de Lisboa e o impacto que ela significa no crescimento do setor e na imagem do país para quem visita Portugal.
Ainda assim, o presidente da ANA considera que face ao crescimento significativo a que se assistiu desde 2014, o Aeroporto Humberto Delgado é um dos mais eficientes da Europa.
Aeroporto de Lisboa ainda tem capacidade de crescimento
Sem negar a necessidade de um novo aeroporto para a capital ou das obras na atual infraestrutura, Filipe Silva, administrador do Turismo de Portugal, considera que este aeroporto ainda pode receber mais passageiros.
“Se olharmos para o nível do load fator (percentagem de lugares disponíveis no avião que são preenchidos pelos passageiros) – e a ANA conhece-o melhor que ninguém – vemos que ainda não atingiu os 100%, ainda existe capacidade para preencher nas operações”.
O responsável do Turismo de Portugal considera que se ainda existe diferencial para os 100%, é preciso trabalhá-lo. E deixou a ideia de que, por exemplo nas operações internacionais, é preciso perceber qual a percentagem de turistas que ficam em Lisboa e a dos que vão para destino final. E a partir desses dados, pensar como reter os que estão de passagem durante mais alguns dias em Portugal. Com algum programa tipo Stopover.
Turismo de Portugal quer dar a conhecer todo o território
Essa retenção dos turistas que estão de passagem é mais uma boa forma de promover a coesão e dar a conhecer o território (e não apenas os grandes centros urbanos de Lisboa e Porto), reduzir a sazonalidade e acrescentar valor, com a permanência de mais dias no país e a obtenção de receitas acrescidas para a economia, refere Filipe Silva, lembrando os objetivos da Estratégia para o Turismo 2027.
A aposta passa pelo desenvolvimento de novos produtos turísticos, com qualidade. Segundo o administrador do Turismo de Portugal, neste momento há cerca de 50 projetos que abrangem todo o território, em diferentes fases de desenvolvimento. Mais de uma dezena já estão implementados, em fase de promoção e comercialização. As Aldeias Históricas, Aldeias de Xisto, Peneda Gerês, Geopark NaturTejo, Rota da Terra Fria, Rota Vicentina , Lugares da Serra Alentejana ou Heranças do Alentejo são alguns exemplos.
Questionado sobre a pressão turística a que as cidades de Lisboa e Porto estarão sujeitas, Filipe Silva afirmou não ter dados concretos. Por outro lado, frisou que a aposta nestes projetos não visa tirar turistas às grandes cidades, mas sim, distribuí-los por todo o país.
Diversificação dos mercados emissores é regra base
Para o responsável do Turismo de Portugal, é muito importante diversificar os mercados emissores de turistas, não ficando dependente apenas dos mercados tradicionais.
Filipe Silva referiu que, atualmente, há cerca de 25 mercados que são o foco da promoção do Turismo de Portugal. Para além dos europeus, também os mercados dos Estados Unidos, Canadá e Brasil. Na Ásia, apesar da China ainda estar muito fechada, é um dos mercados a investir. Outros, já significativos para Portugal são os da Coreia do Sul, Japão e mais recentemente, da Austrália.
“São mercados que também viajam em contra-ciclo e ajudam a combater a sazonalidade, têm um gasto médio muito interessante e os turistas revelam interesse pelo património natural e cultural. Representam 15-20% do total, mas estão com um crescimento muito significativo”.
Fiscalidade no trabalho tem de ser levada a sério
Outra questão abordada no painel sobre os Desafios para o futuro do turismo português foi a da falta de mão de obra.
Para Margarida Almeida, CEO da Amazing Evolution, o crescimento do turismo terá de se fazer com aumento de preços, mas isso exige maior qualidade de serviço.
“O preço alto é um caminho, não estou a ver outro. Para também pagarmos melhor aos profissionais do setor, que tanto contribuem para o retorno do investimento. Mas para isso é preciso que sejam qualificados e sei que é muito difícil contratar pessoas com qualidade, apesar de também nós investirmos muito na formação.”
Além disso, é preciso que as pessoas se sintam satisfeitas com o seu trabalho e com o que ganham. “Todos os meses tenho a sensação que pago dois vencimentos a cada pessoa: um, ao dia 20, para o Estado (em impostos e Segurança Social) e outro, no fim do mês, ao trabalhador. Mas ele não o sente”.
Por isso, Margarida Pereira considera que “o tema fiscal ( no trabalho) tem que ser levado a sério”. Refere situações em que os profissionais qualificados, em cuja formação o Estado português investiu, decidem não ficar no país.
“Por vezes têm ordenados brutos pouco mais altos do que os que pagamos, mas no fim do mês têm muito mais dinheiro na carteira porque os impostos que pagam noutros países são mais baixos ”.
É nesse sentido que se diz satisfeita com o facto do novo secretário de Estado do Turismo, Nuno Fazenda, ter referido ontem a necessidade de adotar medidas, nomeadamente a nível fiscal, que levem as empresas a optar por uma contratação estável.
O Congresso da APAVT decorre até amanhã em Ponta Delgada, nos Açores.