O ex-Presidente brasileiro Lula da Silva diz que o Brasil é governado por "um bando de malucos" na sua primeira entrevista concedida desde a detenção, há mais de um ano.
"Vamos fazer uma autocrítica geral nesse país. O que não pode [acontecer] é esse país estar governado por esse bando de malucos que governa o país. O país não merece isso e sobretudo o povo não merece isso", afirmou o antigo governante, numa entrevista conjunta concedida aos jornais "Folha de São Paulo" e "El País".
Para o antigo chefe de Estado, a elite brasileira deveria fazer uma autocrítica depois da eleição de Jair Bolsonaro para a presidência.
De acordo com a Folha de São Paulo, durante a entrevista, que durou cerca de duas horas, Lula da silva referiu-se várias vezes ao ex-juiz Sergio Moro, atual ministro da Justiça do Brasil, e responsável por decretar a prisão do antigo governante, que afirmou ter uma "obsessão em desmascarar" o antigo magistrado.
"Eu tenho tanta obsessão de desmascarar o Moro, o Deltan Dallagnol [procurador do grupo de trabalho da Lava Jato em Curitiba] e a sua equipa. Eu ficarei preso 100 anos, mas não trocarei a minha dignidade pela minha liberdade. Eu quero provar a farsa montada", frisou Lula.
"Seria tão mais fácil se eu tivesse morrido"
Durante a conversa com os jornalistas dos dois meios de comunicação, o histórico líder do Partido dos Trabalhadores (PT) falou da vida na prisão, da morte do irmão e do neto, do Governo de Jair Bolsonaro, das acusações de corrupção que sofre e da possibilidade de nunca mais sair da prisão.
Um dos netos de Lula da Silva, Arthur Araújo Lula da Silva, de 7 anos, morreu subitamente em março deste ano, em São Paulo. Em janeiro deste ano, também o irmão do ex-Presidente Genival Inácio da Silva, de 79 anos, morreu em São Paulo.
O ex-chefe de Estado brasileiro emocionou-se na entrevista ao falar dessas duas perdas que marcaram o seu ano na prisão.
"Eu às vezes penso que seria tão mais fácil se eu tivesse morrido. Porque eu já vivi 73 anos, eu poderia morrer e deixar o meu neto viver", afirmou, ao refletir sobre os momentos mais tristes desde a sua prisão, em abril de 2018.
Lula disse também que estava "grato" pela atitude do atual vice-presidente brasileiro, Hamilton Mourão, por este ter defendido a sua presença no velório do neto, ao contrário de Eduardo Bolsonaro, deputado federal e filho de Jair Bolsonaro, que afirmou que o ex-chefe era um "larápio a fazer pose de coitado" por tentar ir ao funeral.
"Nunca vi tanto ódio nas ruas"
O antigo Presidente comentou ainda as eleições presidencias brasileiras do ano passado, que ditaram a derrota do seu partido (PT) e a vitória de Jair Bolsonaro, declarando que "nunca viu tanto ódio nas ruas", como naquele período.
"Tivemos uma eleição atípica no Brasil. Vamos ser francos. O papel das 'fake news' na campanha, a quantidade de mentira, a robotização da campanha na Internet foi uma coisa maluca. E depois a falta de sensibilidade dos setores de esquerda de não se unir. A coisa foi tão maluca que a [candidata] Marina Silva, que quase foi Presidente em 2014 teve 1% dos votos. Eu nunca tinha visto o povo com tanto ódio nas ruas", afirmou ao El País e à Folha de São Paulo.
Lula da Silva descreveu "a tristeza" que sente na prisão, quando se lembra "das mentiras" que levaram à sua condenação.
"Quando vejo essa gente que me condenou na televisão, sabendo que eles são mentirosos, sabendo que eles forjaram uma história (...). Esse messianismo ignorante, sabe? Então eu tenho muitos momentos de tristeza aqui. Mas o que me mantém vivo, e é isso que eles têm que saber, eu tenho um compromisso com este país, com este povo", completou.
O juiz do Supremo Tribunal Federal brasileiro Ricardo Lewandowski decidiu esta quinta-feira que apenas o jornal Folha de S.Paulo e o El País poderiam entrevistar o ex-Presidente Lula da Silva, preso em Curitiba desde 07 de abril de 2018 por ter sido condenado em duas instâncias num processo da Operação Lava Jato.
No entanto, os juízes do Superior Tribunal de Justiça brasileiro decidiram na terça-feira, de forma unânime, reduzir a pena de Lula, de 12 anos e um mês para oito anos, dez meses e 20 dias de prisão.