Na primeira Missa Crismal de 5ª Feira Santa a que presidiu como Patriarca de Lisboa, D. Rui Valério começou por agradecer aos sacerdotes pelo são e pelo que fazem. Lembrando que é “na força incondicional da partilha e da solidariedade que reside um dos pilares da esperança”, pediu que sejam próximos e atentos.
“A partilha da situação de cada pessoa, na realidade da sua existência, é sem dúvida, o modo mais pertinente de derramar o bálsamo da esperança para curar as feridas da desilusão, do desespero, do cansaço e do desalento que atingem hoje muitas pessoas. Que o presbitério de Lisboa, atuante na fidelidade ao genuíno sacerdócio de Cristo, seja lugar existencial de esperança”, disse o Patriarca, pedindo de seguida que “ninguém fique indiferente ao atual estado de elevada fragilidade do nosso país”.
“Poder-se-á considerar que é meramente conjuntural, mas, para a vida real, é sinónimo de mais pobreza e maiores dificuldades. Por isso, partilhai a pobreza dos pobres, comungai do sofrimento das vítimas de todas as formas de abusos, partilhai a solidão dos que estão sós – e acendereis neles a luz da esperança numa vida nova”, afirmou.
D. Rui Valério – que continua responsável pela diocese das Forças Armadas, que está ainda sem bispo -, lembrou também as várias guerra que assolam o mundo e a situação dos refugiados. “Neste momento, gostaria de descer ao concreto: ao drama da guerra, em muitas partes do mundo, e que, há mais de dois anos, assola a Ucrânia, barbaramente agredida pela Rússia, a que se juntou a má-nova da Guerra na Terra Santa. Não podemos, tão pouco, ignorar o sofrimento e o desamparo de tantas pessoas que, na sua condição de refugiados e migrantes, são vítimas de exploração e discriminações várias, mesmo entre nós”.
E voltou a referir-se às dificuldades económicas que atingem tantos. “Os recentes índices sociológicos revelam que a pobreza real não cessa de aumentar, estando já a atingir não só as classes mais desfavorecidas, mas também a classe média… é uma profunda amargura, que turva o horizonte do mundo”, sublinhou.
Na Missa Crismal de 5ª Feira Santa foram abençoados os óleos que ao longo do ano são utilizados na bênção aos doentes e catecúmenos, e foi consagrado o óleo do Crisma – o que neste caso só pode ser feito pelo bispo diocesano.
Nesta celebração todos os padres da diocese renovaram os seus votos sacerdotais. À semelhança do que faz sempre o Papa Francisco, também D. Rui Valério pediu aos cristãos da diocese que rezem por si e pelo seu ministério episcopal.
No final da Missa o Patriarca anunciou a nomeação de sete novos cónegos para o Cabido da Sé, e entregou a cada sacerdote um livro sobre a oração. Entre os novos cónegos está o padre Vitor Gonçalves, pároco de São Domingos e Santa Rufina, e assistente religioso da Renascença.
São atualmente mais de 500 os padres que vivem e servem no Patriarcado de Lisboa: 284 são diocesanos, os restantes religiosos, ligados a várias congregações. Uma larga maioria participou nesta celebração na Sé Catedral.
A Missa Crismal antecede o Tríduo Pascal, que se inicia com a Missa vespertina da Ceia do Senhor, na tarde desta quinta-feira, evocando a instituição da Eucaristia e do sacerdócio, com o momento do lava-pés, que simboliza o amor e o serviço aos outros.
Polarização política preocupa Patriarca
A polarização política resulta do medo e impede que se pense o futuro, diz o Patriarca de Lisboa. À saída da Missa Crismal, onde pediu para que “ninguém fique indiferente ao atual estado de elevada fragilidade” do país, à saída D. Rui Valério admitiu à agência Ecclesia que está preocupado.
"Nunca é bom sinal, porque a polarização é um fenómeno que surge quando um povo ou uma pessoa se sentem com medo e com algum sentido de fraqueza e fragilidade, quando um país está nessa situação não tem qualquer estímulo para pensar o amanhã, o futuro, está de tal maneira absorvido e envolvido com a sobrevivência do presente, que conduz a isso”, afirmou.
Na leitura do Patriarca, as guerras, o fim da pandemia e o fenómeno migratório, são algumas das causas prováveis dessa polarização. "Julgo que é ainda resultado dos anos de pandemia, é resultado sobretudo do atual contexto internacional com estas duas guerras, e é resultado também do fenómeno que está a ter um impacto muito forte aqui em Portugal, que é o impacto da migração, nem sempre devidamente acautelada e estruturada pelas instâncias a nível europeu e até mundial. Tudo isso para nos pode ser motivo de alguma contenção e abrandamento nos passos que queremos dar”.
Sobre as dificuldades na recente eleição do presidente do parlamento, desdramatiza. D. Rui Valério lembra que viveu em Itália, onde as confusões eram habituais, mas reconhece que se os problemas persistirem, isso será mau para o país.
“Acontecimentos com alguma emotividade, até extravagância, que possam acontecer, em Itália nos anos 80, quando eu lá estava, não vou dizer que era o pão nosso de cada dia, mas aconteciam. É a força da democracia, não retiro dali qualquer ilação negativa. Mas já tirarei, aí sim, se em termos futuros, daqui para a frente, de cada vez que haja grande decisões, nós tivermos de participar neste dinamismo com esta oscilação assim tão grande”, sublinhou.