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A ideia parte de Rogério Fernandes Ferreira, antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de António Guterres, advogado e atual presidente da Associação Fiscal Portuguesa (AFP). O novo imposto seria uma “Covid shot tax de salvação europeia”, com o objetivo de garantir dinheiro para o combate ao vírus e à reconstrução da economia, sem aumentar a dívida, nem prejudicar a capacidade de endividamento e de refinanciamento dos países mais afetados. Simultaneamente, "aumentar a liquidez na economia e não prejudicar as empresas".
Tratar-se-ia de um "imposto transversal a todos os residentes na União Europeia (UE), cobrado pelos bancos e pelas autoridades fiscais nacionais, a incluir no orçamento da União, para a Europa poder fazer frente, no imediato, ao impacto sanitário e económico da Covid-19", defende, numa entrevista à Renascença, o docente universitário e advogado especializado na vertente dos negócios e dos impostos.
"Resolver a atual crise, acrescentando mais dívida a países que já estão endividados não pode ser solução única, nem é a mais adequada", diz. Para países como Portugal, "o endividamento,a moratória, o adiamento e mais crédito também não são medidas suficientes", pelo que propõe, em alternativa ou como complemento, um novo imposto “único e irrepetível, exclusivamente consignado à reconstrução europeia”.
Rogério Fernandes Ferreira faz notar que esta solução, com um cunho inédito e solidário pela sua abrangência europeia, “tem antecedentes nacionais noutros casos de ‘guerra’, por exemplo, na Inglaterra, em França, ou na Suíça, onde foram criados impostos em momentos históricos particularmente calamitosos e de reconstrução”. A União Europeia, diz, "terá de encontrar uma forma de fazer face à despesa que agora está a surgir; vai ter de enfrentar a necessidade de financiar o combate à pandemia e o relançamento económico e esta pode ser uma das formas alternativas para discutir, ainda em abril, na cimeira europeia de chefes de Estado e de Governo”.
Taxar os residentes na União Europeia. Poupar as empresas
Pode a ideia de taxar os particulares recolher apoios, quando cada um de nós está a sentir os efeitos da crise? Confrontado com esta questão, o antigo secretário de Estado e atual presidente da AFP lembra as palavras de Ramalho Eanes, quando o ex-presidente português disse que todos "temos que dar o exemplo e que ser solidários", ou as do presidente francês Emmanuel Macron que, numa entrevista recente ao Financial Times, declarou ser “necessário pensar o impensável" em face do atual “evento existencial” na Europa e no mundo.
As empresas têm de ser “apoiadas a fundo perdido, precisam de apoios diretos não reembolsáveis, pelo que não vejo outra via que não seja a do imposto", nem alternativa direta e imediata de incidência "que não sejam as poupanças, que servem para situações de emergência e de investimento como esta", faz notar Rogério Fernandes Ferreira, antes de concretizar a sua ideia para este imposto de emergência.
"Seria um imposto europeu, com o orçamento europeu como destino, pago por todos os residentes na Europa, sejam ou não nacionais dos estados-membros". Um "shot tax" capaz de gerar a "liquidez imediata" que o advogado encontra nos “ativos financeiros líquidos, como depósitos bancários, certificados de aforro ou títulos de dívida pública". Mas não deveria incidir sobre títulos de capital e outros títulos de dívida privada, como ações, obrigações ou suprimentos porque, defende, “as empresas têm de ser é salvaguardadas e precisam sim de ser apoiadas".
Rogério Fernandes Ferreira advoga ainda que, para “criar alguma justiça relativa, porque há pessoas que têm outro tipo de património e há a necessidade de a taxa ser proporcional e tão baixa quanto possível", o imposto deveria poder incidir também sobre “outros ativos não financeiros, não imóveis". Isto, na sua forma de ver, na aplicação concreta em Portugal, corresponderia, “aliás, a uma solução mitigadora das assimetrias aqui criadas entre setor público e privado”.
Sem tempo a perder, a bem das próximas gerações
Cada dia que passa significa mais e mais dívida pública, pelo que, defende o presidente da AFP, seria de todo o interesse avançar, quanto antes, com este imposto que, aplicado de forma transversal em toda a UE, "iria implicar que os países mais ricos pagassem, proporcionalmente, mais". Por oposição, "os países mais endividados sairiam beneficiados, tal como os mais afetados, porque manteriam mais capacidade de endividamento".
Poderia ser um imposto com "uma taxa baixa, por exemplo, de 2%" sobre o património, que poderia tomar por referência, por exemplo, o "dia da pandemia, 13 de março", a liquidar em duas ou três prestações - maio, agosto, dezembro – a reter e a cobrar por intermediários financeiros e autoridades tributárias, para que a verba pudesse entrar já no orçamento europeu", disponibilizando os meios financeiros para gastar, "ao nível europeu", já neste ano de 2020 e no próximo, com o intuito de apoiar e relançar as empresas e a economia.
Não se pode é reconstruir Portugal e a Europa “só com endividamento, com este empurra para a frente", sublinha Rogério Fernandes Ferreira, antes de concluir que "já estamos a deixar aos nossos filhos e netos dívida suficiente, deixar mais… é demais!".