No início, foram as sirenes. Depois, foram os mísseis a rasgar os céus de Kiev, os tanques nas ruas da cidade, as explosões constantes.
Naquela madrugada de 24 de fevereiro de 2022, Yulia conta à Renascença que viveu o medo que nunca pensou um dia ter de enfrentar.
Foi há dois anos. E, por mais que passem, tudo isto continuará a ser lembrado como se tivesse acabado de acontecer.
“É impossível estar-se preparado para isto. Nunca poderia imaginar que uma guerra real de larga escala pudesse acontecer no século XXI”, desabafa esta ucraniana que, até ao verão de 2022, resistiu em Kiev.
Depois, a realidade impôs-se e, com ela, o perigo de viver debaixo de bombardeamentos constantes.
“Viemos sem conhecer ninguém”, conta Yulia que, juntamente com o marido, deixou Kiev lá atrás e encontrou no Porto o refúgio o mais longe possível de um conflito que nunca compreenderam.
Em troca da paz, este casal de ucranianos partiu ao desconhecido, sem família e sem amigos no país de acolhimento. E com um filho, na altura, com dois anos de idade.
“Quando viemos para Portugal, ele não teve tempo para entender tudo. Mas ouviu todas as sirenes aéreas, as explosões. Ficava sempre muito assustado. A mudança para o novo ambiente seguro e calmo em Portugal ajudou-nos. Mas ainda hoje ele pergunta se ainda há tanques na Ucrânia e se ainda disparam”, conta
Para trás, ficaram familiares, amigos, uma vida inteira. Yulia é nutricionista, o marido é arquiteto. Ambos continuam a trabalhar à distância para a Ucrânia. A tecnologia é uma ajuda fundamental para que a vida possa continuar.
Os familiares mais próximos continuam em Kiev e, também, em Kharkiv. Yulia fala com eles todos os dias para pôr a conversa em dia. Para saber o que se passa, para tranquilizar quem resiste numa guerra que não se sabe quando há-de terminar.
Uma das poucas boas notícias é o facto de o marido ter conseguido escapar ao serviço militar imposto aos homens ucranianos, ao abrigo da lei marcial. Foi a deixa ideal para procurar um recomeço. Saíram da Ucrânia. Por eles e pelo filho.
Dois anos depois, Yulia anseia pela paz no seu país. E espera que a passagem por Portugal acabe o mais depressa possível, “quando o nosso céu for pacífico e seguro… porque não há lugar como a nossa casa”.