A viver em Portugal há 20 anos e depois de ter criado, em 2011, uma associação de apoio a imigrantes, Cecília Minascurta nunca pensou que a instituição Mundo Feliz iria ser capaz de pôr comida na mesa a mais de mil famílias.
Os imigrantes vindos de Angola, Senegal, Cabo Verde, Brasil e de muitos outros países já fazem parte desta grande família, mas diz a presidente da associação que, “desde o início da pandemia, muitos portugueses estão a engrossar as filas que duas vezes por semana chegam a dar a volta ao quarteirão, e ninguém é mandado embora”.
Numa altura em que muitas pessoas estão fechadas em casa e muitos estabelecimentos estão encerrados, esta pequena loja está sempre de portas abertas para quem ali chega a pedir ajuda. Duas vezes por semana, dias de distribuição de cabazes de comida, a fila de pessoas impressiona quem por ali passa.
Cecília Minascurta é a fundadora da Associação de imigrantes Mundo Feliz e chegou da Roménia há 20 anos com o sonho de ajudar outros que como ela mudam de país à procura de uma vida melhor.
Segundo esta responsável, “o apoio a imigrantes já dura desde 2011 e com a ajuda de alguns voluntários e dos 12 mil associados, os imigrantes encontram naquele espaço alguém que nunca vira as costas, que ajuda não só com alimentos, mas também, a tratar de papéis, a dar formação, no fundo a fazer tudo o que é preciso”.
Mas se até aqui “o apoio era praticamente centrado na resolução de problemas burocráticos, agora, o foco é em conseguir comida. Porque desde o início da pandemia as necessidades são quatro vezes mais”.
"São muitos os portugueses que ali vão pedir comida"
Um apoio que não deixa ninguém indiferente pelas filas de pessoas que se criam na rua Dr. Manuel de Arriaga, onde está sediada a associação. Mas se noutros tempos o apoio era só apoiava imigrantes, agora, segundo Cecília Minascurta, “são muitos os portugueses que ali vão pedir comida e ajuda para tratar de assuntos através da internet”.
“Neste momento, apoiamos na zona mais de 700 famílias, fora as que são de outro concelho, por isso, podemos dizer que neste momento apoiamos mais de mil famílias”, acrescenta.
“Muitos são moradores que começaram a ver os cabazes e juntaram-se à fila e nós não mandamos ninguém embora, isto para além de irmos levar comida a casa dos idosos que já não conseguem sair.”
Os recheio dos cabazes alimentares varia, mas quem ali bate à porta nunca sai de mãos vazias. É o que diz Lourença Mendes, uma mulher, natural de Cabo Verde. “Nunca precisou da ajuda de ninguém...nem da associação de imigrantes, apesar de conhecer o seu trabalho há muito tempo”, conta.
Uma orgulhosa independência que foi levada pela pandemia. Agora, “a falta de comida em casa, quando o trabalho começou a ser cada vez menos, não trouxe outra alternativa”. Com a filha e os netos em casa “é preciso fazer tudo para não faltar nada aos meninos”, lamenta.
Sandra Mendes é a senhora que se segue na fila para os cabazes. Para esta mulher, vinda do Brasil, “para fugir à miséria, a pandemia roubou mais uma vez a esperança de uma vida melhor”.
Sem trabalho, aguarda pela comida que que “não pode faltar aos filhos”.
Um apelo numa altura difícil para tantos
É pela Sandra, pela Lourença e por tantos outros que Cecília não desiste de lutar.
“Pôr comida na mesa todos os dias a quase mil famílias é uma tarefa muito difícil. E seria impossível sem os donativos do Banco Alimentar Contra a Fome, da Câmara de Oeiras e do Pingo Doce, para além das quotas dos associados, cerca de 13 mil “, descreve.
Apesar de grata por todo o apoio, a presidente da associação quis deixar um apelo nesta altura tão difícil. “Estamos aqui todos os dias de portas abertas e qualquer pessoa pode vir entregar comida, roupas ou o que puderem, porque temos crianças pequenas e muitas mulheres grávidas a passar por muitas necessidades”.